Revanche de Osvaldo Gigante,
Providência do Delegado Sepúlveda
Por Cyro de Mattos
Foi no tempo do velho Campo da Desportiva. Mereceu destaque
na semana o desentendimento envolvendo o desportista Osvaldo Gigante e o
adolescente Sílvio Sepúlveda, filho de delegado Reinaldo Sepúlveda. Osvaldo
Gigante era veemente torcedor da Associação. Sílvio Sepúlveda não dormia quando
seu Itabuna perdia. Foi barrado na entrada da Desportiva pelo Osvaldo Gigante,
que não admitia que ninguém entrasse de graça no estádio. Nem se fosse o filho
do delegado. Armou-se forte discussão entre os dois contendores. Pessoas
importantes da cidade interferiram para acalmar os ânimos entre os dois
torcedores rivais. Terminou com o Sílvio Sepúlveda entrando na Desportiva, uns
dizem que de graça, outros que ele teve de pagar o ingresso. Pelo sim, pelo
não, no auge da discussão, o Sílvio Sepúlveda disse para o Osvaldo Gigante que
o timeco da Associação era de racistas e infiltrado de integralistas.
A Associação era um time muito superior ao Itabuna. Ganhou o jogo para o Itabuna com uma estrondosa goleada, lavando a alma do Osvaldo Gigante, que saiu do estádio rindo pelos cotovelos e mangando do Sílvio Sepúlveda.
De mansinho, sem que ninguém visse, o derrotado torcedor do Itabuna saiu da Desportiva muito antes do término da partida. Torcedores mais velhos do Itabuna, alguns deles hoje em outras dimensões cósmicas, comentam que a Associação praticava naquele tempo um profissionalismo disfarçado, pagando um pequeno salário mensal aos jogadores e prêmio quando venciam uma partida importante.
Com relação à discussão entre os dois torcedores rivais, o delegado Reinaldo Sepúlveda encontrou um jeito para acabar com aquela desavença entre o filho e o torcedor extremado da Associação. Se continuasse, a situação poderia se agravar e não trazer boas consequências. Osvaldo Gigante andava se vangloriando com a goleada aplicada pela Associação no Itabuna. O delegado conseguiu que o Osvaldo Gigante fosse transferido da firma compradora de cacau Correia Ribeiro para trabalhar numa filial da empresa em Palestina, atual Ibicaraí. A cidadezinha de Palestina ficava a cerca de quarenta e cinco quilômetros de Itabuna, com seus dias calmos e longe do mundo. O ônibus que ia de Itabuna para Ibicaraí percorria uma estrada de barro esburacada. No verão a poeira sobrava, no inverno era a vez da lama. O motorista botava fogo pelas narinas com os solavancos que o ônibus dava por causa dos buracos. Os passageiros cuspiam cobras e lagartos durante a viagem. O percurso entre as duas cidades durava mais de três horas.
Osvaldo Gigante nunca esqueceu aquela punição, arranjada pelo delegado Sepúlveda para resolver o duelo entre os dois torcedores apaixonados por seus times. Passava agora as tardes em Ibicaraí, mansas de dar sono em qualquer forasteiro que por ali chegasse. Ficava assim sem assistir as partidas de futebol no Campo da Desportiva, principalmente aquelas em que a Associação participava. Isso era o que mais lhe doía. Tempos depois foi morar em Pirangi, atual Itajuípe, cidadezinha que ficava mais perto de Itabuna. E lá fundou o Bahia, que fez algumas partidas amistosas com o Itabuna do Silvio Sepúlveda, ganhando todas, lá em Itajuípe e cá na Desportiva.
Para a felicidade e a algazarra que o Osvaldo Gigante fazia em cada vitória quando saía do estádio. Para a amargura e a humilhação que o Sílvio Sepúlveda passava em cada derrota de seu não menos querido Itabuna.
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Cyro de Mattos - Membro efetivo da Academia de Letras da
Bahia, Academia de Letras de Ilhéus e Academia de Letras de Itabuna. Doutor
Honoris Causa pela Universidade Estadual de Santa Cruz.
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