O Presidente, o Cardeal e a Comunhão para os políticos
pró-aborto
Luiz Sérgio Solimeo*
Nesta era de secularismo, quando a vida política é separada
da vida religiosa, é louvável que um presidente dos Estados Unidos se apresente
como um católico praticante e participe publicamente dos sacramentos da Igreja.
No entanto, o catolicismo do presidente Biden é sui
generis. Ele não segue a doutrina e a moral católica a respeito do aborto
provocado e do pecado homossexual.
Contraste com a Doutrina Católica
Ao longo de sua carreira política, incluindo as eleições
gerais de 2020, o Sr. Biden [foto acima] favoreceu a legalização do aborto
voluntário. Nos anos mais recentes, ele abraçou o “casamento” entre pessoas do
mesmo sexo, oficiando um na qualidade de vice-presidente.
Após a posse, seu governo emitiu um comunicado especificando
seu apoio ao aborto e à contracepção, não apenas nos Estados Unidos, mas em
todo o mundo:
“Nos últimos quatro anos, a saúde reprodutiva, incluindo o
direito de escolha, tem estado sob ataque implacável e extremo. … A
administração Biden-Harris [foto acima] está empenhada em regulamentar (a
decisão da Suprema Corte) Roe v. Wade e nomear juízes que respeitem
precedentes fundamentais como Roe. Também nos comprometemos a nos empenhar
no trabalho para eliminar as disparidades entre saúde materna e infantil,
aumentar o acesso à contracepção e apoiar economicamente as famílias para que
todos possam criar suas famílias com dignidade [sic]. Este compromisso se
estende ao nosso trabalho crítico em relação aos padrões de qualidade da saúde
em todo o mundo”.(1)
Com relação à homossexualidade e ao “transgenerismo”, é bem
conhecida a inclinação pró-LGBT nas nomeações de membros de seu gabinete e para
posições em nível de gabinete. O Sr. Biden também assinou uma ordem
executiva afirmando que a política de seu governo é que “as crianças devem poder
estudar sem se preocupar se o acesso ao banheiro, ao vestiário ou
esportes escolares vai-lhes ser negado (por causa de seu sexo “escolhido”)”
(2). Da mesma forma, ele restabeleceu o “ transgenerismo” nas Forças
Armadas(3), e, de acordo com Antony Blinken, seu agora confirmado Secretário de
Estado, “ele planeja nomear rapidamente um emisário internacional LGBT, [e]
permitir às embaixadas hastear a bandeira do orgulho (homossexual)”.(4)
Aquele que não aceita totalmente toda a doutrina da Igreja
não é católico
O aborto voluntário, o pecado homossexual e o
“transgenerismo” são, sem sombra de dúvida, contrários à doutrina e à moral
católicas. A Escritura e a Tradição, assim como o Magistério eclesiástico não
deixam margem a discussão a esse respeito.[5]
Ora, um católico deve aceitar totalmente e seguir os
ensinamentos dogmáticos da Igreja bem como as verdades morais reveladas por
Deus. Portanto, quem rejeita uma só dessas verdades reveladas, seja de natureza
dogmática ou moral, rejeita todo o depósito da Fé e se expulsa da Igreja. Cada
verdade revelada, sem exceção, deve ser aceita.
É o que ensina o Papa Leão XIII na encíclica Satis
Cognitum, sobre a unidade da Igreja:
(A Igreja sempre) considerou rebeldes declarados e expulsou
de seu seio a todos aqueles que não pensam como Ela sobre qualquer ponto de sua
doutrina.…
….aquele que num único ponto recusa o seu assentimento às
verdades divinamente reveladas abdica realmente de toda a fé, pois recusa-se a
submeter-se a Deus na medida em que Ele é a verdade soberana e o motivo próprio
da fé.(6)
“Que ele seja tido por gentio e publicano”
Por sua vez, em sua encíclica Mystici Corporis Christi,
o Papa Pio XII afirmou:
“Como membros da Igreja contam-se realmente só aqueles que
receberam o lavacro da regeneração (o batismo) e professam a verdadeira fé, nem
se separaram voluntariamente do organismo do corpo, ou não foram dele cortados
pela legítima autoridade em razão de culpas gravíssimas.
“Portanto …. quem se recusa a ouvir a Igreja, manda o
Senhor que seja tido por gentio e publicano (cf. Mt 18, 17). Por
conseguinte os que estão entre si divididos por motivos de fé ou pelo governo,
não podem viver neste corpo único nem do seu único Espírito divino. …
“Nem todos os pecados, embora graves, são de sua natureza
tais que separem o homem do corpo da Igreja como fazem os cismas, a
heresia e a apostasia”.(7)
Desse modo, aqueles que defendem o aborto, o pecado
homossexual ou o “transgenerismo”, não apenas teoricamente, mas
promovendo ou efetuando sua legalização, não podem ser considerados católicos.
“Sempre que comer este pão …”
Ao tratar da Sagrada Eucaristia, o Concílio de Florença (1438-1445) ensinou que “o efeito que este sacramento opera na alma de quem o recebe dignamente é a união do homem a Cristo”.(8) Como Nosso Senhor disse, “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele”.(9)
Dada a santidade deste sacramento, São Paulo alerta para as
consequências de recebê-lo indevidamente:
“Assim, todas as vezes que comeis desse pão e bebeis desse
cálice lembrais a morte do Senhor, até que Ele venha. Portanto, todo aquele que
comer o pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será culpável do corpo e
do sangue do Senhor. Que cada um se examine a si mesmo, e assim coma desse pão
e beba desse cálice. Aquele que o come e o bebe sem distinguir o corpo do
Senhor, come e bebe a sua própria condenação”.(10)
Alguns Prelados alertam o Sr. Biden…
Em uma entrevista com Thomas McKenna, o Cardeal Raymond Burke [foto abaixo] , ex-prefeito do Supremo Tribunal da Signatura Apostólica, advertiu que o Sr. Biden não tem condições de receber a Comunhão:
“Portanto, em primeiro lugar, por caridade para com ele, gostaria de lhe dizer que não se aproximasse da Sagrada Comunhão, porque isso seria um sacrilégio e um perigo para a salvação de sua alma.
“Mas também não deveria se aproximar para receber a Sagrada
Comunhão porque causa escândalo a todos. Porque se alguém disser ‘bem, sou um
católico devoto’ e ao mesmo tempo promover o aborto, isso dá a impressão de que
é aceitável para um católico ser a favor do aborto o que, é claro, não é
absolutamente aceitável. Nunca foi, nunca será”.[11]
O Arcebispo emérito da Filadélfia, D. Charles Chaput,
comentou na mesma linha: “As figuras públicas que se identificam como
‘católicas’ escandalizam os fiéis ao receberem (indignamente) a
comunhão, criando a impressão de que as leis morais da Igreja são opcionais. E
os bispos dão escândalo semelhante ao não falar publicamente sobre a questão e
o perigo do sacrilégio”.(12)
Outros bispos o apoiam
No entanto, alguns prelados, como o cardeal Wilton Gregory,
falaram de maneira diferente. A jornalista do Catholic News Service Cindy
Wooden entrevistou o arcebispo de Washington, DC. Ela escreve: “Embora alguns
católicos acreditem que Biden não deve receber a comunhão quando vai à missa, o
cardeal designado Gregory disse que por oito anos como vice-presidente Biden
foi à missa e [recebeu a] comunhão. ‘Não vou me desviar disso’,
disse ele”.(13)
Duas igrejas, lado a lado?
Essas atitudes divergentes na hierarquia católica nos levam
a perguntar se uns e outros têm a mesma fé católica ou se vemos uma nova
religião emergindo da sombra da Igreja Católica.
Existe uma Igreja, baseada na Revelação, que nega a Sagrada
Comunhão a pessoas que falam e agem publicamente contra a doutrina e a moral
católicas e “obstinadamente persistem no pecado grave manifesto”?(14) E outra
que permite a tais pessoas receberem a Sagrada Comunhão sem qualquer
demonstração pública de arrependimento?
Só a primeira posição é legítima e corresponde à da Igreja
fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo: “Una, Santa, Católica e
Apostólica”, como rezamos no Credo niceno-constantinopolitano (o Credo da
Missa). A segunda não.
O que é ser católico?
A conduta do novo presidente dos Estados Unidos e de bispos
como o recém-nomeado cardeal Wilton Gregory levanta a questão: o que significa
ser católico?
Como mostrado nos trechos acima dos Papas Leão XIII e Pio
XII, esta pergunta já foi respondida há muito tempo. Muitas outras declarações
de papas, concílios e do Direito Canônico poderiam ser adicionadas. Todas,
porém, se resumem nisto: católico é aquele que foi batizado e acredita e
professa toda a doutrina revelada e proposta pelo Magistério da
Igreja, tanto em questões dogmáticas quanto morais.
Com relação a quem rejeite até mesmo um único ponto da
doutrina e da moral católica, o Papa Pio XII ensina: “Manda o Senhor que
seja tido por gentio e publicano”.
* Publicado no site da The American Society for the
Defense of Tradition, Family and Property em 5 de fevereiro de 2021
Notas
1. Declaração do presidente Biden e da vice-presidente Harris no 48º
aniversário de Roe v. Wade”, 22 de janeiro de 2021,
https://www.whitehouse.gov/briefing-room/statements-releases/2021/01/22/statement
-from-president-biden-and-vice-president-harris-on-the-48-year-of-roe-v-wade /.
2. “Ordem Executiva de Prevenção e Combate à Discriminação com Base na
Identidade de Gênero ou Orientação Sexual”, 20 de janeiro de 2021,
https://www.whitehouse.gov/briefing-room/presidential-actions/2021/01/20/executive
-ordenar-prevenir-e-combater-discriminação-com-base-identidade-gênero-ou-orientação
sexual /.
3. “Ordem Executiva Habilitando Todos os Americanos Qualificados a
Servirem Seu País em Uniforme”, 25 de janeiro de 2021, https://www.whitehouse.gov/briefing-room/presidential-actions/2021/01/25/executive-order-
em-permitindo-todos-americanos-qualificados-para-servir-seu-país-em-uniforme /
4. Paul LeBlanc e Jennifer Hansler, “O escolhido para secretário de
estado de Biden promete nomear um enviado LGBTI e permitir às embaixadas
hastear a bandeira do orgulho [homossexual]”, CNN, 19 de janeiro de 2021,
https://www.cnn.com/2021/01/19/ policy /
antony-blinken-lgbti-pride-flag-biden-Administration / index.html.
5. Ver Cardeal Francesco Roberti e Mons. Pietro Palazzini, s.v.
“Aborto”, no Dictionary of Moral Theology (Westminster, Md .: The Newman Press,
1962); TFP Committee on American Issues, Defending a Higher Law: Why We Must Resist Same Sex
“Marriage” and the Homosexual Movement (Spring Grove, Penn.:
The American Society for the Defense of Tradition, Family and Property, 2012)
6. Leão XIII, encíclica Satis Cognitum, 29 de junho de 1896,
nn. 17, 20. http://w2.vatican.va/content/leo-xiii/es/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_29061896_satis-cognitum.html
7. Pio XII, encíclica Mystici Corporis Christi, 29 de junho de 1943, nn.
21-22. http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/encyclicals/documents/hf_p-xii_enc_29061943_mystici-corporis-christi_po.html
8. Denzinger- Hünermann, n. 1322.
9. João 6,56.
10. 1 Cor 11,26-29.
11. “Cardeal Burke: Joe Biden Não Deve Receber a Sagrada
Comunhão”, National Catholic Register, 29 de setembro de 2020,
https://www.ncregister.com/news/cardinal-burke-joe-biden-should-not-receive-holy
-comunhão.
12. Charles J. Chaput, O.F.M. Cap., “O Sr. Biden e a Questão de
Escândalo”. First Things, 4 de dezembro de 2020,
https://www.firstthings.com/web-exclusives/2020/12/mr-biden-and-the-matter-of-scandal.
13. Cindy Wooden, “Em Washington, com o novo presidente, o
Cardeal-designado tem esperanças de diálogo,” Catholic News Service, 24 de
novembro de 2020,
https://www.catholicnews.com/in-washington-with-new-president-cardinal
-designar esperanças para o diálogo /.
14. Código de Direito Canônico. Cânon 915.
https://domtotal.com/direito/pagina/detalhe/31867/codigo-de-direito-canonico#ancora-24
https://www.abim.inf.br/o-que-significa-ser-catolico/
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário