10 abril 2011
Não, eu não vou escrever contra a televisão. Não é este meu
propósito quando sentei aqui para redigir este texto.
Esta semana falou-se muito sobre terrorismo, sobre
demências, psicopatas e principalmente sobre a violência. Quem toma sempre a
frente para discutir assuntos dessa estirpe é a mídia. Não vou fazer uma
apologia anti-mídia, pois seria hipócrita e desnecessário, mas queria expor
alguns pontos que noto de incoerência e sensacionalismo.
Um garoto de 23 anos invade uma escola carioca armado com
muita munição, dispara e mata onze crianças, deixa outras tantas feridas e
depois de ser atingido por um disparo de um policial, ele supostamente se mata
na escadaria da escola.
Pessoas se desesperam com a cena. É trágico, é triste e
acima de tudo é novo! Não é comum neste país tropical abençoado por Deus, fatos
como este. Isso é coisa de gringo, aqui a gente tem CPI de tudo quanto é coisa,
aqui a gente tem dinheiro na cueca, morro que desaba, guerra civil do tráfico
de drogas e armas (ainda voltamos a este assunto), contudo não estamos
acostumados a noticiar transtornos sociais que resultam em assassinatos em massa.
Ouvi muita m.... essa semana, muitos entendidos de segurança
pública, muitos mímicos do Freud, muitos alarmistas, enfim, todos precisam
entender ou tentar explicar algo que por si só já é claro o suficiente. O
garoto chegou ao limite dele e surtou, se está certo ou não como podemos saber?
Os assassinatos são crimes, isso é fato, é o que a lei nos diz, os crimes devem
ser julgados e sentenciados. Todavia tantos julgamentos já foram feitos,
inclusive por pessoas públicas formadoras de opinião e muitos nomes já foram
atribuídos ao jovem sem ao menos tentar entender todo o cenário deste drama com
final trágico!
Naquela manhã eu confesso que estava tomando café e
assistindo (a aspirante a Ophra do Brasil) Ana Maria Braga. Mais uma vez ela
estava falando de Bullying para a dona de casa entender. Eu pensei: - Porra,
essa m.... de novo, parece que ela quer é promover o bullying e não tentar
entendê-lo e discutir sobre.
O pensamento mal acabou de ser formulado e já entra uma
repórter desesperada salivando o acontecimento na escola. Ela estava com várias
notícias desencontradas, no começo era o pai de um aluno que estava armado,
depois disse ser traficante, depois um ex-namorado. Foi um tiroteio de
informações e dali por diante se você quisesse ver televisão aberta nacional,
estava condenado ao vômito de informações não depuradas, a jornalistas
histéricos, a plantões segundo a segundo cheios de pleonasmos e redundâncias.
Eu fiquei mal com as primeiras reportagens, mas depois
comecei a prestar atenção no desenho que se fazia ali. Eles estavam se
alimentando do caso, não informando. Chegou ao cúmulo de uma tia da prima do
vizinho de alguma das crianças vítimas do atentado, dar entrevista. E eu vou
querer saber o que a tia da prima do vizinho tem a dizer? Fui saindo do estado
de telespectador para estado de observadora do trabalho midiático.
Dois dias após o acontecimento, até o carteiro que passava
na rua após o incidente era entrevistado:
- Ficou triste agora de entregar cartas, né? Você conhecia
as crianças?
Deprimente!
Hoje domingo, vejo um programa desses que não tem formato
definido e no meio de tudo que empurram goela abaixo do pobre telespectador,
eles querem ser agente de notícias também. Ora, entre mulheres seminuas e
provas com torta na cara, há sempre espaço para a seriedade do jornalismo, não
é mesmo?!
A âncora (ou apresentador ou macaco de auditório, como
preferir) dizia que se as crianças notassem comportamentos estranhos dos
“coleguinhas” que deveriam denunciar, pois ele pode estar escondendo um
transtorno psicológico ou algo do tipo. Eu assistia com a minha mãe que é uma
vítima perfeita dessa mídia maldita e afetada e soltei um puta que pariu bem
sonoro, ela se virou e me perguntou o porquê da blasfêmia, daí começou o
interesse em escrever e desabafar minha angustia e minha tristeza para com essa
fanfarra que fazem em cima das tragédias.
