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terça-feira, 30 de maio de 2017

CICLOS - Gloria Hurtado

Ciclos  
Gloria Hurtado


Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver.

Encerrando ciclos... Fechando portas... Terminando capítulos... Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram. Foi despedido do trabalho? Terminou uma relação? Deixou a casa dos pais? Partiu para viver em outro país? A amizade tão longamente cultivada desapareceu sem explicações? Você pode passar muito tempo se perguntando por que isso aconteceu...

Pode dizer para si mesmo que não dará mais um passo enquanto não entender as razões que levaram certas coisas, que eram tão importantes e sólidas em sua vida, serem subitamente transformadas em pó. Mas tal atitude será um desgaste imenso para todos: seus pais, seus amigos, seus filhos, seus irmãos, todos estarão encerrando capítulos, virando a folha, seguindo adiante, e todos sofrerão ao ver que você está parado. Ninguém pode estar ao mesmo tempo no presente e no passado, nem mesmo quando tentamos entender as coisas que acontecem conosco. O que passou não voltará!

Não podemos ser eternamente meninos, adolescentes tardios, filhos que se sentem culpados ou rancorosos com os pais, amantes que revivem noite e dia uma ligação com quem já foi embora e não tem a menor intenção de voltar. As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas realmente possam ir embora. Por isso é tão importante, por mais doloroso que seja, destruir recordações, mudar de casa, dar muitas coisas para orfanatos, vender ou doar livros que tem.

Tudo neste mundo visível é uma manifestação do mundo invisível, do que está acontecendo em nosso coração... e o desfazer-se de certas lembranças significa também abrir espaço para que outras tomem o seu lugar. Deixar-se ir embora. Soltar-se. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos. 

Não espere que devolvam algo! Não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Pare de ligar sua televisão emocional e assistir sempre ao mesmo programa, que mostra como você sofreu com determinada perda! Isso o estará apenas envenenando, e nada mais. 

Não há nada mais perigoso que rompimentos amorosos que não são aceitos, promessas de emprego que não têm data marcada para começar, decisões que sempre são adiadas em nome do "momento ideal". Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará. Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo, sem aquela pessoa... nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade. Pode parecer óbvio, pode mesmo ser difícil, mas é muito importante.

Encerrando Ciclos! Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, Mude o disco, Limpe a casa, Sacuda a poeira. Torne-se uma pessoa melhor e assegure-se de que sabe bem quem é, antes de conhecer alguém e de esperar que ele veja quem você é...

E lembre-se: Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão.



Enviado por: " Gotas de Crystal" <gotasdecrystal@gmail.com>

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ITABUNA CENTENÁRIA: UM POEMA – E Deus criou a mulher!

E Deus criou a mulher!


Quando o universo ainda estava incompleto,
No sexto dia Deus criou a mulher,
E Deus lhe disse:
“Eu te darei...  Um coração cheio de  compaixão,
um espírito livre para voar com os pássaros,
sabedoria para conhecer todas as verdades,
 ânimo para sair da opressão,
força para mover as montanhas,
ternura para beijar a terra,
paixão para inflamar o mundo,
risos para encher os vales,
lágrimas para lavar as penas,
mãos para trabalhar e amar,
intuição para conhecer o desconhecido...”

E Deus lhe disse: “Mulher, eu te criei
à minha imagem e semelhança. Tu és boa!”


(Revista PAZ E BEM)
Texto de autor anônimo transcrito por José Antonio Pagola,

Em Grupos de Jesus, Vozes, p. 206

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segunda-feira, 29 de maio de 2017

ITABUNA ONTEM: OS AREEIROS DO RIO CACHOEIRA

Clique sobre a foto, para vê-la no tamanho original
Os Areeiros do Rio Cachoeira

Texto de José Leal
Fotos Aymorela


Corumbá tem o rio Paraguai; Teresina, o velho Parnaíba de águas barrentas; Porto Alegre, o Guaíba. Enfim: cada cidade tem o seu rio e cada rio tem os seus cantores. O de Itabuna, no sul da Bahia, é o Cachoeira, que está para a capital do cacau assim como o Pão de Açúcar para a Guanabara: é o símbolo da cidade. Um símbolo sereníssimo em tempo de estio, belo, ao mesmo tempo “sofrido com sua gente simples escorrendo o esforço de manhãs e tardes no calendário líquido da vida” - como diz o contista Cyro de Mattos, recém aparecido na paisagem das letras nacionais com o livro “Berro de Fogo”.


