Poemas Cristãos
Cyro de Mattos
Jesus
Deus é o crivo da
Dor no coração. Pétala,
Que na chaga exsurge.
Este Cristo
É maior que o mundo
este andor feito na dor
dos grandes rumores.
É maior que o mundo
esta luz feita na cruz
dos grandes tremores.
É maior que o mundo
este amor feito no ardor
dos grandes clamores.
Ó peso da terra,
cuspe, chicotada, crivo.
E das chagas flores.
Súplica
Se te coloquei nesse
calvário,
Coroei com cuspe e
escárnio,
Ofendi com agudo cravo,
Nada me disse o teu sangue,
Não te vi olhando-me no alto.
Vesti com roxo o dia claro,
A mim atendei, ó pai eterno,
Derramai o teu perdão
No meu coração solitário.
Canto de Amor
E todo este peso
terrestre atendeu
na flor da comunhão,
de braços abertos
clamas como cacto.
E dignos não somos
de olhar este rosto
que pende no amor
do sangue derramado.
E solitários caminhos
da ternura os desviados
na voz de tudo que é perdão.
O canto de amor prossegue
pelos que têm fome e sede,
carregam o dilema do
pacto.
Santa Cruz
Todo o peso da terra
com ofensa e lenho
aqui deste desterro.
Pedras cor de
vinho,
setas de veneno
dos que ladram.
Lábios de sede,
botão que se
abre
na flor do
perdão.
Até hoje a
oferta,
a ternura como
meta
jogada na
sarjeta.
Sexta-Feira Maior
O sol morre.
turva onda
o mundo em aflição
molha-me de roxo.
Nada valho.
Nada sou de fato.
Prefiro Barrabás,
crucifico o amor,
sem dó e lágrima
dilacero o afeto.
Soneto da Paixão
Ao pé do Cristo todas as infâmias,
ao pé do Cristo todas as insônias,
ao pé do Cristo todas as intrigas,
ao pé do Cristo todas as refregas.
Ao pé do Cristo todos os sedentos,
ao pé do Cristo todos os famintos,
ao pé do Cristo todos os horrores,
ao pé do Cristo todos os clamores.
Ao pé do Cristo todos os insultos,
ao pé do Cristo todos os corruptos,
ao pé do Cristo todos os ladrões,
Ao pé do Cristo todas as prisões.
Nessa onda que nos leva como cães,
cura-me, ó Deus de todas as paixões.
Calvário
Na opressão
na perseguição
na aflição
na traição
na depressão
na escuridão
na solidão
na sensação
do cuspe
e do cravo
no coração
ó Senhor meu
dá-me tua mão
Poema na Semana Santa
Tudo é roxo e ofensa e perdão.
A tristeza está nos ares,
já anda pelas veredas
e no perfume dos caminhos.
No ocaso da saudade ao longe,
na flor do cacau que é espinho.
E chega à igreja a procissão.
Tudo é clamor e cruz e paixão
porque uma coroa sensitiva
instalou-se em Itabuna
com fadiga e sede e fome
e escorre suas dores
pelas pedras cor de vinho.
Mas no sábado tudo é verde
e claro sem o roxo e o espinho.
Os sinos repicam na cidade
e um dia novo está nas galhas,
no coro de milhões de passarinhos.
Cyro de Mattos é ficcionista e poeta. Da Academia de Letras
da Bahia. Possui prêmios importantes no Brasil e exterior. Publicado também por
várias editoras europeias. Primeiro
Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Santa Cruz.
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