Raiva e Gênio
Numa entrevista perguntaram a Jean Michel Basquiat o que
motivava a sua arte.
Ele respondeu que era cerca de 80% Raiva. Acredito nisso.
A raiva é um sentimento sagrado.
É um rato que rói por dentro as entranhas com mandíbulas de cão a fazer o gênio voar: é o sangue no olho do negro drama a restituir em alguns
momentos a sua realeza obliterada.
É a sanidade de Estamira enlouquecida.
É o pixador que no alto de um arranha-céu em frenesi de uma
metrópole cinza escreve em forma de hierográfico egípcio a palavra zanga.
É Cruz e Sousa emparedado com a morte dos seus filhos.
Caralho.
É a tosse etílica de Lima Barreto a explodir sangue no denso
manuscrito. É o quebranto das “aberrações afetivas” a impossibilitar o
negro amor.
É nó que se desfaz só no grito. Bote fé. É a mãe que coloca
o facão no pescoço do gambé para não matar o seu filho.
É a dor que forma o gênio, é o gênio que consome a vida, é
viver grande em tempo de morte.
Davi Nunes é colaborador do portal SoteroPreta, mestrando no
Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem- PPGEL/UNEB, poeta, contista
e escritor de livro Infantil
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