Até o ano passado eu ainda estava indo...
Indo morar no apartamento mais alto, do prédio mais alto, do
bairro mais nobre. Indo comprar o carro do ano, a bolsa de marca, a roupa da moda.
Claro que para isso, durante o caminho de ida, eu fazia hora
extra, fazia serão, fazia dos fins de semana eternas segundas-feiras. Até que um dia, meu
filho quase chamou a babá de mãe!
Mas, com quase quarenta, eu estava
chegando lá. Onde mesmo? No que ninguém conseguiu responder. Eu imaginei que quando chegasse lá, ia ter uma placa com a
palavra fim. Antes dela, avistei a placa de retorno e, nela mesma, dei
meia volta.
Comprei uma casa no
campo (maneira chique de falar, mas ela é no meio do mato mesmo). É longe que
só a gota serena! Longe do prédio mais alto, do bairro mais chique, do carro
mais novo, da hora extra, da babá quase mãe.
Agora tenho menos dinheiro e mais filho. Menos marca e mais tempo.
E não é que meus pais (que quando
eu morava no bairro nobre me visitaram quatro vezes em quatro anos), agora vêm
pra cá todo fim de semana? E meu filho anda de bicicleta, eu rego as plantas e meu
marido descobriu que gosta de cozinhar (principalmente quando os ingredientes
vêm da horta que ele mesmo plantou).
Por aqui, quando chove, a Internet não chega. Fico torcendo que chova, porque é quando meu filho,
espontaneamente (por falta do que fazer mesmo), abre um livro e, pasmem, lê. E
no que alguém diz: "a internet voltou!", já é tarde demais, porque o
livro já está melhor que o Facebook, o Twitter e o Orkut juntos.
Aqui se chama "aldeia" e tal qual uma aldeia
indígena, vira e mexe eu faço a dança da chuva, o chá com a planta, a rede de
cama. Aos domingos, converso com os vizinhos. Nas segundas, vou trabalhar, contando as horas para
voltar...
Aí eu me lembro da placa retorno e acho que nela deveria
ter um subtítulo que diz assim: "retorno – última chance de você salvar sua
vida!" Você, provavelmente, ainda está indo. Não é culpa sua. É
culpa do comercial que disse: "Compre um e leve dois". Nós, da banda de cá, esperamos sua visita. Porque sim, mais dia menos dia, você também vai querer fazer
o caminho de volta...
Téta Barbosa é jornalista, publicitária, mora no Recife e
vive antenada com tudo o que se passa ali e fora dali.
* * *
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