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quinta-feira, 24 de março de 2022

POR FALAR EM BOMBA ATÔMICA…LEMBREMO-NOS DO MILAGRE DE HIROSHIMA



Hiroshima destruída pela bomba atômica em 1945.

Os sacerdotes Hugo Lassalle (Superior dos jesuítas no Japão), Hubert Schiffer, Wilhelm Kleinsorge e Hubert Cieslik [assinalados no círculo da foto] estavam em Hiroshima no momento da explosão da bomba atômica. Eles se encontravam na casa paroquial da igreja de Nossa Senhora da Assunção, um dos poucos edifícios que resistiu à bomba. Um dos sacerdotes estava celebrando a Santa Missa, outro tomava o café da manhã e os demais se encontravam em dependências da paróquia.

 

Plinio Maria Solimeo

No dia 6 de agosto de 1945, solenidade da Transfiguração de Nosso Senhor e praticamente no fim da II Guerra Mundial, a aviação americana lançou sobre a cidade de Hiroshima, no Japão, a bomba atômica “Little Boy”, de urânio, que provocou a morte de 140 mil pessoas, mais de 70 mil feridos, e grande parte da cidade destruída. Três dias depois, a mesma aviação lançou a bomba nuclear de plutônio, “Fat Man”, sobre a cidade de Nagasaki. Essa bomba destruiu a catedral da Imaculada Conceição, matando muitos católicos que estavam no templo. Foi a primeira e única vez em que armas nucleares foram usadas contra alvos civis.

Devido à radiação, entre dois a quatro meses após os ataques atômicos, os efeitos agudos das explosões mataram entre 90 e 166 mil pessoas em Hiroshima, e 60 a 80 mil em Nagasaki. Durante os meses seguintes, várias pessoas morreram por causa do efeito de queimaduras, envenenamento radioativo e outras lesões, que foram agravadas pelos efeitos da radiação.

Nesse terrível cenário, ocorreu nessa cidade um fato surpreendente, que passou a ser conhecido como o “Milagre de Hiroshima”: quatro sacerdotes jesuítas alemães sobreviveram à catástrofe, inclusive a seus efeitos, apesar de estarem muito perto do local onde a bomba explodiu.

Esses religiosos eram os padres Hugo Lassalle (Superior dos jesuítas no Japão), Hubert Schiffer, Wilhelm Kleinsorge e Hubert Cieslik [assinalados no círculo da foto acima]. No momento da explosão, eles se encontravam na casa paroquial da igreja de Nossa Senhora da Assunção, um dos poucos edifícios que resistiu à bomba. Um dos sacerdotes estava celebrando a Santa Missa, outro tomava o café da manhã e os demais se encontravam em dependências da paróquia.

O edifício religioso sofreu apenas danos menores, como vidros quebrados, conforme escreveu o Pe. Hubert Cieslik em seu diário, mas nenhum dano em consequência da energia atômica liberada pela bomba. O Pe. Schiffer escreverá depois o livro O Rosário de Hiroshima, no qual narra tudo o que lhes sucedeu naqueles dias fatídicos.

Os religiosos atribuem sua preservação a uma proteção particular da Santíssima Virgem, pois “vivíamos a mensagem de Fátima e rezávamos juntos o Rosário todos os dias”.

Quando, mais tarde, esses jesuítas receberam tratamento médico, foi-lhes dito que devido à radiação eles teriam lesões graves, enfermidades, e inclusive uma morte prematura. Porém, contra todas as expectativas, tal não sucedeu. Nenhum deles teve qualquer transtorno físico.

Pelo contrário, em 1976 — 31 anos depois do lançamento da bomba —, o Pe. Schiffer participou do Congresso Eucarístico de Filadélfia, onde relatou sua história. Ele confirmou que os quatros jesuítas ainda viviam, sem nenhuma enfermidade. Isso foi comprovado por dezenas de médicos que os examinaram cerca de 200 vezes nos anos posteriores, não encontrando qualquer sinal da radiação em seus corpos.

O Pe. Hugo Lassalle continuou em Hiroshima, e em 1948 naturalizou-se japonês com o nome Enomiya Mabiki. De passagem por Roma, recebeu do Papa Pio XII autorização para recolher fundos destinados a reconstruir a igreja dedicada à Assunção de Nossa Senhora. Em 1959, com a elevação de Hiroshima a diocese pelo Papa João XXIII, ela passou a ser catedral. Sua construção começou em 1950 e foi concluída no dia 6 de agosto de 1954, nove anos após a explosão da bomba atômica.

É preciso dizer que a rendição do Japão se daria na solenidade da Assunção da Virgem aos Céus, 15 de agosto de 1945, poucos dias depois da explosão das bombas atômicas.

Hiroshima foi reconstruída totalmente, com aquela tenacidade própria aos filhos do Sol Nascente, contando hoje com mais de um milhão e cem mil habitantes.

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Fonte principal: https://www.aciprensa.com/noticias/el-milagro-de-hiroshima-jesuitas-sobrevivieron-a-la-bomba-atomica-gracias-al-rosario-50173?utm_source=boletin&utm_medium=email&utm_campaign=noticias_del_dia

 

https://www.abim.inf.br/por-falar-em-bomba-atomica-lembremo-nos-do-milagre-de-hiroshima/

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quarta-feira, 23 de março de 2022

POEMA DE PÁSCOA: A Jesus Cristo, Nosso Senhor




A Jesus Cristo Nosso Senhor

Gregório de Matos 

 

Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto um pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na Sacra História:

Eu sou, Senhor, ovelha desgarrada;
Cobrai-me; e não queirais, Pastor Divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.

 


Gregório de Matos Guerra
, alcunhado de Boca do Inferno ou Boca de Brasa, foi um advogado e poeta do Brasil Colônia. É considerado um dos maiores poetas do barroco em Portugal e no Brasil e o mais importante poeta satírico da literatura em língua portuguesa no período colonial. Wikipédia

Nascimento: 23 de dezembro de 1636, Salvador, Bahia

Falecimento: 26 de novembro de 1696, Recife, Pernambuco

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segunda-feira, 21 de março de 2022

MUNDICA PINDONGA – Nelson de Faria



Mundica Pindonga
Nelson de Faria

           A notícia nasceu mofina, desinteressante, naquela casa de porta e janela da Rua dos Sete Pecados. Engatinhou pela rua abaixo e foi crescendo. Disparada, passou ventando pelo Largo da Igreja. Engrossou mais ainda na Rua de Cima e atingiu, já gordota, a Ladeira do Cansa-Cavalos. Aí, na casa do Tonico Salatiel, parou um tiquim – a mó que descansando do esforço da subida. Voltou, desembestada, já arrebentando botões de braguilhas, alargando bocas em gargalhadas descontroladas. Os mais discretos paravam para ouvir os comentários ferinos e seguiam caminho,  de nariz franzido e, à flor dos lábios, um sorriso de incredulidade. Os que não tinham papas na língua comentavam o fato, sem caridade pela desgraça alheia. Outros, numa papeada danada, ouviam com atenção, levantavam os olhos para o céu:

          - Coitado do Joaquim-Mutamba! Homim bom, tá ali, sem fel, sem peçonha, sem nada...

          Na venda do Chico Quirino, um da roda falava alto:

          - Pois, não é que o Quincas-Mutamba se estrepou! Mundica desmoralizou o cujo de uma vez. Também, pra quê se engraçar com uma quenga daquelas?

          Confidenciavam-se, esgravatando-se o caso. Dizia Zé Orestes na botica de Sêo Arrudas, enquanto este suspendia a manipulação de um elixir depurativo:

          - A Mundica desceu as calças do lenheiro, prendeu a cabaça do cujo entre as pernas – nossa, que posição desgraçada, sô – e aplicou, nos traseiros dele, umas boas chineladas. Foi assim que me contaram, nhor sim... e eu estou vendendo o peixe pelo mesmo preço da compra...

          Filogônio Arrudas, o boticário, gostava de eufemismos, empregava palavras de pronúncia difícil, expressões em desuso. Fazia-se de letrado, de prestígio avantajado, abusando desse artifício. Falou, sorrindo:

          - Então, Zé Orestes, o glúteo do Quincas ficou como se fora cara de menino rico, sanguínea e edemática, não é assim?

          Zé Orestes confirmou, com um sorriso canalha na boca desdentada, embora não soubesse o significada daquelas palavras estranhas aos seus ouvidos. Estimulado pela curiosidade que lia na cara do boticário, Zé Orestas descreveu a cena com tanta riqueza de detalhes que Filogônio Arrudas e, logo depois, toda a cidade não tinham mais dúvidas:  Quincas-Mutamba apanhara – e de chinela! – de Raimunda Pindonga, dita Mundica Tomba-Homem, cuia das mais muito faladas do sertão de Cateriangongo. Não era aquela a primeira de suas façanhas comentadas. Diziam que ela já havia tirado a pevide de muito sujeito de pabulagem. Avalentoava-se à toa, a danada. Não deixava a mandioca pubar. Suas amigas mais chegadas falavam que a cuja era inté criatura prestativa, mão-aberta, dadeira sem limites. Mais porém, quando gostava de um homem – coisa não muito frequente – gostava mesmo muito, muito, desse gostar que deixa a gente de siso raleiro, não admitindo conselhos e insinuações. Sentia ciúmes e começava a beber. O pior de tudo era que um dedal de restilo esquentava o sengue dela, e era aquela lazeira. Trepava nos tamancos. Se o cabra não fosse esperto, virava molambo entre as pernas dela. Remanisca, forçuda pra danar, dava logo dois tombos no cujo, prendia-lhe os braços entre as coxas musculosas e se ria, depois, toda ancha, gozando a derrota do espevitado. Se o preferido, porém, era forte, cabra sem belida, de ideias alimpadas, a mulata, primeiro, afrouxava as carnes dele com carinhos de sustança; amolentava-lhe as forças com mixilanga somente dela conhecida e, quando percebia que o sujeito não aguentava mais uma gata pelo rabo, investia. Aplicava-lhe cabeçadas na barriga, jogava-o no chão, arranhava-lhe as bochechas. Despois... bom, despois, sentia remorsos da doidera praticada, passava meizinhas nas feridas do infeliz, chorava, chorava, implorando-lhe perdão. Despachava aquele, curtia jejum de homem dois ou três meses. Por via dessas coisas malucas, foi que o apelido “Tomba-Homem”, que nela se ajustava que nem visgo, pelo sertão se espalhou como azeite que se derrama em riba da água.

          Ora, muito que bem. Quincas-Mutamba era sujeito estimável. Magro, pacato, pequeno de corpo, viúvo sem filhos, ganhava a vida fornecendo lenha às cozinhas da Rua dos Sete Pecados. Madrugadinha, no coice de dois jegues, ia longe, légua e meia ou mais, voltando à tarde. Entregava um feixe aqui, umas achas acolá. Recebia magros tostões, passava na venda do Nicácio, fazia suprimento de boca, engrossava uns dois martelos de pinga, saía meio troviscado. Desencilhava os jegues, examinava-lhes as cernelhas maceradas. Entendia-se melhor com eles do que com o resto dos mortais. Naquela vidinha de pobre, vivendo no seu canto, sem malquerença com os mais, não fedia nem cheirava. Daí a surpresa que causou a todos aquela notícia estuporada. Nem a cidade suspeitava de suas ligações amorosas com Mundica Pindonga. Daquele dia em diante, passou ele a viver numa consumição dos diabos. Inté os meninos da rua se riam dele. Quincas-Mutamba não teve mais sossego. Embezerrou-se. Não saía mais da venda do Nicácio, não deu mais palavra a ninguém. Quando o último tostão foi jogado sobre o balcão e o martelo de restilo lhe tremeu nas mãos incertas, Quincas-Mutamba esquisitou-se. Fechou o punho, esmurrou o balcão, berrou um nome safado.

          - É hoje, porqueira! Espandongo aquela peste!

          Voltou-se para o vendeiro, os olhos faiscando de ira:

          - Quero mais um trago, mais porém, não quero fiado, nhor não. Pra pagar ele, dou pra vosmecê o jegue ruano, bichin bom de carga pra danar.

          Surpreso, Nicácio falou, com brandura:

          - Não carece vosmecê se desfazer do bicho por via de uma talagada, nhor não. Boto na conta. Vosmecê merece mais...

          Quincas interrompeu-o, decidido:

          - Mais, porém, se eu morrer na empreitada? Gardecido, Sêo Nicácio, gardecido. Não lhe ofendo se não aceitar, ofendo?

          Nicácio retornou, conciliador:

          - Ainda que mal lhe pergunte, por que é que vosmecê está assim, meio animoso? Figuro que vosmecê não tá à revelia com alguém, ou tá?

          Quincas-Mutamba tomou fôlego, abaixou a cabeça, murmurou:

          - Quero exemplar aquela diaba!

          - Figuro que não é gente de sua estimação...

          - É de muita estimação, nhor sim. Mais porém...

          O resto da frase perdeu-se no ar, porque Quincas já estava na rua, trocando pernas.

 

          No FUNDO DO QUINTAL, ensaboando panos, Mundica cantava. Quincas-Mutamba nem salvou a pobre. Parou na frente dela – que lhe sorria um largo sorriso de boas-vindas – e foi insultando:

          - Vagabunda! Se é valentia que corre no tutano do seu braço, porqueira, prove agora, cuia sem-vergonha!

          Mundica sorria, encalistrada.

          - Que bicho foi que te mordeu, nêgo? Espiritou? Tu andou bebendo, não andou? Não sou de brigar assim, sem mais nem menos. A frio, brigo não. Se tu botar inflamação no meu sangue, te esbagaço o esqueleto todo!

          Acorreu gente, ouvindo a xirimbambada.

          Quincas não conversou. Fechou a mão, levantou o braço, desfechou o golpe. Apanhou o ouvido da mulher, e ela caiu estatelada. Animosamente, ela se levantava, quando recebeu outro trompaço, no mesmo lugar da primeira pancada. Aí, afocinhou de uma vez. Quincas pabulou:

          - Conheceu, porqueira? – Sorriu para a assistência, afrouxou o correão, puxou da faca. – Só queria exemplar a danada. Se quisesse sangrar a bicha, tava na hora. Não sou esmiolado para fazer uma coisa dessas. E o homem que é macho, mesmo, não mata mulher. Bate nela, só pra exemplar. – E, como para justificar-se, arrematou: - Esta porqueira me achou escornado, me tolheu os braços, me arranhou a cara toda e saiu por aí, boquejando que me bateu. Ora, já se viu despropósito igual? Podia eu lá viver nessa consumição desgraçada, que me esquisitava inté? Podia? – Agachou-se, sungou a mulata pelos sovacos, ajudou-a a se levantar, passou o braço na cintura dela, segredou-lhe: - Te machuquei muito, nêga? Vamos pra dentro, anda.

          E ela, toda chorosa, ainda estonteada:

          - Ocê é ruim que nem cobra, nêgo. Pra quê fazer uma coisa destas na frente de tanta gente?

 

(BAZÉ – ESTÓRIAS SERTANEJAS)

Nelson de Faria

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MORAES se meteu em uma ENRASCADA! O cerco se fecha contra o Ministro e a...

domingo, 20 de março de 2022


 A poesia ecológica de Cyro de Mattos

 Décio Torres Cruz*

 

          Quem ainda não leu Cyro de Mattos precisa conhecer seus livros urgentemente. Este jornalista, advogado, e mestre em capoeira é, também e principalmente, um escritor excelente: poeta, contista, romancista, cronista, novelista, ensaísta, com vários prêmios importantes na bagagem, tais como: o Prêmio Afonso Arinos da Academia Brasileira de Letras, o Prêmio Pen Clube do Brasil e o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte, dentre outros.

          Traduzido em várias línguas, em diversos países, este baiano de Itabuna, membro da Academia de Letras da Bahia, já publicou 64 livros no Brasil e 15 no exterior. Além disso, organizou 5 antologias e 5 coletâneas. Seus dois livros recentes, os quais tive a honra de receber autografados, O discurso do rio (Coimbra, Pallimage, 2020) e Devoto do campo (Itabuna, Editus, 2021), são de um lirismo comovente, que arrebata o leitor e possuem títulos que já constituem um belo poema.

          Estes dois livros podem ser classificados como uma elegia à natureza, uma poesia ecológica que revela seu amor ao meio-ambiente e aos seres que nela habitam, incluindo o bicho-homem que tanto a degrada. O discurso do rio foi publicado também  em Portugal e traz prefácio da Professora Graça Capinha da Universidade de Coimbra. Na verdade, ao escolher a palavra discurso para dar voz às falas dos nossos rios e denunciar a sua destruição pela poluição e desvios de cursos, o poeta brinca com o vocábulo “discurso”, atribuindo a ela um novo significado como antônimo de “curso”: dis-curso”. Se aprendemos com um curso escolar, o dis-curso é o oposto daquilo que deveríamos aprender a fazer, ou seja, em um dis-curso desaprendemos com discursos e práticas antiecológicas: não cuidamos daquilo que deveríamos. Em vez de preservar nossos rios, os destruímos.

          Mas também aprendemos com o discurso que o rio traça em seu curso natural por onde correm as suas águas: ouvimos o seu pedido de socorro na sua linguagem sem voz, agonizante e silenciada. Este canto agônico fica claro em vários de seus versos, como no poema “Das mãos na goela das águas”, que ilustra a quarta capa:

 

“Venho sendo omisso pra refazer

Virginais caminhos de água, dizendo

Melhor, matei o que era para ser

Vivo no seu amanhecer líquido.

 

Eu me acuso por ser indiferente

Ao benefício sempre abundante

De água pura que jorrava na fonte

Peixe e rede na estação competente.

 

E como réu confesso que merece

Por tão grave ilícito ser punido

Chegando do que lhe foi natural,

 

Em noite morta, que nunca enriquece,

Lavro minha sentença, condenado

A viver no abismo que há no Mal.”

 

          No seu mais recente livro Devoto do campo, o autor continua a sua defesa da natureza em belos versos curtos e simples como a própria natureza e o ambiente campestre. Seguindo o estilo de Emily Dickinson, poeta estadunidense por ele homenageada na epígrafe, Cyro dá voz aos elementos campestres componentes daquele habitat bucólico, como o grilo, o jabuti, a aranha, a garça, o pinto, o beija-flor, a borboleta, o papagaio, o boi, a ovelha, o cavalo, o som das asas, a flor, o trinado das aves, a árvore, a foice, a selva, a estrada, a paisagem, o laço, as crenças e as oferendas, a lua, e as claves de sol.

           Não é à toa que este poeta recebeu elogios de escritores ilustres, como Jorge Amado, Assis Brasil, Ledo Ivo e tantos outros, como Carlos Drummond de Andrade que escreveu um poema para homenageá-lo. Seus livros aqui resenhados podem ser adquiridos diretamente com o autor no email: cyropm@bol.com.br. Seus outros livros podem ser encomendados através dos sites das editoras, da Amazon e da Estante Virtual.

 

*Décio Torres Cruz é escritor, crítico literário, poeta, professor universitário e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Literatura e Cultura da Ufba.

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PALAVRA DA SALVAÇÃO (258)


 
3º Domingo da Quaresma – 20/03/2022

Anúncio do Evangelho (Lc 13,1-9)

— O Senhor esteja convosco.

— Ele está no meio de nós.

— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Lucas.

— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, vieram algumas pessoas trazendo notícias a Jesus a respeito dos galileus que Pilatos tinha matado, misturando seu sangue com o dos sacrifícios que ofereciam.

Jesus lhes respondeu: “Vós pensais que esses galileus eram mais pecadores do que todos os outros galileus, por terem sofrido tal coisa? Eu vos digo que não. Mas se vós não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo.

E aqueles dezoito que morreram, quando a torre de Siloé caiu sobre eles? Pensais que eram mais culpados do que todos os outros moradores de Jerusalém? Eu vos digo que não. Mas, se não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo”.

E Jesus contou esta parábola: “Certo homem tinha uma figueira plantada na sua vinha. Foi até ela procurar figos e não encontrou. Então disse ao vinhateiro: ‘Já faz três anos que venho procurando figos nesta figueira e nada encontro. Corta-a! Por que está ela inutilizando a terra?’

Ele, porém, respondeu: ‘Senhor, deixa a figueira ainda este ano. Vou cavar em volta dela e colocar adubo. Pode ser que venha a dar fruto. Se não der, então tu a cortarás’”.

— Palavra da Salvação.

— Glória a vós, Senhor.

http://liturgia.cancaonova.com/pb/

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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Donizete Ferreira – Comunidade Canção Nova:


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Raízes que nos sustentam

 

Imagem: pexels.com

“Vou cavar em volta da figueira e colocar adubo” (Lc 13,8)

 

Temos perdido as raízes? Como conectar-nos com elas? Quê raízes nos alimentam? Onde estamos enraizados? Quais são as raízes que nutrem atualmente nossa vida? São as melhores?

Enraizamento, fincar raízes, viver da profundidade das raízes... O “novo” vem das raízes, vem de baixo, da base, do chão da vida. É preciso relançar uma nova radicalidade. Viver a partir das raízes, projetar a partir das raízes, criar a partir das raízes. Quaresma é tempo para colocar novo adubo e fortalecer as raízes; e viver o tempo das raízes para ser presença “diferenciada”, “enraizados” na realidade cotidiana.

“Descer” às raízes é uma oportunidade privilegiada para nos descobrir e conhecer nosso reino interior, para encontrar nossos recursos mais nobres e assim experimentar a transformação.

O caminho para uma nova qualidade de vida passa pelo encontro com as próprias raízes. Mas essa descida nos possibilita descobrir um mundo diferente que não conhecíamos, ou que havíamos perdido.

Este é o caminho da espiritualidade que brota do húmus; “descer” até o fundo, mergulhar nas dimensões mais profundas onde estão escondidos os “tesouros” que dão significado e sentido às nossas vidas.

Vivemos um contexto social-político-religioso marcado por um profundo desenraizamento, onde somos mobilizados a viver em mundos “sem raízes”, em espaços criados pela tecnologia, comunicando-nos através de relações virtuais com pessoas distantes, desconectando-nos do nosso próprio chão existencial; no emaranhado das imagens e sons perdemos a noção daquilo que é essencial e decisivo para a vida; vivemos na superfície dos acontecimentos e de nós mesmos; esvaziamos a consistência interior e fundamento sobre o qual se apoia a nossa própria vida; congelamos toda proximidade e relação com o outro; petrificamos todo compromisso com as causas mais nobres...

Desenraizar-se é desumanizar-se.

“nova radicalidade” é a maneira original de seguir a Jesus. É uma radicalidade amável e expansiva, porque quem chega às raízes descobre-se implantado na natureza humana, naquilo que todos compartilham e, por isso mesmo, descobre-se e sente-se enraizado no Outro.

Ninguém pode viver sem raízes, pois não se sustentaria de pé. Quando perde suas raízes, o ser humano se atrofia e fica privado de algo decisivo, essencial: de uma fonte de vitalidade.

Superfície significa aqui o esquecimento da raiz, significa viver na distância da vida, desconectado da fonte interior, desarticulado e ocupado com o que não é essencial. Muitas pessoas passam pela vida assim, distraídas como turistas, como “voyeurs”, que consomem, sem descanso, paisagens e imagens de si mesmas, cujo olhar está sempre ocupado com as vitrines ou o próprio umbigo e assim nunca repousam, nunca chegam à raiz de nada.

Jesus, o “homem enraizado” em seu povo e sua cultura, traçou seu caminho em parábolas.

No evangelho deste domingo Ele usa a imagem da “figueira estéril” que não recebera o nutriente necessário. A figueira é uma das árvores mais comuns na Palestina e seu fruto, muito apreciado, é abundante. As flores da figueira são um sinal da primavera. “Sentar-se debaixo da videira e da figueira” é uma expressão proverbial da paz e serenidade da vida no campo (cf. 1Rs 5,5; Mq, 4,4; Zc 3,10).

A isso, precisamente, aponta a parábola da figueira plantada no meio da vinha. Ela também destaca a paciência do vinhateiro. Apesar de “levar” três anos sem dar frutos, o vinhateiro continua confiando nela, ao mesmo tempo que lhe oferece todos os cuidados com esmero: “vou cavar em volta dela e colocar adubo”.

Jesus quer destacar a paciência divina, porque compreende e respeita o momento e o ritmo de cada pessoa. Conhecedor do coração humano, sabe dos condicionamentos de todo tipo que pesam sobre ele: sofrimentos pendentes ou não elaborados; vivências não integradas; feridas não “processadas”; mecanismos de defesa ativados ao longo da vida para poder sobreviver; ignorância básica de quem é e como quer viver...

Precisamos tempo e paciência para crescer em lucidez e em consciência, assim como em liberdade interior, frente aos próprios medos e necessidades, para podermos ser coerentes e fiéis ao melhor de nós mesmos.

A partir dessa fidelidade, tudo começa a adquirir sentido: abrimo-nos a quem somos e vamos construindo relações harmoniosas. Isso é o que significa, segundo o evangelho, “dar fruto”.

Numa chave de leitura interior, a parábola da figueira ativa a virtude da esperança que alimenta, dá sentido à nossa existência e ilumina as profundezas de nosso ser cristão. Na vivência do evangelho, a terra interior também pode ser cavada e adubada, através de diálogos e do encontro com nossa verdade pessoal.

A parábola da “figueira” toca o nosso “eu” mais profundo; é preciso escutá-la e deixá-la ressoar em nosso coração, a terra do nosso campo interior que é cavada e fertilizada. Mas a parábola não só alimenta a esperança; ela também nos desafia a corresponder ao “divino agricultor”, dando frutos.

Talvez tenhamos que parar de exigir certos frutos da nossa árvore; basta os frutos menores ou a sombra que a árvore providencia.

Escavar a terra é o primeiro requisito a ser cumprido para que a árvore interior dê fruto. O segundo é o adubo, que pode ser símbolo para a atenção e o amor, que nos fazem bem e podem nos conduzir ao florescimento e frutificação da nossa árvore. Normalmente, usamos esterco para fertilizar a terra, o esterco da nossa própria biografia pode ser usado como adubo.

Dia após dia, o agricultor leva o esterco ao campo, e, após um ano, o campo dá seus frutos. É uma imagem consoladora, pois, justamente aquilo que consideramos o esterco da nossa vida – os fracassos, as feridas, as derrotas, as fragilidades – se torna o adubo para a nossa árvore da vida e a faz florescer.

A questão está em como cavar, que adubo depositar e que frutos esperamos alcançar. É importante cavar para sanear as raízes, nossas raízes mais profundas onde está a força de Deus vitalizando nossa existência; o alimento, talvez seja conectar mais com a mensagem de Jesus, com o Evangelho e entrarmos em sintonia com o Deus da Vida. Os frutos, sem dúvida, terão mais a cor e o sabor da visibilidade, da ousadia, da liberdade, da denúncia daquilo que atenta contra a dignidade humana, de atrever-nos a abandonar o rotineiro e gerar novas formas de viver o Evangelho nestes tempos tão conflitivos.

Deus é o “paciente Cuidador” e nos alcança na medida em que nos abrimos à sua ação; Sua presença expande e multiplica o melhor de nossa vida. Ao contrário, quando permanecemos reclusos na identificação com nosso ego, irremediavelmente, dia após dia, nossa existência se atrofiará e se empobrecerá.

É fora de dúvida que, dentro de cada um de nós, continuam existindo “figueiras estéreis”, experiências com pouca profundidade, vivências asfixiantes e atrofiantes...  que limitam a liberdade de Deus em atuar em nós. Mas, o ponto de partida é que comecemos por reconhecer nosso terreno interior, reconciliando-nos com ele, abraçando-o com humildade. É no meio da “vinha” que está situada nossa “figueira”.

Desse modo, ao crescer em unificação – integrando também os aspectos mais obscuros e vulneráveis de nossa própria vida -, um bom “húmus” estará se disponibilizando e constituindo a “terra boa” onde a figueira crescerá por si mesma e dará frutos. Devemos descobrir, em cada um de nós, o que atrofia, limita e bloqueia o fluxo da seiva que brota das profundidades de nossa terra interior.

Texto bíblico:  Lc 13,1-9

Na oração: Uma vida que se enraíza, é uma vida firme, consistente. Por outra parte, as raízes na planta, são as que se introduzem na terra e crescem em sentido contrário do tronco, servindo-se como sustentação.

Graças a elas, a planta pode absorver o alimento necessário para seu crescimento.

- o que está “estéril” em sua vida?

- quais são e onde estão as raízes onde seu coração se alimenta? Quais raízes precisam ser sanadas, adubadas... para que deem frutos?



Pe. Adroaldo Palaoro sj

 https://centroloyola.org.br/revista/outras-palavras/espiritualidade/2530-raizes-que-nos-sustentam

 

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