Epifania: "viver em
saída"
“E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles,
até parar sobre o lugar onde estava o menino” (Mt 2,9)
A “travessia” vivida pelos Magos é a mesma que todos
experimentamos; somos seres “em saída”, em contínua busca. Quem busca não
permanece sentado olhando o teto ou paralisado com o comando da tv na mão; hoje
somos milhões de pessoas buscando permanentemente no Google, no Facebook, no
WhatsApp..., sentados, parados, anestesiados...
Quem “sai” está deixando sua acomodada segurança, expondo-se
ao que não conhece ou lhe dá medo conhecer. Há milhões de pessoas saindo sem
pôr os pés na rua, de garagem em garagem, de centro comercial em centro
comercial, viajando de metrô com os olhos fixos no celular, transitando por
circuitos perfeitamente estabelecidos para não ver o que há mais além do
“parque temático” que lhe é apresentado. Há muitos milhões que vivem com uma
venda nos olhos, quer estejam em casa ou saiam para fazer exercícios. Quê
buscam? Quê as animam a sair? O quê encontram?
O relato dos Magos não faz referência a pessoas concretas,
mas a personagens. Não eram reis, mas “magos”, ou seja, sábios que investigavam
os céus para entender melhor o que se passava na terra. Porque estavam
buscando, descobriram, encontraram. Notemos que são os que estavam longe que
descobriram, enquanto que aqueles que estavam próximos do Menino não se
inteiraram de nada.
Para descobrir a presença de Deus, o único definitivo é a
atitude. Ao descobrir algo surpreendente, puseram-se a caminho. Não sabiam para
onde iam, mas arriscaram. No caminho que os Magos percorreram para aproximar-se
de Jesus estão representadas as atitudes daqueles que buscavam a Jesus e se
aproximavam das primeiras comunidades cristãs para conhecê-lo. E está também
representada nossa busca.
O importante, no texto de Mateus, não é deter-nos na
veracidade histórica dos Magos, mas descobrir a “pérola preciosa” que o
evangelista oferece, tanto para as primeiras comunidades cristãs como para os
judeus que se aproximavam para conhecer Jesus através de seu testemunho.
Como eles poderiam situar-se diante do nascimento de Jesus?
Segundo o Evangelista, diante de Jesus podem ser adotadas atitudes muito
diferentes. O relato dos magos nos fala da reação de três grupos de pessoas. As
autoridades religiosas, que conheciam muito bem a lei judaica e sabiam o que
significava Belém para a corrente profética, não souberam ler os sinais dos
tempos e não puderam encontrar Jesus. A religião, quando se reduz a simples
práticas rituais, atrofia a sensibilidade da pessoa, impedindo-a abrir-se às
surpresas de Deus.
O poderoso rei Herodes, preocupado em preservar seu poder,
só vê perigo diante de qualquer situação diferente. Nenhum poder é mediação
para deixar-se provocar pelo novo. Somente alguns pagãos, guiados pela pequena
luz de uma estrela, buscaram, puseram-se em marcha e encontraram Jesus.
O relato é desconcertante. Deus, escondido na fragilidade
humana, não é encontrado pelos que vivem instalados no poder ou fechados na
segurança religiosa, mas se revela àqueles que, guiados por pequenas luzes,
buscam incansavelmente uma esperança para o ser humano, na ternura e na pobreza
da vida.
Os Magos não pertenciam ao povo eleito, não conheciam o Deus
vivo de Israel. Nada sabemos de sua religião nem de seu povo de origem. Só
sabemos que eles viviam atentos ao mistério que se encerra no cosmos. Seu
coração buscava verdade.
Em algum momento acreditaram ver uma pequena luz que
apontava para um Salvador. Precisavam saber quem era e onde estava. Abriram-se
à luz da estrela e rapidamente puseram-se a caminho. Seria uma perda de tempo?
Valia a pena fazer a travessia? Não conheciam o itinerário preciso que deveriam
seguir, não sabiam para onde a estrela os conduziria e o caminho implicava
riscos. Mas em seu interior ardia a esperança de encontrar uma Luz para o
mundo.
Quando os Magos se desviaram da rota de Belém e entraram em
Jerusalém para perguntar onde é que estava o rei dos judeus recém-nascido, a
estrela desapareceu de suas vistas, como que indicando que não é na riqueza e
no luxo das cortes que a Luz de Deus brilha para os corações. A estrela também
moveu os magos a que deixassem de olhar para ela; que olhassem antes para o
lugar, na Terra, para onde ela apontava e sua luz iluminava. Pois é na
simplicidade e pobreza de uma criança que resplandece a luz de Deus.
Os magos não caem de joelhos diante de Herodes: não
encontram nele nada digno de adoração. Não entram no Templo grandioso de
Jerusalém: tem acesso proibido. A pequena luz da estrela os atrai para o
pequeno povoado de Belém, longe de todo centro de poder. Ao chegar ao lugar
indicado, vêem somente o “menino com Maria, sua mãe”. Nada mais. Um menino sem
esplendor nem poder algum. Uma vida frágil que necessita dos cuidados de uma
mãe. É suficiente para despertar nos magos o assombro.
Eles prostram-se e adoram o Menino Jesus. Cena poética onde
Mateus nos ajuda a romper nossos esquemas mentais. Aqueles que conheciam as
escrituras de memória e sabiam interpretá-las não vão ao encontro de Jesus.
Aqueles que sabem ler as estrelas são capazes de ver mais além das aparências.
E o que veem nesse Menino é tão profundo que caem prostrados, tiram seus
tesouros, esvaziam-se e enchem-se da nova Luz descoberta.
Foi assim que a longa jornada dos Magos começou seguindo o
caminho que a luz da estrela indicava. E ao final de longa peregrinação
chegaram ao lugar procurado. “Banhado pela suave luz da estrela, em meio a
vacas, jumentos e palha, se encontrava um nenezinho. Eles, então, foram
iluminados. Não pela luz da estrela, mas pela luz da criança. Perceberam que
sua busca havia chegado ao fim. Aquilo que os adultos esqueceram e que a sabedoria
busca – as crianças sabem.
Ser sábio é ser criança. O universo é um berço onde dorme
uma criança. E desde aquele dia eles deixaram de olhar para as estrelas e
passaram a olhar para as crianças.
Os sábios vêem o avesso. O avesso é esse: os adultos são os
alunos; as crianças são os mestres. Por isso os magos, sábios, deram por
encerrada a sua jornada ao encontrarem um menino numa estrebaria...
No Natal, todos os adultos rezam a reza mais sábia de todos,
escrita pela Adélia Prado:
“Meu Deus, me dá cinco anos, me dá
a mão, me cura de ser grande...” (Rubem Alves)
Texto bíblico: Mt 2,1-12
Na oração: Inspirados nos Magos, que descobriram sinais e
começaram um caminho de busca, podemos nos perguntar: quê sinais descobrimos
durante o ano de 2016? Para onde nos conduzem esses sinais, como se fossem
estrelas? Eles nos fazem sair de nossa “zona de conforto”, de nossas
seguranças...? Eles nos ajudam a priorizar a viagem ao interior de nós mesmos?
- A estrela que seguimos nos mobiliza ter acesso à nossa
“gruta” interna, onde nova vida pulsa por nascer, ou preferimos alimentar uma
multidão de contatos superficiais através das redes sociais, afogando-nos nas
experiências de solidão?
- Nossas “viagens” despertam o espírito solidário e nos
comprometem a responder às necessidades dos mais frágeis ou permanecemos
confinados em nós mesmos, “adorando” nosso “ego”?
Pe. Adroaldo Palaoro
sj
* * *
Muito bom.
ResponderExcluirEntão, vamos SAIR?????
Eu preciso urgentemente deixar a minha zona de conforto. Sair em busca da minha "pérola preciosa", que há algum tempo anda esquecida... Que a MÃE me ajude...
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