A poesia ecológica de Cyro de Mattos
Quem ainda
não leu Cyro de Mattos precisa conhecer seus livros urgentemente. Este
jornalista, advogado, e mestre em capoeira é, também e principalmente, um
escritor excelente: poeta, contista, romancista, cronista, novelista, ensaísta,
com vários prêmios importantes na bagagem, tais como: o Prêmio Afonso Arinos da
Academia Brasileira de Letras, o Prêmio Pen Clube do Brasil e o Prêmio da
Associação Paulista de Críticos de Arte, dentre outros.
Traduzido em
várias línguas, em diversos países, este baiano de Itabuna, membro da Academia
de Letras da Bahia, já publicou 64 livros no Brasil e 15 no exterior. Além
disso, organizou 5 antologias e 5 coletâneas. Seus dois livros recentes, os
quais tive a honra de receber autografados, O discurso do rio (Coimbra, Pallimage,
2020) e Devoto do campo (Itabuna, Editus, 2021), são de um lirismo comovente,
que arrebata o leitor e possuem títulos que já constituem um belo poema.
Estes dois
livros podem ser classificados como uma elegia à natureza, uma poesia ecológica
que revela seu amor ao meio-ambiente e aos seres que nela habitam, incluindo o
bicho-homem que tanto a degrada. O discurso do rio foi publicado também em Portugal e traz prefácio da Professora
Graça Capinha da Universidade de Coimbra. Na verdade, ao escolher a palavra
discurso para dar voz às falas dos nossos rios e denunciar a sua destruição
pela poluição e desvios de cursos, o poeta brinca com o vocábulo “discurso”,
atribuindo a ela um novo significado como antônimo de “curso”: dis-curso”. Se
aprendemos com um curso escolar, o dis-curso é o oposto daquilo que deveríamos
aprender a fazer, ou seja, em um dis-curso desaprendemos com discursos e
práticas antiecológicas: não cuidamos daquilo que deveríamos. Em vez de
preservar nossos rios, os destruímos.
Mas também aprendemos
com o discurso que o rio traça em seu curso natural por onde correm as suas
águas: ouvimos o seu pedido de socorro na sua linguagem sem voz, agonizante e
silenciada. Este canto agônico fica claro em vários de seus versos, como no
poema “Das mãos na goela das águas”, que ilustra a quarta capa:
“Venho sendo omisso pra refazer
Virginais caminhos de água, dizendo
Melhor, matei o que era para ser
Vivo no seu amanhecer líquido.
Eu me acuso por ser indiferente
Ao benefício sempre abundante
De água pura que jorrava na fonte
Peixe e rede na estação competente.
E como réu confesso que merece
Por tão grave ilícito ser punido
Chegando do que lhe foi natural,
Em noite morta, que nunca enriquece,
Lavro minha sentença, condenado
A viver no abismo que há no Mal.”
No seu mais
recente livro Devoto do campo, o autor continua a sua defesa da natureza em
belos versos curtos e simples como a própria natureza e o ambiente campestre.
Seguindo o estilo de Emily Dickinson, poeta estadunidense por ele homenageada
na epígrafe, Cyro dá voz aos elementos campestres componentes daquele habitat
bucólico, como o grilo, o jabuti, a aranha, a garça, o pinto, o beija-flor, a
borboleta, o papagaio, o boi, a ovelha, o cavalo, o som das asas, a flor, o
trinado das aves, a árvore, a foice, a selva, a estrada, a paisagem, o laço, as
crenças e as oferendas, a lua, e as claves de sol.
Não é à toa
que este poeta recebeu elogios de escritores ilustres, como Jorge Amado, Assis
Brasil, Ledo Ivo e tantos outros, como Carlos Drummond de Andrade que escreveu
um poema para homenageá-lo. Seus livros aqui resenhados podem ser adquiridos
diretamente com o autor no email: cyropm@bol.com.br. Seus outros livros podem
ser encomendados através dos sites das editoras, da Amazon e da Estante
Virtual.
*Décio Torres Cruz é escritor, crítico literário,
poeta, professor universitário e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em
Literatura e Cultura da Ufba.
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