O colapso da fé que assola o mundo atual é sem dúvida o pior dos males que grassam na sociedade contemporânea. O reflexo desse flagelo não está apenas nas almas, mas nos ambientes, nos costumes e nas instituições. As pessoas sem fé vivem como se Deus não existisse, à procura desenfreada do gozo da vida, do amor irrestrito ao presente, do desprezo pelo passado e por todos os valores morais e religiosos.
Ao excluir Deus de suas vidas, ipso facto, o
homem faz da existência uma chanchada, um carnaval, uma piada, além de outras
futilidades que o fazem pular, rir, gritar, cantar. Hoje ele tenta preencher o
vazio de Deus, além do trabalho, com automóvel, lazer, celular, vídeos de
entretenimento e outros joguinhos do gênero…
Convenhamos, tudo isso parece moldado para fazer esquecer
quão grave é a vida, diante das responsabilidades que por sua própria natureza
ela nos impõe. Quantas cabeças rolaram ao longo dos séculos, seguidas de
promessas de um mundo melhor, onde os homens seriam autossuficientes com o
auxílio da ciência e da técnica.
Estas redimiriam o homem do trabalho, das fadigas, das
doenças, resolveriam todos os seus problemas, eliminariam a sua dor, a pobreza,
a ignorância, a insegurança, enfim tudo aquilo que chamamos de efeitos do
pecado original. Cfr. Plinio Corrêa de Oliveira in Revolução e
Contra-Revolução.
Mas como os homens gostam de ser enganados! Na medida em que
eles foram abandonando a religião, os confessionários foram desaparecendo das
igrejas — o mais das vezes, ó dor, removidos por mãos sagradas — e os
consultórios psiquiátricos se multiplicando. Por quê?! Será que as pessoas se
sentiram ou se sentem frustradas pelas promessas enganosas, e que a vida neste
vale de lágrimas se lhes vai tornando inexplicável?!
“Sede sóbrios e vigiai. Vosso adversário, o demônio, anda
ao redor de vós como o leão que ruge, buscando a quem devorar” (1
Pedro 8). Essa é a advertência do Evangelho sobre o pai da mentira. A história,
em muitas de suas páginas, registrou essas ciladas com nome de renascimento, de
cultura, de revolução, de guerra… a ponto de hoje mais que nunca pode-se
afirmar que Satanás é o príncipe deste mundo.
As armas infernais são tão velhas como o demônio. Basta que
seus agentes se apresentem faceiros com um ramo de louro, um metal brilhante ou
um prato de lentilhas para abalar a vigilância tão apreciada por Nosso Senhor e
cair no seu encanto. Mas o desencanto vem a galope com as aflições de espírito,
transformando as pessoas em joguete, em escravo preso às suas garras… Logo
elas, que venderam a alma na ilusão de ser livres!
Não se pode por outro lado negar que diante do esforço
revolucionário e luciferino para levar os homens à apostasia venha surgindo uma
sadia reação, sem dúvida uma ação da graça, que toca o fundo dos corações. As
missas tradicionais, por exemplo, vão se multiplicando com muitos dos bons
hábitos e costumes de outrora.
Posta esta introdução, passemos aos fatos. A pequena
assistência espiritual prestada por sacerdotes aos enfermos, de modo especial
aos atacados pela COVID, vem se tornando mais crítica em razão de uma campanha
para cercear o atendimento de pessoas nos hospitais, UPAs e demais serviços
ambulatoriais. O pretexto é preservar a saúde coletiva.
Afinal, não apenas da assistência médica ampla e eficaz
necessita o paciente, mas também, e de algum modo sobretudo, da assistência
espiritual, uma vez que nossos corpos são mortais, mas não a alma,
cumprindo-nos por isso preservá-la de se perder eternamente.
É perplexitante nesse sentido considerar que a CNBB cuida
quase tão-só de questões sociais e políticas, enquanto os católicos precisam
recorrer a advogados para que padres tenham o devido acesso ao leito de pessoas
enfermas para salvaguardar seus direitos previstos diante de Deus, direitos
esses garantidos pela legislação federal.
Aqueles que por missão divina deveriam ser a voz que clama,
o sal que salga, a luz que ilumina, quedam silenciosos e omissos, quando não
coniventes com a perseguição que sofrem os fiéis abandonados nos hospitais e
lugares correlatos sem o apoio moral e religioso. Uma omissão de clamar aos
céus!
Nada mais malfazejo para as almas que necessitam de pão,
dar-lhes pedra; que necessitam de um peixe, dar-lhes um escorpião, para
utilizar as palavras do divino Salvador nesse caso de tanta incúria no
atendimento espiritual de ovelhas que clamam pelos pastores.
Deveriam ser eles os primeiros a demonstrar desvelo em lutar
com todos os meios lícitos a fim de que as portas do reconforto fossem
franqueadas a almas órfãs, e muitas vezes já no umbral da morte. Seguramente a
hora mais difícil da vida, o momento em que as pessoas mais precisam de apoio
espiritual e encorajamento.
Este silêncio e omissão, sobretudo num momento como esse, só
tem um nome: deslealdade para com a missão da Igreja, da glória de Deus e da
salvação das almas.
Voltarei em breve ao tema.
* Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria –
Cardoso Moreira (RJ).
https://www.abim.inf.br/encanto-e-desencanto-em-tempo-de-covid/
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