Eu não sou jornalista, alias tenho um respeito enorme pela
profissão. Porém acredito que como profissional você TEM que ser imparcial, ou
então seria um comentarista, um colunista, qualquer coisa que termine com “ista”,
incluindo fascista!
Não vou defender o garoto que entrou atirando na escola. Não
preciso defendê-lo, até porque ele já está morto e o pobre coitado corre o
risco de ser enterrado como indigente. Muitas pessoas comemoram essa situação,
o fato dele não ter ninguém para reconhecê-lo no IML e eu lamento isso
percebendo aí o começo de todo o desastre, esse garoto é tão vítima do
verdadeiro assassino quanto qualquer criança que tenha morrido através das
balas de seu revolver.
As armas que ele tinha em mãos, ele não comprou no
supermercado, ele não ganhou do papai-noel. Essas armas são oriundas do trafico
e do contrabando, vendo esses apresentadores de TV, gritando aos quatro ventos
que o moleque é assassino, covarde e o pior dos seres humanos, indago: será que
este cidadão que é uma figura pública lembra-se disso quando acende seu baseado
ou encara aquela carreira?
Pura demagogia maldita. No fundo todos sustentam o tráfico e
o pior, nós que giramos a manivela que faz a maquina funcionar. Somos todos
escravos das coisas que nos falam via televisão, internet e rádio, fora as
mídias impressas. O garoto era um garoto qualquer, se ele sofreu abusos
psicológicos e físicos, se era gay, se era verde, se roubava, cheirava ou
amava, agora não faz mais diferença, pois não irá trazer nem ele e nem as
crianças que ele matou de volta. Todos os dias crianças morrem, mas talvez
porque sua TV não dê importância para elas, você também não dá.
O que é inaceitável é o
estado critico que se forma com relação ao assassino e o perigo da
generalização. Uma figura publica dizer que as crianças devem se atentar para
comportamentos estranhos dos “coleguinhas” é aterrorizante. Não tem como
classificar um comportamento estranho, o que seria este comportamento estranho?
Com discursos imbecis só se licita mais a intolerância com o diferente, promove
o preconceito (o que é normal para mim pode ser estranho para você) e faz com
que andemos para trás.
A mídia vampiresca, esta que está aí, mais interessada em
entreter dona de casa do que informar. Esta mídia que julga e joga um jovem
como principal culpado de um atentado sem precedentes como este, essa mídia
covarde que não assume a sua culpa dentro deste caos, ela sim deveria ser
julgada e condenada...
Não quero soar como anti-mídia, mesmo soando, de fato mesmo
sendo, não quero cair nessa armadilha que é se posicionar oficialmente contra
algo que é elementar para a construção da comunicação social e com o risco
claro e certo de ser chamada de hipócrita, este é um pequeno manifesto
individual de alguém cansada de ser chamada de burra!
Tenho um compromisso comigo de ser a mudança que eu quero
ver, interminavelmente caminhando para atingir uma comunicação plena, sem
ruídos, de promover um telespectador mais critico, uma mídia mais responsável e
não tão circense.
No momento sinto vergonha e decepção por tudo que leio e
assisto, ao me deparar com esta avalanche de bobagem penso que não há espaço
para verdade enquanto todos se esconderem da responsabilidade que é ter sua
própria opinião, ter realmente uma própria opinião e não uma opinião própria
alienada.
Muitas crianças ainda vão morrer se continuarmos focando no
problema errado, se não for diagnosticado agora o estado psicológico que
estamos vivendo, se não nos atentarmos para as coisas que escutamos e fizermos
uma triagem de informações, seremos como gados conduzidos para o abate!
Parafraseando Howard Beale em Network de 1976:
Parafraseando Howard Beale em Network de 1976:
"I am a HUMAN BEING, God damn it! My life has
VALUE!"
(Autor não mencionado)
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