Algumas pessoas apreciam ver o Ipê florido. Outras,
simplesmente amaldiçoam as suas flores caídas pelo chão. A beleza das coisas
está dentro da gente.
Não dá para explicar direito o porquê de termos nossas
atenções voltadas para certas pessoas, determinados momentos, como se nossos
olhos fossem mecanicamente atraídos para aquilo que nos encanta. Não há, porém,
nada de mecânico naquilo que enxergamos como belo, posto que se carrega de
sentidos, de essência, de olhares de nossa alma.
A capacidade de se encantar, de olhar a tudo e a todos com
olhos do bem, com o filtro da leveza e da compaixão, é um dos maiores presentes
que podemos nos dar. E depende somente de nós encontrar o que é positivo, o que
é belo, o que perfuma, mesmo em meio a dias traiçoeiros, ainda que a vida
estiver teimando em dizer não. Enxergar o óbvio, sim, é mecânico e acaba por
robotizar os nossos sentidos.
São tantos afazeres repetitivos e isentos de emoção
pontuando nossa jornada; são tantas pessoas insípidas e ásperas atravancando os
nossos passos, que, não raro, sentimo-nos propensos a embarcar nessa toada
célere e fria do cotidiano entediante. Ainda mais com as contas se acumulando, as
decepções se amontoando, os amores se evaporando, tudo parece tomar os
contornos crus e inertes do desencanto.
Nesse contexto, quem muito sorri é tido por bobo, quem ama
demais é tido como trouxa, quem é verdadeiro é tido como louco. Ser comedido é
a ordem do dia, enquanto que o muito, o demais, soa a espetáculo, a insensatez,
a desequilíbrio. A frieza e ponderação extremadas, o desapego total e o
descomprometimento com o outro acabam por ultrapassar os limites da convivência
minimamente harmônica, abrindo as portas ao egoísmo e ao pessimismo frente a
quem ousa ter esperança.
Que não percamos nossa capacidade de nos encantar, de sentir
prazer com o que estiver ali à frente, com o que temos junto a nós, com a vida
enfim. O nosso olhar, a maneira como encaramos a vida é que determinará o tanto
de felicidade que encherá os nossos corações. Em tudo o que acontece há lições,
oportunidades e crescimento. Todas as pessoas possuem algo especial, mesmo que
sejam exemplos de como não devemos ser.
Porque algumas pessoas apreciam ver o Ipê florido. Outras,
simplesmente amaldiçoam as suas flores caídas pelo chão. A beleza das coisas
está dentro da gente.
MARCEL CAMARGO
"Escrever é como compartilhar
olhares, tão vital quanto respirar".
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