Nossa Biblioteca
Cyro de Mattos
A Câmara de
Vereadores engole a cada ano mais um espaço da Biblioteca Municipal Plínio de
Almeida. Não devia fazer isso. Essa pobre casa de livros, desassistida há anos
pelo poder público, tem um acervo desatualizado, sem condições ideais para
fomentar a leitura como pede uma cidade do porte cultural de Itabuna. Os que lá
atuam como serventuários do órgão nada têm a ver com essa situação lamentável.
Não recebem o apoio necessário para o eficiente desempenho da função, nem
sequer são reciclados em cursos pertinentes ao setor para que melhor sirvam
numa casa dessa natureza aos que procuram conhecer a vida através dos
livros. Certamente para isso lá não
estão.
Melhor deixá-los precários na função do expediente
repetitivo, subalternos ao descaso do poder público do que fazê-los ativos,
inquietos com as falhas na engrenagem. Se um dia quisessem virar a chave, não
se atrevessem nessa iniciativa temerária. No grau de revoltados impotentes
poderiam ser recompensados com o despejo do emprego.
Uma
cidade com cerca de 250 mil habitantes, uma rede de ensino abrangente, em nível
superior e secundário, com duas universidades, faculdades, escolas públicas e
particulares, ser tão frágil, de causar pena, quando o assunto é a Biblioteca
Municipal Plínio de Almeida. Uma lástima na sua prestação de serviços. Até quando os políticos, a Secretaria de
Educação e a Fundação Itabunense de Cultura e Cidadania vão tomar consciência
de que são agentes institucionais do fomento ao saber e à cultura? Sempre
omissos ante um problema grave dessa natureza, como se nada de mais estivesse
acontecendo com a nossa biblioteca municipal. Espaço que não é nem lazer nem
fonte eficiente do saber.
Podem me
chamar de sonhador do que vou dizer adiante, sinto-me confortado com o elogio.
Lembro que os sonhadores do bem são necessários em qualquer dimensão da
vida. Itabuna devia ter uma biblioteca
com o acervo constituído de um livro para cada habitante. Para que assim fosse
dona desse espaço fértil, saudável, onde pudesse doar-se às suas gentes com a
mão cheia de livros, fazendo-se de fato útil ao pensamento e sentimento da
criatura humana na dura lei da vida. E assim desse seu contributo para se
aprender a andar melhor na existência, conhecer o que presta e o que não
presta, principalmente em tempo de eleição, na hora da escolha de seus
representantes, daqueles que soubessem de verdade reger seu destino político
com competência e ética nos dias do ano, como deve ser.
Vejo
assim a sugestão dada como o caminho plausível para tirar nossas gentes dos
caminhos obscuros da vida, na boa leitura respirando o ar sadio pelas ruas do
mundo e do saber. Através da conversa com os livros, tornando nossa biblioteca
espaço de convivência atuante, pródiga parceira no comportamento de rica troca
de significados.
Pobre cidade nossa, deveria ter uma biblioteca funcionando
com oficinas, lançamento de livros, teatrinho com meninos e jovens, bom não
esquecer os idosos, pois os velhos são gente boa, muito têm a nos dizer. Assim
fosse dotada de uma plataforma que valorizasse os autores da terra, com
palestras, encontros, seminários, saraus e recitais. Usasse o diálogo saudável
com os estudantes. Não permanecesse como algo de pouco proveito, nessa maneira
abominável que empobrece a vida, não sendo jamais a ideal para nos retirar da
parte obscura do ser e do estar na existência.
Itabuna de
um rio enfermo, como esgoto a céu aberto, que hoje chora água, um dia foi
chamado pai dos pobres. Cidade que respira os ares tristes pelo desfalque
contínuo do patrimônio histórico tecido de beleza antiga. E que vem sendo
dilapidado pelo descaso dos que cumprem preservá-lo como um tesouro
inestimável, conquistado com engenho e arte, labor e esforço ao longo dos
anos.
Itabuna, que
tem um povo vocacionado para o progresso, querendo fazer a vida com alma, força
e conhecimento. Minha cidade querida, usina de tantos valores humanos no ciclo
das estações, ó quão dessemelhante!
Cyro de Mattos é jornalista, cronista, contista, romancista,
poeta e autor de livros para crianças. Publicado em Portugal, Itália, França,
Espanha, Alemanha, Rússia, Dinamarca, México e Estados Unidos. Premiado no
Brasil, Portugal, Itália e México. Membro efetivo da Academia de Letras da
Bahia, Academia de Letras de Ilhéus e Academia de Letras de Itabuna. Doutor
Honoris Causa pela Universidade Estadual de Santa Cruz.
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