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quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

SÃO FRANCISCO DE SALES


24 de Janeiro de 2019

Bispo de Genebra, Confessor e Doutor da Igreja, fundador de Ordens religiosas e diretor de incontáveis almas. Animado de profundo amor de Deus, dotado de bondade e suavidade excepcionais no trato, sólida cultura e ortodoxia.

São Francisco de Sales [festividade celebrada no dia 24 de janeiro]

♦  Plinio Corrêa de Oliveira

“Legionário”, 23 de janeiro de 1938, Nº 280

Apontando-nos os santos como exemplo, a Igreja Católica destrói, sem argumentar, a pretensa ignorância e humildade de condição dos que seguem os ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo. Encontramos de fato, entre eles, muitos que se dedicaram durante a vida a misteres mais humildes, e que muitas vezes desdenharam a instrução para cultivarem apenas a verdadeira sabedoria, que é o amor de Deus. Porém, ao lado deles e em não menor número, se acham reis, rainhas, nobres e sábios, relembrando quotidianamente, e com a força irrecusável dos fatos, que para seguir Nosso Senhor Jesus Cristo nada mais se exige do que a boa vontade.

A condição social e a ciência são, separadamente, os dois obstáculos que os incrédulos julgam existir para a difusão da Igreja. E a Igreja responde-lhes com a vida de um São Francisco de Sales (1567–1622), que aliava à nobreza de sua família uma ciência invulgar, adquirida com brilhantismo nos melhores colégios de França.

São Francisco foi enviado pelo pai a Paris para estudar. Sua mãe, no entanto, que temia pela virtude do filho assim abandonado numa grande cidade, despediu-se dele recomendando-lhe insistentemente a frequência aos Sacramentos, afirmando preferir vê-lo morto a saber que um dia tivesse cometido um pecado mortal.

São Francisco progrediu rapidamente nos estudos, fazendo-se admirado pelos professores e colegas; não só pela sua inteligência, como pela virtude que conseguia manter no meio de tantos perigos, recebendo frequentemente os Sacramentos.

Amor de Deus, sem esperar recompensa

Nosso Senhor desejava, no entanto, grandes coisas de São Francisco, e por isso submeteu-o a uma aridez completa, com a ideia de que estava predestinado ao inferno, de nada lhe valendo todo o esforço empregado para se salvar. Obcecado por essa ideia, um dia ele se ajoelhou aos pés de Nossa Senhora, e entre lágrimas rezou a oração de São Bernardo (o “Lembrai-vos”), acrescentando-lhe: “Ó minha Senhora e Rainha, sede minha intercessora junto de vosso Filho, perante o qual não me atrevo a comparecer. Queridíssima Mãe, se eu tiver a infelicidade de não amar a Deus no outro mundo, alcançai-me a graça de amá-lo o mais possível enquanto aqui estou!”.

Desde esse dia cessou completamente essa tentação. Nossa Senhora ouvira a oração belíssima de quem se entregava completamente à sua vontade, a ponto de não titubear em amar a Deus e servi-Lo neste mundo sem nenhuma recompensa no outro.

Grande conversor de hereges

Relíquia do Santo

Terminados os estudos, São Francisco foi ordenado apesar da oposição do pai, e o Papa nomeou-o Bispo Auxiliar de Genebra, que era o centro da heresia calvinista. Desdobrou-se em atividades, procurando por todas as formas destruir a heresia. Trouxe de volta para o seio da Igreja Católica 72 mil calvinistas.

Quando a diocese passou para suas mãos, pela morte do Bispo de Genebra, visitou-a inteira a pé, exortando os fiéis à perseverança e procurando mostrar aos hereges os seus erros. Por vinte anos dirigiu-a, apesar das ciladas que armavam os calvinistas para retirar do seu caminho quem, apenas com a palavra, a mansidão e o exemplo, abria tantos claros em suas fileiras.

Aos 56 anos entregou a Deus sua alma, e 23 anos depois o Papa Alexandre VII inseriu o seu nome no catálogo dos santos. Em 1933 foi declarado Doutor da Igreja e Padroeiro da imprensa e dos jornalistas.

Pecaminosa cumplicidade da imprensa

Retrato do Papa Alexandre VII
Giovanni Battista Gaulli, séc. XVII.
Walters Art Museum, Baltimore (EUA).

São Francisco de Sales foi durante a vida um verdadeiro lutador da Igreja contra a heresia, e hoje em dia a imprensa católica tem também a obrigação de empreender o mesmo combate, pois o mundo se abisma cada vez mais na heresia e na dissolução dos costumes, com a cumplicidade da chamada imprensa neutra.

Só a imprensa católica se oporá a essa onda; e só o espírito de sacrifício, que animava o Bispo de Genebra a combater a heresia calvinista em sua própria sede, poderá fazê-la vencer a indiferença que a cerca. O combate à imprensa neutra deve ser eficiente, pois ela esconde atrás de sua suposta neutralidade um verdadeiro ódio à Igreja de Nosso Senhor.

Que São Francisco de Sales interceda junto a Nosso Senhor, conseguindo d’Ele a graça sem a qual nada poderá ser feito, e dando a todos os jornalistas católicos o espírito de sacrifício necessário para sua obra.

NOBREZA E SANTIDADE

Tendo Catolicismo já abordado em números anteriores a biografia de São Francisco de Sales (vide edições de janeiro/1999 e janeiro/2014), cuja festa se celebra no dia 24 de janeiro, decidimos apresentar aos prezados leitores os comentários acima, em que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira mostra as insignes qualidades e a atuação do grande santo, padroeiro dos jornalistas católicos.

Um aspecto pouco conhecido desse baluarte da contrarreforma, mencionado pelo autor, é que ele descendia de família nobre. Aproximando este aspecto de outros, muito mais divulgados, o autor ressalta a importância da nobreza na formação de uma sociedade católica.

Também de autoria do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira é o próximo texto sobre o grande número de nobres canonizados ou beatificados pela Igreja, que transcrevemos do seu importante livro Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana (Livraria Civilização Editora, Portugal, 1993, p. 323)

Ser nobre e levar vida de nobre é incompatível com a santidade?

São Luís, Rei da França (no centro),
conduz a Coroa de Espinhos
para a Sainte Chapelle, em Paris.

A incompreensão existente nos nossos dias em relação à nobreza e às elites tradicionais análogas resulta, em larga medida, da propaganda hábil, se bem que destituída de objetividade, que contra elas fez a Revolução Francesa.

Tal propaganda — alimentada continuamente ao longo dos séculos XIX e XX pelas correntes ideológicas e políticas sucedâneas àquela Revolução — tem sido combatida com crescente eficácia pela historiografia séria. Mas há setores de opinião nos quais ela perdura obstinadamente.

Segundo os revolucionários de 1789, a nobreza era constituída essencialmente por gozadores da vida, detentores de privilégios honoríficos e econômicos insignes, os quais lhes permitiam viver regaladamente dos méritos e galardões alcançados por longínquos antepassados. Podiam permitir-se o luxo de viver apenas desfrutando as delícias da existência terrena; e, o que é pior, especialmente as do ócio e da volúpia.

Essa classe de gozadores era apresentada, além disso, como altamente onerosa para a Nação, com prejuízo das classes pobres — estas sim, laboriosas, morigeradas e úteis ao bem comum. Segundo d’Argenson, “La Cour était le tombeau de la Nation” [a Corte era o túmulo da Nação].

Isso tudo levou à noção de que a vida própria de um nobre, com o realce e a largueza que normalmente deve comportar, convida de si mesma a uma atitude de relaxamento moral, muito diversa da ascese reclamada pelos princípios cristãos.

Grande número de nobres elevados à honra dos altares

Sem contestar que esta versão tenha algo de verdadeiro, pois na nobreza e nas elites análogas dos fins do século XVIII já se faziam sentir os sinais precursores da terrível crise moral dos nossos dias, é preciso acentuar que essa versão, nociva ao bom renome da classe nobre, tinha muito mais de falso que de verdadeiro.

Prova-o a própria história da Igreja. Entre outras coisas, pelo grande número de nobres que Ela elevou à honra dos altares, atestando por esta forma que praticavam em grau heroico os Mandamentos e os conselhos evangélicos. Por isso São Pedro Julião Eymard pôde afirmar: “Os anais da Igreja demonstram que grande número de santos, e dos mais ilustres, ostentavam um brasão, possuíam um nome, uma família distinta: alguns até eram de sangue real”.1

Vários desses santos abandonaram o mundo para mais seguramente alcançarem a virtude heroica. Outros, porém, como os Reis São Luís de França e São Fernando de Castela, permaneceram no fastígio da sua situação e alcançaram a virtude heroica vivendo inteiramente na altíssima condição nobiliárquica que lhes era própria.

Para tornar mais cabal o desmentido a estas versões que pretendem denegrir a nobreza, bem como os costumes e os estilos de vida que a sua condição comporta, ocorreu indagar qual a proporção de nobres entre os que a Santa Igreja cultua como santos. Não foi possível, no entanto, encontrar um estudo específico sobre este assunto. Alguns investigadores abordaram tal matéria, não tendo feito sobre ela uma pesquisa específica e exaustiva. Fundamentaram-se eles para os seus cálculos em elencos que apresentam como não completos.

Merece particular atenção um estudo feito por André Vauchez, Professor da Universidade de Rouen, intitulado La Sainteté en Occident aux derniers siècles du Moyen Âge,2 baseado nos processos de canonização e nos documentos hagiográficos medievais [vide quadro abaixo].
Apresenta ele uma estatística de todos os processos ordenados pelos Papas “de vita, miraculis et fama” entre 1198 e 1431. Estes totalizaram 71, dos quais 35 conduziram à conclusão de que os personagens sobre os quais versavam mereciam ser elevados à honra dos altares pela Igreja, o que esta efetivamente realizou ainda na Idade Média.3


Processos de canonização ordenados entre 1198 e 1431 (71 casos)
Nobres                                                62,0%
Classe Média                                     15,5%
Povo                                                    8,4%
Origem social desconhecida           14,1%

Santos canonizados por um Papa da Idade Média (35 casos)
Nobres                                                60,0%
Classe Média                                     17,1%
Povo                                                    8,6%
Origem social desconhecida           14,3%


Início do culto aos santos na Igreja Católica

Estes dados, apesar de muito interessantes, não podiam satisfazer o desejo de um quadro mais completo, pois diziam respeito a um número muito reduzido de pessoas e a um espaço de tempo relativamente curto. Tornava-se necessária uma pesquisa que abrangesse um número mais vasto de pessoas e um tempo mais amplo, sem, entretanto, pretender esgotar o tema.

Para tal tarefa, no entanto, algumas dificuldades ponderáveis surgiram. Antes de tudo, a inexistência de uma lista oficial dos santos cultuados como tais na Igreja Católica. Dificuldade, aliás, muito explicável, pois a inexistência de tal lista relaciona-se com a própria história da Igreja e o progressivo aperfeiçoamento das suas instituições.

O culto dos santos teve início na Igreja Católica com o culto prestado aos mártires. As comunidades locais honravam alguns dos seus membros, vítimas das perseguições. Dos milhares que nos primeiros séculos da Igreja verteram seu sangue para testemunhar a Fé, só nos chegaram algumas centenas de nomes, ora através das atas dos tribunais — redigidas pelos pagãos, que transcreviam os processos verbais — ora através dos relatos feitos por testemunhas oculares dos martírios.

Além de não existirem documentos deste gênero a respeito de todos os mártires, muitas destas atas — cuja leitura inflamava a alma dos primeiros cristãos e lhes dava o exemplo para suportar novas tribulações — foram destruídas durante diversas perseguições, sobretudo a de Diocleciano.4 Torna-se assim impossível conhecer todos os mártires que foram objeto de culto pelos fiéis nos primeiros séculos da Igreja.

Com o fim das perseguições, e ainda durante muito tempo, os santos foram venerados por grupos restritos de fiéis, sem uma investigação prévia e sem um julgamento da autoridade eclesiástica. Depois, com o aumento da participação da autoridade na organização das comunidades católicas, cresceu também o papel desta na escolha dos que deviam receber culto. Os Bispos passaram a permitir o estabelecimento de um determinado culto, e muitas vezes o ratificaram a pedido dos fiéis, fazendo a elevação e transladação das relíquias de um novo santo.

Só no fim do primeiro milênio o Papa passou a intervir, de vez em quando, na consagração oficial de um santo. Com efeito, à medida que o poder dos Pontífices Romanos se ia afirmando, e que os contatos com os mesmos se tornavam mais frequentes, os Bispos passaram a solicitar aos Papas a confirmação dos cultos, ocorrendo isso pela primeira vez em 993.

Mais tarde, em 1234, pelas Decretais tornou-se necessário o recurso à Santa Sé, e o direito de canonização ficou reservado ao Pontífice. Entretanto, no período que medeia entre estas datas, muitos Bispos continuaram a proceder às transladações de relíquias e à confirmação de culto, segundo os antigos costumes.

A partir de 1234, pouco a pouco, os processos para a determinação do culto a um santo tornaram-se cada vez mais aperfeiçoados. Desde o final do século XIII a decisão pontifícia baseia-se numa instrução prévia, levada a cabo por um colégio de três cardeais especialmente encarregado desta tarefa. E assim permaneceu até 1588, quando as causas foram confiadas à Congregação dos Ritos, instituída no ano anterior pelo Papa Sixto V.

No século XVII esta evolução atingiu o seu termo. Urbano VIII, em 1634, com o Breve Cœlestis Jerusalem Cives, estabeleceu as normas para a canonização de uma pessoa, que essencialmente permanecem as mesmas até os nossos dias.

Tendo em vista os Servos de Deus, que por tolerância receberam culto público depois do pontificado de Alexandre III, as Constituições de Urbano VIII previam a confirmação de culto ou canonização equipolente, “sentença pela qual o Soberano Pontífice ordena honrar como Santo, na Igreja universal, um Servo de Deus para o qual não se introduziu um processo regular, mas que desde tempo imemorial se acha na posse de um culto público”.5 Esse procedimento foi válido também para casos semelhantes ocorridos após as Constituições de Urbano VIII.

Dificuldade em determinar a origem social de um santo

Altar dos Reis – Catedral de Puebla, no México.
Seu nome se deve a que nele se encontram
imagens de reis e rainhas canonizados.
Entre eles São Luís IX da França,
Santa Isabel da Hungria,
Santo Eduardo da Inglaterra,
São Fernando III de Castela, Santa Helena,
mãe do Imperador Constantino,
e Margarida, Rainha da Escócia.

Assim, a partir de 993 — data da primeira canonização papal — é possível estabelecer uma lista dos santos definidos pela Santa Sé. Esta lista, entretanto, ainda não é completa, faltam documentos de períodos extensos. Além disso, a lista não contém todos os santos, pois entre 993 e 1234, como já se disse, os Bispos continuaram a ratificar o culto. Por isso muitos indivíduos foram objeto de um culto público independentemente de uma intervenção de Roma, que era solicitada muitas vezes — mas nem sempre — alguns séculos depois. Somente a partir do início do século XVI pode-se estar certo de que a lista de santos e bem-aventurados (distinção consagrada pela legislação de Urbano VIII) não contém lacunas.6

Além da dificuldade para estabelecer uma lista completa dos santos, outra era saber quais deles pertenceram à nobreza. Com efeito, nem sempre é fácil estabelecer com certeza a origem nobre de uma pessoa. A própria elaboração do conceito de nobreza foi progressiva e sumamente orgânica, condicionado às características dos diversos povos e lugares, por vezes dificultando determinar quem pertencia ao estamento da nobreza. Há também a dificuldade de determinar com precisão os antepassados de uma pessoa. Isso levou, leva e continuará a levar muitos a dedicarem longos períodos à investigação das origens genealógicas de personagens diversos. Todos esses empecilhos tornam difícil determinar a origem social de alguns santos.

Tendo em vista estas dificuldades, tratava-se de escolher fontes de pesquisa tão completas quanto possível, mas ao mesmo tempo inteiramente fidedignas, para elaborar uma estatística aproximativa do número de nobres no rol dos santos.

Optou-se então pelo Index ac Status Causarum,7 uma publicação oficial da Congregação para a Causa dos Santos, sucessora da antiga Congregação dos Ritos. Trata-se de uma “edição extraordinária e amplíssima, feita para comemorar o IV Centenário da Congregação, incluindo todas as causas a ela apresentadas desde 1588 até 1988, e também as mais antigas conservadas no arquivo secreto vaticano”.

A obra inclui ainda vários apêndices, dos quais três interessam mais especialmente. No primeiro são enunciadas as confirmações de culto a partir do Index ac Status Causarum redigido em 1975 pelo Pe. Beaudoin, acrescentados alguns nomes e subtraídos outros de bem-aventurados que posteriormente foram incluídos no catálogo dos santos. No segundo apêndice enumeram-se apenas os que foram beatificados a partir da instituição da Sagrada Congregação dos Ritos e ainda não canonizados. No terceiro apêndice estão enumerados os santos cujas causas foram tratadas pela Sagrada Congregação dos Ritos, incluindo os casos de canonização equipolente.

Com essa relação de nomes em mãos, foram consultadas as respectivas biografias na obra intitulada Bibliotheca Sanctorum,8 para saber quais deles pertenciam às fileiras da nobreza. Esta obra — dirigida pelo Cardeal Pietro Palazzini, ex-Prefeito da Congregação para a Causa dos Santos — é considerada o elenco mais completo de todos os que receberam culto, desde o início da Igreja.

Como a Bibliotheca Sanctorum não põe sua atenção principal em fornecer a origem social das pessoas mencionadas, mas sim os assuntos relacionados com o seu culto, muitas vezes é impossível saber quem foi ou não nobre, por falta de dados. Além disso, e para manter um critério estrito, adotou-se como princípio só computar como nobres aqueles de quem a obra afirma serem nobres ou descendentes de tais. Não foram incluídos na lista quando consta apenas que pertenceram a famílias “importantes, conhecidas, antigas, poderosas, etc”.
Preferiu-se assim incluir pessoas cuja origem nobre se pode presumir com seriedade ou até ter certeza, com base em outras fontes, a fim de evitar casos duvidosos.

Pareceu ainda conveniente, para maior precisão na estatística, distinguir as seguintes categorias, conforme o Index ac Status Causarum:

Santos canonizados após um processo regular;
Bem-aventurados beatificados após um processo regular;
Os que tiveram o seu culto confirmado;
Os Servos de Deus cujos processos de Beatificação ainda estão em curso.

Apresentam-se [no quadro ao lado] as porcentagens obtidas, tendo o cuidado de discriminar, em cada uma das categorias, os que foram objeto de uma investigação individual e os que formam parte de um grupo que teve o seu processo analisado em conjunto, como, por exemplo, os mártires japoneses, ingleses, vietnamitas, etc.

________________________________________
Santos
Pessoas       Nobres           %
Processos individuais           184                 40                  21,7
Processos coletivos (11)       364                 12                  3,3
Total                                         548                 52                  9,5
Bem-aventurados
Pessoas       Nobres           %
Processos individuais           182                 22                   12,0
Processos coletivos (26)       1074               46                   4,3
Total                                         1256               68                   5,4
Confirmações de Culto
Pessoas       Nobres           %
Processos individuais           336                 107                 31,8
Processos colectivos (24)     1087               10                   0,9
Total                                         1423               117                 8,2
Processos de Beatificação em Curso
Pessoas        Nobres           %
Processos individuais          1331               149                 11,2
Processos coletivos (146)    2671*              13                   0,5
Total                                        4002*              162                 4,0
________

(*) O Index ac Status Causarum não traz o número preciso das pessoas consideradas em alguns destes processos, tornando-se pois impossível dar um número exato, sendo as cifras aproximativas.

A porcentagem de nobres é consideravelmente maior

Para ressaltar as ponderáveis porcentagens de nobres nestes vários quadros, convém saber qual a porcentagem média de nobres em relação ao resto da população do respectivo país. Limitamo-nos a dois exemplos, tão diversos quanto significativos. Segundo o conceituado historiador austríaco J. B. Weiss, baseado em dados de Taine, a nobreza na França, antes da Revolução Francesa, não chegava a 1,5% da população.9

G. Marinelli, no tratado de Geografia universal La Terra,10 baseando-se na obra de Peschel-Krümel, Das Russische Reich (Leipzig, 1880), fornece uma estatística da nobreza na Rússia, segundo a qual — somada a nobreza hereditária à nobreza pessoal — esta classe não passava de 1,15% do total da população. Afirma a mesma obra de Marinelli que Rèclus apresentara em 1879 uma estatística semelhante, chegando à porcentagem de 1,3%; e van Lehen chegou ao mesmo resultado de 1,3% em 1881.

Dependendo do tempo e do lugar, obviamente estas porcentagens sofrem pequenas variações não significativas.

Os dados acima apresentados fazem ver que, em cada uma das categorias (santos, bem-aventurados, confirmações de culto e processos ainda em curso), a porcentagem de nobres é consideravelmente maior que no conjunto da população de um país.11 Isto fala em sentido oposto ao das calúnias revolucionárias sobre a pretensa incompatibilidade entre a prática habitual da virtude e o fato de pertencer ao estado nobre, transcorrendo toda a vida nesse estado.
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Notas:
1. Mois de Saint Joseph, le premier et le plus parfait des adorateurs – Extrait des écrits du P. Eymard, Desclée de Brouwer, Paris, 7ª ed., pp. 62.
2. École française de Rome, Palais Farnese, 1981, 765 pp.
3. Várias outras foram canonizadas posteriormente.
4. DANIEL RUIZ BUENO, Actas de los Martires, BAC, Madrid, 1951.
5. ORTOLAN, verbete “Canonisation”, in Dictionnaire de Théologie Catholique, Letouzey et Ané, Paris, 1923, tomo II, 2ª parte, col. 1636.
6. ANDRE VAUCHEZ, La Sainteté en Occident aux derniers siècles du Moyen Âge, École française de Rome, Palais Farnese, 1981; JOHN F. BRODERICK S.J., A census of the Saints (993-1955) in “The American Ecclesiastical Review”, Agosto de 1956; PIERRE DELOOZ, Sociologie et Canonisations, Martinus Nijhoff, La Haye, 1969; DANIEL RUIZ BUENO, Actas de los Martires, BAC, Madrid, 1951; Archives de Sociologie des Religions, publicado pelo Grupo de Sociologia das Religiões, Editions du Centre National de la Recherche Scientifique, Paris, Janeiro-Junho de 1962.
7. Congregatio pro Causis Sanctorum, Città del Vaticano, 1988, 556 pp.
8. Instituto João XXIII da Pontifícia Universidade Lateranense, 12 vol. (1960-1970); Apêndice (1987).
9. Historia Universal, vol. XV, t. I, Tipografia la Educación, Barcelona, 1931, p. 212.
10. La Terra – Trattato popolare di Geografia Universale, Casa Editrice Francesco Vallardi, Milão, 7 vol., 8450 pp.
11. Nota-se, nos diversos quadros, uma diferença apreciável entre a porcentagem de nobres nos processos de beatificação individuais e a porcentagem de nobres nos processos coletivos. Isto se explica, principalmente por dois motivos. Em muitos desses processos a Bibliotheca Sanctorum faz apenas menção aos nomes, sem fornecer dados biográficos que permitam saber se são ou não nobres; por outro lado, a maior parte dos processos coletivos refere-se a grupos de mártires. Ora, é normal que as perseguições se dirijam contra toda a população católica, independentemente da classe social, sendo natural que a proporção de nobres entre os mártires seja semelhante à dos nobres na população.



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