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sexta-feira, 4 de março de 2022

 

Poesia de Cyro de Mattos

Inspirada em Terras da Espanha

É Publicada pela Espelho d’Alma

 


A editora Espelho d’Alma, de São Paulo, acaba de publicar o livro Guitarra de Salamanca, de Cyro de Mattos, em edição português-espanhol, reunindo poemas inspirados em terras da Espanha, em especial Salamanca. O livro traz capa do desenhista baiano Ângelo Roberto, ilustrações internas de Miguel Elias, conhecido como o pintor espanhol dos poetas, tradução e prefácio da professora Doutora Raquel da Silva Ortega, da Universidade Estadual de Santa Cruz.  

 

         Salamanca Cantante

             Por Raquel da Silva Ortega

 

Paisagens, cores, sons, fragrâncias, sabores, memórias, afetos... são alguns elementos, sentidos e emoções que podem surgir quando visitamos outros lugares e conhecemos outros ambientes e outras pessoas. Viajar, percorrer novos caminhos, conhecer outras histórias são experiências que inspiram artistas e são transformadas em arte e poesia. A coletânea de poemas Guitarra de Salamanca, do prestigioso escritor itabunense Cyro de Mattos, tem duas protagonistas: a cidade de Salamanca (Espanha) e a sinestesia.

Na literatura, temos uma longa tradição de cidades como fonte de inspiração e de matéria narrativa. O exemplo mais conhecido talvez seja a obra As cidades invisíveis (1972), escrita por Ítalo Calvino. Neste livro, o autor cria um relato ficcional no qual Marco Polo descreve ao imperador Kublai Khan suas impressões das cidades que ele teria visitado. No entanto, essa descrição não é objetiva, pelo contrário, os diálogos entre Kublai Khan e Marco Polo poderiam ser classificados como uma narrativa afetiva, recuperada a partir da memória e de reflexões íntimas. No mesmo sentido, Cyro de Mattos traz um diálogo intimista com a cidade de Salamanca, em forma de poesia.

Como recurso expressivo, o poeta recorre à sinestesia. Como já indica o título — Guitarra de Salamanca — o autor nos transporta para o ambiente andaluz através da sonoridade dos poemas. O livro apresenta vinte e um poemas, divididos em quatro partes: Tocata com Alfredo Pérez Alencart, Andamento com seis atos, Fuga com três atos e Fechamento com três atos. A escolha dos títulos das divisões demonstra a busca pela sonoridade, uma vez que remetem às partes integrantes de uma peça musical.    

 Nos poemas Jaqueline de Alfredo e Um Poeta Peruano-Espanhol vemos a celebração da amizade de Cyro de Mattos com Alfredo Pérez Alencart e sua esposa, Jaqueline. Pérez Alencart, poeta peruano-espanhol radicado há anos em Salamanca, é um dos principais nomes da poesia espanhola atual e a presença dos poemas que evocam esta amizade familiar coloca Guitarra de Salamanca em diálogo com a literatura espanhola.  Os poemas da segunda e da terceira parte exaltam grandes escritores que nasceram ou passaram por Salamanca/Toledo, partindo de nomes do Siglo de Oro como Góngora, Quevedo, Calderón de La Barca e Miguel de Cervantes, passando pela Generación del 98 com Miguel de Unamuno e adentrando no século XX com Rafael Alberti e Federico García Lorca. Ao mesmo tempo, Salamanca surge em toda sua magnitude: na evocação do ambiente acadêmico, nas suas paisagens, na arquitetura, nos seus caminhos. Aqui novamente percebemos a sinestesia: além da sonoridade, o sentido visual é amplamente provocado nestes poemas, em imagens reconstruídas a partir da memória afetiva do poeta.

Guitarra de Salamanca reafirma a importância da obra do escritor Cyro de Mattos, uma vez que seus poemas estabelecem o diálogo com a tradição das cidades como matéria literária, despertam diversas sensações e se aproximam de grandes escritores da literatura espanhola.

 

*Profa. Dra. Raquel da Silva Ortega,

 Universidade Estadual de Santa Cruz

— UESC (Ilhéus, BA, Brasil)

 

 


 

Ó Tu Salamanca

Cyro de Mattos

 

Na fachada de casas

e igrejas e edifícios

basta para entender

que se está na história.

Caminhar é a forma

 de descobrir segredos

de quem também sabe ser

contemporânea e jovem

com estudantes tantos

misturados na face agitada.

Quando a noite cai, luzes

Enchem a parte noturna,

Lugares em que o coração

Aprende que o amor

Se faz amando o mito 

Que se apodera da alma.


* * *

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