Mulheres e glória são conquistas problemáticas
Passou metade da vida atrás de mulheres. A outra metade
desperdiçou em outros ofícios, inclusive o de não fazer nada. Mesmo assim,
respondendo a enquete de uma revista, declarou-se feliz e garantiu que seria
mais feliz ainda porque havia muitas coisas que nunca deveriam ter sido feitas;
e as mulheres, umas pelas outras, davam para o gasto.
O perfil desse meu amigo pode definir metade da população
masculina mundial. Mesmo assim, a única ocupação da qual se orgulhava e tirava
proveito era andar atrás do mulherio disponível ou indisponível.
Napoleão Bonaparte, ao desfraldar suas bandeiras em Marengo
(segundo historiadores sua maior vitória, superior à de Austerlitz), confessou
ao general Ney que conquistar uma mulher era melhor e mais prazeroso que uma
vitória num campo de batalha.
Confesso que é um bom desperdício, mas fico com a primeira
opção. Tive um colega no CPOR, mineiro de Varginha, que, sem saber, repetia
Napoleão: tudo que não fosse dedicado às mulheres era, não só um desperdício,
mas perda de tempo e de energia.
Na verdade, as duas opções (mulher e glória) são conquistas
problemáticas e, muitas vezes, inúteis. As mulheres traem, fazem exigências e
dificilmente estão satisfeitas.
A glória é sempre relativa: os historiadores divergem a
respeito. O próprio Napoleão, apesar de suas vitórias, foi chamado de
carniceiro. E a glória, periodicamente, é discutida ou negada pela história e
pelos próprios contemporâneos. Brutus matou César, e dom Pedro 1º, ao proclamar
a independência do Brasil, teve uma diarreia e assim começou a escrever a nossa
história num papel higiênico.
De minha parte não dou muita bola para a glória. Prefiro
desperdiçar o meu tempo com coisas melhores, inclusive livros, charutos e
mulheres.
Folha de São Paulo (RJ), 29/01/2017
Carlos Heitor Cony - Quinto ocupante da Cadeira nº 3 da ABL,
eleito em 23 de março de 2000, na sucessão de Herberto Sales e recebido em 31
de maio de 2000 pelo acadêmico Arnaldo Niskier.
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