O Amor
E alguém disse: Fala-nos do Amor!
- Quando o amor vos fizer sinal, segui-o; ainda que os seus caminhos sejam
duros e difíceis.
E quando as suas asas vos envolverem, entregai-vos; ainda que a espada
escondida na sua plumagem vos possa ferir.
E quando vos falar, acreditai nele; apesar de a sua voz poder quebrar os vossos
sonhos como o vento norte ao sacudir os jardins.
Porque assim como o vosso amor vos engrandece, também deve crucificar-vos
E assim como se eleva à vossa altura e acaricia os ramos mais frágeis que
tremem ao sol, também penetrará até às raízes sacudindo o seu apego à terra.
Como braçadas de trigo vos leva.
Malha-vos até ficardes nus.
Passa-vos pelo crivo para vos livrar do joio.
Mói-vos até à brancura.
Amassa-vos até ficardes maleáveis.
Então entrega-vos ao seu fogo, para poderdes ser o pão sagrado no festim de
Deus.
Tudo isto vos fará o amor, para poderdes conhecer os segredos do vosso coração,
e por este conhecimento vos tornardes o coração da Vida.
Mas, se no vosso medo, buscais apenas a paz do amor, o prazer do amor, então
mais vale cobrir a nudez e sair do campo do amor, a caminho do mundo sem
estações, onde podereis rir, mas nunca todos os vossos risos, e chorar, mas
nunca todas as vossas lágrimas.
O amor só dá de si mesmo, e só recebe de si mesmo.
O amor não possui nem quer ser possuído.
Porque o amor basta ao amor.
E não penseis que podeis guiar o curso do amor; porque o amor, se vos escolher,
marcará ele o vosso curso.
O amor não tem outro desejo senão consumar-se.
Mas se amarem e tiverem desejos, deverão se estes:
Fundir-se e ser um regato corrente a cantar a sua melodia à noite.
Conhecer a dor da excessiva ternura.
Ser ferido pela própria inteligência do amor, e sangrar de bom grado e
alegremente.
Acordar de manhã com o coração cheio e agradecer outro dia de amor.
Descansar ao meio dia e meditar no êxtase do amor.
Voltar à casa ao crepúsculo e adormecer tendo no coração uma prece pelo bem
amado, e na boca, um canto de louvor.
Gibran Khalil Gibran, 06 de janeiro de 1883 –10 de abril de 1931, foi um
ensaísta, filósofo, prosador, poeta, conferencista e pintor de origem libanesa.
Seus livros e escritos, de simples beleza e espiritualidade, são reconhecidos e
admirados para além do mundo árabe.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário