Revolta dos Búzios, 220 anos
Boletins sediciosos, o embrião do
Jornal impresso na Bahia de 1798
Pelos 220 anos da também chamada Revolta dos Búzios, que
abalou o morno cenário colonial-urbano da então Cidade da Bahia, em agosto de
1798, a Assembleia Legislativa da Bahia lançará no próximo dia 24, às 18 horas,
em segunda edição, no Instituto
Geográfico da Bahia, o livro intitulado A comunicação social na Revolução dos Alfaiates, de Florisvaldo Mattos, em que, deixando aos historiadores a parte essencialmente histórica, o autor aborda o que considerou ponto crucial, o papel da comunicação social na dita insurreição, que visava libertar o Brasil-Colônia do jugo colonizador de Portugal sob o primado de múltiplas bandeiras, tais como independência da Capitania, implantação da república, abolição da escravatura, igualdade para todos, livre comércio com as nações do mundo, interrupção de vínculo com a Igreja do Vaticano, instituição do trabalho remunerado, melhoria do soldo militar e garantias para os plantadores de cana, fumo e mandioca, assim como para comerciantes.
Geográfico da Bahia, o livro intitulado A comunicação social na Revolução dos Alfaiates, de Florisvaldo Mattos, em que, deixando aos historiadores a parte essencialmente histórica, o autor aborda o que considerou ponto crucial, o papel da comunicação social na dita insurreição, que visava libertar o Brasil-Colônia do jugo colonizador de Portugal sob o primado de múltiplas bandeiras, tais como independência da Capitania, implantação da república, abolição da escravatura, igualdade para todos, livre comércio com as nações do mundo, interrupção de vínculo com a Igreja do Vaticano, instituição do trabalho remunerado, melhoria do soldo militar e garantias para os plantadores de cana, fumo e mandioca, assim como para comerciantes.
enforcamento, seguido de esquartejamento e exposição de despojos fixados em postes e espalhados por vários pontos da cidade, dois deles soldados (Luiz Gonzaga das Virgens e Lucas Dantas do Amorim Torres) e dois artesãos (João de Deus do Nascimento, mestre alfaiate, e Manoel Faustino dos Santos Lira, então oficial alfaiate, mas ex-escravo), livrando-se da punição severa um quinto personagem, Luiz Pires, também artesão, porque desaparecera, sem deixar rastros, numa Bahia colonial, cuja estrutura social se assentava no patriarcalismo e na economia escrava, com uma população estimada em menos de 200 mil habitantes, sendo 50 mil para o Recôncavo, menos de 60 mil para a Capital e menos de 100 mil para o resto da Capitania.
Baseado em fontes primárias e secundárias, em seu livro, o
autor preferiu focar as suas lentes nas relações de comunicação que permitiram,
seja no nível interpessoal, pela via oral, com predominância da conversa e do
recado, seja no da comunicação manuscrita, com cartas, bilhetes e avisos, os
revoltosos atuarem em dois planos: o da formação da consciência política e
revolucionária e o da preparação para o levante, praticamente se esgotando nelas
toda a engrenagem conspiratória, havendo, no entanto, um momento determinante
que levou à frustração e ao fim trágico do movimento.
Foi quando, superando repentinamente as limitações da
comunicação em círculo privado, na madrugada de 12 de agosto de 1798, a
população foi surpreendida com uma série de textos manuscritos, em número de
dez, afixados em locais públicos, para onde convergia grande número de pessoas,
tais como portas de igreja, os chamados cantos do peixe, açougues, feiras de
frutas e legumes, cais do porto, portas de quartéis, tendas de alfaiates e
oficinas de artesãos, veiculando mensagens de conteúdo basicamente
político-ideológico, em prol de uma reforma social. Deveu-se ao uso de um búzio
de Angola, às vezes até preso na lapela, como uma das formas de identificação
de conjurados, no trânsito diário por esses pontos, a opção posterior de se dar
ao movimento a designação de Revolta dos Búzios, a preferida na atualidade.
A partir daí, deflagrada a perseguição, instalaram-se dois
processos regidos por dois desembargadores fiéis à Corte de Portugal, um para
investigação do que se passou a chamar "boletins sediciosos",
espalhados pela cidade, e outro voltado para a reunião de preparação para o
levante, que fora convocada para o dia 25 seguinte, no então chamado Dique do
Desterro, naquele tempo um lugar afastado e ermo.
Foi sobre tal nova forma de comunicação que Florisvaldo
Mattos centrou a sua análise, considerando que esses dez “boletins sediciosos”,
apesar de manuscritos, foram para os revolucionários e para o movimento “o seu
jornal, seu instrumento de divulgação de ideias e definições para um público
mais amplo, que extrapolava o circuito da conspiração até aquele momento” e
assim, tendo em vista esse aspecto, tomou-os como a mais expressiva e
inovadora forma de comunicação indireta utilizada pelos participantes da
conjuração, desempenhando, para a época, o legítimo papel de jornal manuscrito,
por meio do qual os conjurados difundiram as suas ideias e projetos de reforma
social, com sublevação da ordem constituída, para um público indeterminado -
chamado por eles de Povo Bahiense -, com características de comunicação
pública, unilateral e indeterminada, como seriam alguns anos depois - no Brasil
e na Bahia - os jornais impressos, a Gazeta do Rio de Janeiro, em 1908,
autorizada por carta-régia de dom João VI, e Idade D´Ouro do Brazil, em 1811, na
Bahia.
Motivos de uma das devassas que apuraram a conspiração,
segundo ele, esses dez boletins sediciosos visavam, em essência, alcançar um
público, uma coletividade de pessoas, em apoio do movimento. Dirigidos ao Povo
Bahiense, cinco eram encabeçados como Aviso, um como Nota e quatro como Prelo,
palavra que sintomaticamente fazia ressoar a técnica de impressão inaugurada
por Gutenberg, que deu origem a toda a uma consagrada cultura editorial e
gráfica no Ocidente. Sob o título de Aviso ao Povo Bahiense, eis uma
dessas conclamações:
Ó vós Homens Cidadãos, ó vós Povos curvados e abandonados pelo Rei, pelos seus ministros.
Ó vós Povos que estais para serdes Livres, e para gozardes dos bons efeitos da Liberdade; Ó vós Povos que viveis flagelados com o pleno poder do Indigno coroado, esse mesmo Rei que vós criastes; esse mesmo rei tirano é quem se firma no trono para vos vexar, para vos roubar e para vos maltratar.
Homens, o tempo é chegado para a vossa Ressurreição, sim para ressuscitardes do abismo da escravidão, para levantardes a Sagrada Bandeira da Liberdade.
A liberdade consiste no estado feliz, no estado livre do abatimento; a liberdade é a doçura da vida, o descanso do homem com igual paralelo de uns para outros, finalmente a liberdade é o repouso, e bem-aventurança do mundo.
A França está cada vez mais exaltada, a Alemanha já lhe dobrou o joelho, Castela só aspira a sua aliança, Roma já vive anexa, o Pontífice já está abandonado, e desterrado; o rei da Prússia está preso pelo seu próprio povo: as nações do mundo todas têm seus olhos fixos na França, a liberdade é agradável para vós defenderdes a vossa Liberdade, o dia da nossa revolução, da nossa Liberdade e da nossa felicidade está para chegar, animai-vos que sereis felizes para sempre.
Na verdade, para o autor, esses boletins constituíram-se no mais vigoroso instrumento de divulgação dos revolucionários de 1798, como nítida compensação à inexistência de meios impressos, sustentando que, em face das precariedades técnicas da época, devem ser comemorados, senão como ato legítimo de imprensa, como seu alvissareiro embrião e prova coletiva de vontade redentora e modernizadora da Colônia do Brasil, 220 anos depois.
.........
FLORISVALDO MATTOS:
Nascido em Uruçuca, antiga Água Preta do Mocambo, na Região
do Cacau da Bahia, quando ainda distrito de Ilhéus, residindo depois em
Itabuna, onde cursou no Ginásio da Divina Providência, e transferindo-se depois
para Salvador, Florisvaldo Mattos diplomou-se em Direito, em 1958, mas optou
pelo exercício do jornalismo, no mesmo ano, integrando inicialmente a equipe
fundadora do Jornal da Bahia, como extensão da militância cultural de
parcela do grupo nuclear da Geração Mapa, atuante, nos anos 1960, sob a
liderança do cineasta Glauber Rocha.
Foi professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde
ministrou disciplinas e ocupou cargos na Faculdade de Comunicação, e foi
presidente da Fundação Cultural do Estado da Bahia, de 1987 a 1989; jornalista,
escritor e poeta, desde 1995 ocupa a Cadeira 31, da Academia de Letras da
Bahia.
Atuação em jornais: Jornal da Bahia, Estado da Bahia, Diário
de Notícias, Jornal do Brasil (RJ); afastou-se do jornalismo em 2011, no cargo
de Diretor de Redação do jornal A Tarde, de Salvador, onde antes editou
por quase 14 anos o caderno “A Tarde Cultural”, premiado em 1995 pela
Associação Paulista de Críticos de Arte – APCA, na categoria de Divulgação
Cultural.
É autor dos seguintes livros: Reverdor, 1965, Fábula
Civil, 1975, A Caligrafia do Soluço & Poesia Anterior, 1996 (Prêmio
Ribeiro Couto, da União Brasileira de Escritores), Mares Anoitecidos,
2000, Galope Amarelo e outros poemas, 2001, Poesia Reunida e Inéditos,
2011, Sonetos elementais, 2012, Estuário dos dias e outros poemas, 2016,
e Antologia Poética e Inéditos, 2017 (todos de poesia); Estação de
Prosa & Diversos, (coletânea de ensaios, ficção e teatro, 1997); A
Comunicação Social na Revolução dos Alfaiates, 1998 (1ª edição), e Travessia
de oásis - A sensualidade na poesia de Sosígenes Costa, 2004, ambos de ensaio.
............
LANÇAMENTO: Assembleia Legislativa da Bahia
LIVRO: A Comunicação
na Revolução dos Alfaiates
2ª Edição. Salvador: ALBA, 2018, 208, p.
AUTOR: Florisvaldo Mattos
LOCAL: Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB)
DATA: 24/08/2018
HORÁRIO: 18 horas
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário