6 de junho de 2018
Péricles Capanema
Vai e vem; e vem e vai sem fim. Em evidência nos últimos
dias, o caminhoneiro é das profissões mais simpáticas do Brasil. Trabalho duro,
perigoso, espinhento. Sofre trombadas, não capota, segue na pista.
Empreendedor, esbanja energia para crescer; sabe, vitamina de motorista é
poeira.
O carroceiro é seu parceiro, pequeno caminhoneiro das
antigas cidades do interior (e até das capitais). Foram longe na estrada da
vida, grandes fortunas no Brasil têm origem na carroça, no assento e no burro
(hoje, na carroceria, na boleia e no motor).
Breca. No começo da paralisação recente veio desse acervo
grande parte do enorme apoio público de que gozaram. Gente sofrida, era preciso
apoiá-la. Imediatamente depois a paralisação foi vista como oposição a “tudo o
que está aí”, corrupção, privilégios malucos, gastança. Era também para
consertar o Brasil, ampliou em muito a aprovação.
O apoio murchou na hora em que as telas mostraram as cenas
de desabastecimento, apodrecimento e morte da produção, suspensão de cirurgias,
gritarias de produtores rurais, advertências de economistas, comida faltando na
mesa. Como um pêndulo o sentimento popular correu ligeiro para o outro extremo.
De fato, ficou impopular a paralisação, mas se manteve o
apreço pelos caminhoneiros. Os políticos e os formadores de opinião, temerosos
de lhes faltar chão nos pés, também oscilaram fortemente em poucos dias, o
apoio inicial caloroso se fez silêncio ou crítica.
Uma primeira lição, já clara no rescaldo dos protestos de
2013 (lembro outro, também no movimento do Cansei): bobagem confundir
oposição séria com exasperação emocional. Na irritação do sentimento existe
oposição, mas é pouco aproveitável na maior parte dos casos. E, no longo prazo,
ou a emoção se faz princípio e aí gera decisão estável, ou, nada feito.
Na raiz da paralisação está um ponto cada vez mais destacado
por fundamental. O crédito subsidiado do BNDES no governo Dilma levou a excesso
de compra de caminhões. Financiamento fácil, caminhões demais. Daí excesso de oferta
de frete, pois houve queda na demanda por ele. O movimento dos caminhões nas
estradas de momento é 26% menor do existente entre 2003 e 2007.
Entre 2014 e 2016, último ano nas estatísticas, foram
fechadas 72 mil vagas de motoristas. Com a crise, já de uns cinco anos, o setor
está asfixiado. O único modo de conseguir fretes melhores é com o
desenvolvimento da economia — aí cresce a necessidade por fretes e sobe seu
preço. Não dá para mexer nesse quadro em poucos dias.
Pior ainda, nas últimas semanas subiram forte as cotações do
barril do petróleo no mercado internacional, o maior patamar em duas décadas.
Provocaram ajustes contínuos no mercado interno no diesel e na gasolina.
A insatisfação explodiu. Como paliativos, foram oferecidos
tabelamento, contratação sem licitação por órgãos públicos, diminuição de
R$0,46 por litro de óleo. Nos órgãos públicos, aplica-se a tabela. Ali, o
caminhoneiro lucra, perde o contribuinte.
Em muitos casos, de particular para particular, o contratante
do frete vai fazer cotação. E o caminhoneiro, que já vivia mal, mas vivia
desembolsando os R$0,46 que agora não paga, vai baixar ainda mais sua proposta
para não ficar parado. A vantagem aqui irá para o contratante do frete.
Haverá um extra à custa do contribuinte. Nota Armando
Castelar, economista da FGV: “A concorrência vai aumentar, clientes podem
pedir desconto. Esses fatores podem reduzir o valor do frete”. Uma vez mais, o
perigo das soluções artificiais.
Fala-se que o governo cedeu muito por estar fraco, sangrando
com as denúncias de corrupção. Correto e insuficiente. A razão maior é outra: 7
de outubro. Os políticos governistas estão pressionando, temerosos de derrotas
e consequente fim de carreira pública.
Podemos esperar mais subsídios, descarados ou disfarçados,
no gás de cozinha e na gasolina. Depois das eleições, a conversa provavelmente
mudará de tom. Sempre foi assim, são maravilhas da democracia.
Termino com um quem avisa amigo é. Em vários momentos da
paralisação, juntaram-se as gritarias da esquerda e de certas direitas,
reclamando ou celebrando. Para mim, recordaram de forma canhestra o pacto
Ribbentrop-Molotov que uniu os interesses da Rússia Soviética e Alemanha
nazista, de Stalin e Hitler, de 23 de agosto de 1939 a 22 de junho de
1941 [foto ao lado].
Fortaleceu ainda a união nazi-comunista o Acordo Comercial
Germano-Soviético de fevereiro de 1940. Dois anos, grosso modo,
trabalharam em uníssono. Partilharam a Polônia, a Rússia anexou territórios,
enviou matéria-prima para o esforço de guerra nazista. E tanta coisa mais.
Por que agora trago à baila o pacto Ribbentrop-Molotov? Para
despertar desconfianças. Quando virem uniões de esquerda e direita, desconfiem,
a direita provavelmente será inautêntica. E a boa causa (em outras palavras, o
que resta da ordem temporal cristã) acabará prejudicada. Seguro morreu de velho,
o desconfiado ainda vive…
* * *
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