20 de julho de 2020
Neste dia 20 de julho a Santa Igreja celebra a festa litúrgica
do Profeta Elias. Em sua memória segue a transcrição de um comentário feito por
Plinio Corrêa de Oliveira em conferência realizada em 14-11-1969. Esse texto
não passou pela revisão do autor.
O Rei Ocozias mandou um capitão com cinquenta homens prender
o Profeta Elias. Disse-lhe então o capitão: “Ó tu que te tens por homem de
Deus, o rei mandou que venhas. Respondendo Elias, disse ao capitão de 50
homens: Se eu sou homem de Deus, desça fogo do céu e te devore, a ti e a teus
50 homens”. (2 Reis, 1, 1). O capitão e todos os soldados foram liquidados.
A primeira reação que este fato poderia produzir em um
católico piegas seria a seguinte: Coitados! Afinal de contas, que culpa eles
tinham para morrerem dessa maneira?
O fato é relatado como um castigo, e para que esse castigo
se explique, devemos considerar que os profetas davam provas de sua missão
profética, e os que não queriam reconhecer essa missão profética incorriam no
castigo de Deus. Aqueles homens tinham aceitado a incumbência do rei, de
prender o profeta Elias, daí concluirmos que eles não reconheciam o profeta; ou
se reconheciam, temiam mais o rei do que o profeta. Portanto, nessas condições,
mereciam ser duramente castigados.
Qual o sentido desse castigo? Deus não é só justo nem só
severo, é também infinitamente misericordioso. Ele não seria Deus se não fosse
justo e misericordioso. Mostra-nos todas as suas perfeições, entre elas sua
justiça e severidade infinitas.
Nós temos que amá-lo em todas as suas manifestações,
inclusive quando a manifestação é de sua justiça. Quando Deus nos mostra sua
justiça, Ele o faz para nos atemorizar. É claro que o temor é um dos frutos da
manifestação da justiça de Deus, mas não é o único fruto, pois outro fruto é o
amor a Deus. Ele quer ser amado na sua justiça e na sua severidade. A
severidade para com o mal deve despertar o amor. Esta é a lição que devemos
tirar nas tomadas de atitude severas.
Quais são as coisas que a Revolução nega nesse sentido?
Prestando atenção, vemos que a Revolução vai cada vez mais dando a ideia de que
o homem que detém autoridade só é digno de amor se nunca for severo. Isso se
nota em todas as escalas da autoridade. Segundo tal ideia, o pai que jamais é
severo é o pai bom e digno de amor, e a autoridade policial que tem pena do
ladrão e o deixa escapar é a autoridade policial boa e digna de amor. Está
subjacente nisso a ideia de que é preciso não ser severo com o criminoso. E a
autoridade que não pune, não castiga, não faz sofrer, essa é a autoridade boa,
que deve ser objeto de simpatia.
Ora, essa é uma ideia falsa! Para um homem de coração reto,
a severidade atrai o amor. A severidade não é brutalidade, nem vulgaridade. A
alguém que nos censure com severidade, com respeito e com a força dos
Mandamentos, nós devemos ficar agradecidos. É um sinal de que somos humildes, e
que as portas do Céu estão abertas para nós. Caso contrário, seria sinal de que
não somos humildes, nem de que as portas do Céu estão abertas para nós.
Portanto, devemos amar em Deus também a sua severidade.
Antigamente o pai, dentro de sua casa, apresentava-se sempre
um tanto distante, enigmático e majestoso em relação aos filhos. Nem por isso
os filhos deixavam de amá-lo. Pai indigno de amor é o que se orienta por uma
fórmula como esta: “Eu sou o melhor amigo do meu filho; não temos relações de
pai e filho, mas de amigos”. Um pai assim profana sua própria autoridade, pois
o pai é muito mais do que amigo. Compreende-se então por que Deus manifesta de
vez em quando sua severidade, e a manifesta de modo terrível.
Um bispo antigo de São Paulo escreveu esta frase numa carta
pastoral: “A misericórdia de Deus tem mandado mais gente ao inferno do que a
sua justiça”. A frase é um pouco desconcertante, mas significa que vão para o
inferno mais almas por terem abusado da misericórdia de Deus do que por terem
temido demais a justiça de d´Ele. Os abusos da misericórdia são mais frequentes
do que defeitos morais por temor excessivo da justiça.
Alguém poderia objetar: Mas onde é que o senhor coloca a
bondade? Dou minha resposta com base na figura de Santa Teresinha do Menino
Jesus, que tinha amor profundo à bondade de Deus, mas também uma noção profunda
da justiça d´Ele. A tal ponto que estremecia ao ouvir falar dela, mesmo sabendo
que ela é adorável. Tal era nela o senso da justiça de Deus, que fazia como os
anjos no Céu: velava a face diante dela. Por assim dizer, desviava os olhos da
justiça, cuja grandeza tremenda, no entanto, a enchia de admiração.
Não é esta a atitude do relaxado que tem o hábito de pecar,
despreza a justiça de Deus, zomba dela, não a teme. Para o relaxado, a
meditação sobre a justiça tem um efeito bem diferente do que produzia na alma
insondavelmente sensível e delicada de Santa Teresinha. Se temos motivos para
achar que não somos tão sensíveis quanto Santa Teresinha em relação à justiça
de Deus, nem tão inocentes quanto essa santa carmelita, faremos muito bem em
meditar sobre o inferno.
Mais uma objeção que alguém poderia fazer: Eu sou de uma
contextura espiritual especial, e lucro mais meditando sobre a bondade de Deus
do que sobre o inferno. Respondo que considero esta uma via espiritual
legítima, e a respeito inteiramente. Mas tantas vezes o homem é levado a pôr um
sofisma assim diante dos olhos, para evitar olhar a justiça de Deus, que o meu
conselho é examinar-se muito atentamente antes de admitir essa conclusão.
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