Claro que o Cachoeira tem também as suas lavadeiras, pescadores e aguadeiros. Mas não é sobre essa gente humilde que vamos dizer algumas palavras: um poeta local, Firmino Rocha, um grande poeta, já entoou um hino muito bonito para essas mulheres admiráveis, as lavadeiras. Nosso assunto é sobre os areeiros, homens e meninos que buscam no fundo do rio areia para as construções de Itabuna. Areeiros que tangem “jumentos no toque-toque repetitivo dos dias, pelas ruas nem sempre calçadas, levando as cargas de areia nas latas, em perfeito entendimento com o seu dono, que os tange rumo às construções nas ruas próximas e nos bairros distantes” - ainda segundo Cyro de Mattos. 

Os areeiros do rio Cachoeira são tipos que o repórter desconhecia: o caminhar dos jumentos que transportam areia pode parecer um desfile até certo ponto monótono e triste, mas seus donos são homens alegres, sempre sorrindo e satisfeitos com sua profissão. O rio Cachoeira sem eles certamente perderia muito de sua beleza. É que os areeiros fazem parte da paisagem grapiúna, e o velho Teodoro - o mais antigo de todos - ama o seu rio, o rio que lhe dá sustento e aos seus.

- Quanto ganham?

- Depende. Cada carga de areia de quatro latas custa quase nada e ganha mais quem possui maior tropa de jegues ou jumentos. Um areeiro pode ganhar até 10 contos por dia. Mas, para isto, precisa trabalhar da aurora ao crepúsculo, sem parar, e precisa ter compradores para sua mercadoria, que é a areia cor de chumbo arrancada do fundo do rio, nas épocas em que o Cachoeira está baixo, pois durante as cheias “ele não respeita nem o rico”, como diz Teodoro, O Cachoeira avança desordenadamente e invade as ruas de suas margens, principalmente quando há enchentes (e duas delas ficaram para a história grapiúna), o que levou um poeta popular de Itabuna a dizer em versos:

“Tinha gente que acordava

Naquele grande alvoroço

A água levando tudo

Fazendo o maior destroço

O pobre salvava a vida

Com água pelo pescoço”.

Assim, tempo bom para areeiro é tempo de seca: o rio é manso, as águas correm vagarosamente, é mais fácil arrancar a areia com a pá, que serve também de remo para aqueles que enchem os caíques (canoas) da carga, depositando-a depois na margem do rio, de onde ela é colocada nas latas, formando a carga que será levada pelos passos cadenciados dos jumentos, ora apressados ora lentos.

Infelizes os areeiros? Não. Por incrível que pareça são homens que estão em paz com a vida e com o mundo. De vez em quando aparece um prefeito que tenta atrapalhar o ganha-pão dos areeiros com regulamentos, portarias ou decretos. Mas aqueles homens sabem que existem leis e poderes superiores. Recentemente, o prefeito de Itabuna tentou proibir o trabalho dos areeiros cobrando um imposto muito alto. Eles recorreram à Marinha de Guerra, ali representada por um Sargento, ganharam a questão e, segundo Teodoro, “nós hoje tira areia até debaixo da casa dele, se ele se meter a coisa”.



Assim vivem os areeiros do rio Cachoeira, contribuindo no anonimato para a grandeza de Itabuna, para o seu progresso, para as construções que se erguem, para os prédios novos que os coronéis do cacau começam a levantar na cidade bonita e pujante. 





Fonte: 
Revista O Cruzeiro de 25 de março de 1967.
..................
*José Leal  foi repórter da revista  O Cruzeiro na década 60.  Venceu  o Prêmio Esso de Reportagem, patrocinado pelo “Jornal de Letras”, Rio,  com o livro As Fronteiras da Loucura. 

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ITABUNA CENTENÁRIA SORRINDO: Sabedoria de Deus

Sabedoria de Deus


Deus criou o burro e disse:
Trabalharás incansavelmente de sol a sol, carregando fardo nos lombos.
Comerás capim , não terás inteligência alguma e viverás 60 Anos. Serás burro.
O burro respondeu:
Serei burro, mas viver 60 anos é muito, Senhor.
Dá-me apenas 30 anos...
Deus lhe deu 30 anos.

Deus criou o cachorro e disse:
Vigiarás a casa do homen e serás seu melhor amigo.
Comerás os ossos que ele te jogar e viverás 20 anos.
Serás cachorro.
O cachorro respondeu:
Senhor, comerei ossos, mas viver 20 anos é muito.
Dá-me 10 anos...
Deus lhe deu 10 anos.

Deus criou o macaco e disse:
Pularás de galho em galho, fazendo macaquices, serás divertido e viverás 20 anos.
Serás macaco.
O macaco respondeu:
Senhor, farei macaquices engraçadas, mas viver 20 anos é muito.
Dá-me apenas 10 anos...
Deus lhe deu 10 anos.

Deus criou o homem e disse:
Serás o único ser racional sobre a face da terra, usarás tua inteligência para te sobrepores aos demais animais e à natureza.
Dominarás o Mundo e viverás 30 anos.
O homem respondeu:
Senhor, serei o mais inteligente dos animais, mas viver 30 anos é muito pouco.
Dá-me os 30 anos que o burro rejeitou, os 10 anos que o cachorro não quis, e também os 10 anos que o macaco dispensou...
E assim Deus fez o homem.
Está bem, viverás 30 anos como homem:
Casarás e passarás a viver 30 anos como burro, trabalhando para pagar as contas e carregando fardos. Serás aposentado pelo INSS, vivendo 10 anos como cachorro, vigiando a casa.
E depois ficarás velho e viverás mais 10 anos como macaco, pulando de casa em casa, de um filho para outro, e fazendo macaquices para divertir os netos…



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MUITO PIOR DO QUE UM INIMIGO EXPLÍCITO É UM FALSO AMIGO - POR SÍLVIA MARQUES

Muito pior do que um inimigo explícito é um falso amigo


Estar feliz é o que mais queremos. Cada um tem um conceito de felicidade. Para alguns é viver o amor plenamente. Para outros é ter filhos. Para algumas pessoas é usufruir de muito tempo livre para descansar. As definições não param por aqui...muitos precisam de um mix de condições para se sentirem realmente bem. Mas , o objetivo deste artigo, não é explicar o que é a felicidade , mas sim dizer que independente da visão de mundo de cada um e das nossas prioridades, fica muito complicado estar feliz com gente nos sabotando a todo momento.

Sim, algumas pessoas criam pequenas armadilhas para sabotar a felicidade alheia , para inviabilizar a vida das outras pessoas. Nunca temi os inimigos explícitos como temo os falsos amigos.

Sim, muito pior do que um inimigo explícito, é um falso amigo. É uma pessoa que se enfronha em nossa intimidade , que toma conhecimento de informações importantes e que as utiliza para criar pequenos infernos na vida dos outros. Quem nunca conheceu alguém assim deve se considerar muito sortudo. Quem nunca agiu como um falso amigo, deve se sentir muito feliz.

Algumas pessoas mesmo sendo gentis e bastante educadas, deixam claro, por meio de meias palavras , gestos sutis e muitas omissões que não entraram em nossa vida para torná-la mais feliz. Quantas pessoas que dizem gostar da gente , não injetam dúvidas e mal estar por meio de comentários aparentemente despretensiosos?

Em quantos almoços de família ou reuniões entre amigos , não encontramos pessoas que sutilmente desmerecem as realizações profissionais dos outros? Em quantos almoços de família ou reuniões entre amigos , não encontramos pessoas que , por meio de brincadeiras, ou por meio de conselhos, não nos desmotivam ou não lançam sombras sobre o nosso relacionamento amoroso ou sobre qualquer projeto que queiramos pôr em prática?

Não digo que todo conselho seja negativo e que toda brincadeira seja maldosa. Sim, existem bons conselhos de fato e brincadeiras para descontrair apenas, sem nenhuma segunda intenção. Mas , se a gente parar para prestar atenção, perceberemos que algumas pessoas , pouco ou nada agregam de bom em nossa vida. Perceberemos que algumas pessoas , mesmo sendo gentis , em nada nos ajudam, que nada de fato compartilham com a gente e que se mantém por perto como uma força desagregadora ou simplesmente para obter alguma vantagem. Muitas vezes , algumas pessoas desejam algo material ou energético que podemos oferecer. Mas , em muitos casos , algumas pessoas demonstram uma amizade ou carinho, para criarem situações que venham a estragar a alegria alheia.

Quantas pessoas não se aproveitam do status de amigo para destruir a relação amorosa de alguém do grupo? Quantas pessoas não se aproveitam do status de amigo para destruir a determinação de alguém mais inteligente e talentoso?
Quantas pessoas não se aproveitam do status de parente pra pedir favores absurdos , como altas quantias em dinheiro que nunca serão pagas, hospedagens por tempo indeterminado ou o caso inverso: interferem na vida pessoal do parente , determinando como ele deve viver, por "apoiá-lo" financeiramente? Quantos parceiros amorosos não minam a autoconfiança do cônjuge apenas para mantê-lo servil?

Não digo que devemos desconfiar de tudo e de todos a todo momento. Nem defendo a ideia de que estão sempre fazendo uma conspiração. Apenas alerto para o perigo das falsas amizades. Sim, elas existem. Apenas peço para prestarem mais atenção nas pessoas que estão ao redor e fazerem um balanço das relações sociais. Quando uma pessoa está sempre relacionada a momentos estressantes , a compromissos cancelados na última hora , a comentários que nos tiram o sono, a piadas que nos fazem duvidar do nosso potencial, fique atento. Quando um parente só te liga para pedir favores, quando um parente que te ajuda financeiramente vive te colocando em saias justas , quando um amigo inviabiliza o seu relacionamento amoroso, quando o seu relacionamento amoroso poda a sua individualidade, tome cuidado.

SÍLVIA MARQUES
Paulistana, escritora, idealista em crise, bacharel em Cinema, cinéfila, professora universitária com alma de aluna, doutora em Comunicação e Semiótica, autodidata na vida, filósofa de botequim, com a alma tatuada de experiências trágicas, amante das artes , da boa mesa, dos vinhos, de papos loucos e ideias inusitadas. Serei uma atleta no dia em que levantamento de xícara de café se tornar modalidade esportiva. Sim, eu acredito realmente que um filme possa mudar a sua vida! Autora do blog Garota desbocada. Lancei recentemente em versão e-book pela Cia do ebook o romance O corpo nu..


 http://obviousmag.org/cinema_pensante/2017/04/muito-pior-do-que-um-inimigo-explicito-e-um-falso-amigo.html

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domingo, 28 de maio de 2017

MACHADO E O REALISMO CÉTICO - Antonio Olinto

Machado e o realismo cético


Vive a literatura brasileira sob a inarredável presença de Machado de Assis, que nos empurra de um lado para outro, exige que o decifremos e analisemos, que o neguemos várias vezes antes de curvarmos a cabeça diante de sua força. Quem foi na realidade o Bruxo, de que maneira se apossou ele da inteligência e das emoções de um País? Conquistou um estilo que não se confunde com nenhum outro, compreendeu-nos como ninguém e até zombou de nós todos que vivemos neste vale de ciúmes.

A vasta bibliografia machadiana passou a ter, nesta passagem de um século a outro, mais uma análise de boa qualidade. É a do recém-lançado livro de Luiz Alberto Pinheiro de Freitas, "Freud e Machado de Assis: uma interseção entre psicanálise e literatura". Postou-se aí o autor em posição correta diante da esfinge Machado, ao dizer, desde o começo, que a psicanálise é "um saber conjuntural e conjectural", que leva a "dúvida" como base de um caminho. Também na "dúvida" se colocava Machado em sua análise do inconsciente, de modo parecido com o que Freud adotaria anos mais tarde. Foi na literatura (Ésquilo, Sófocles, Shakespeare, Goethe, Dostoievski) que Freud encontrou exemplos que pudessem elucidar suas teses. Talvez por ser, a literatura, ao contrário do estilo monológico das ciências exatas, o diálogo sendo também um caminho para a dúvida, enquanto o monólogo busca a certeza.

A parte central do livro de Luiz Alberto é a análise das mulheres de/em Machado de Assis, principalmente suas mulheres "pecadoras": a Virgília de "Memórias Póstumas de Brás Cubas", a Marcela do mesmo romance, a Sofia de "Quincas Borba" e Capitu de "Dom Casmurro". Em contextos diferentes, analisa também Helena, Iaiá Garcia, a Flora de "Esaú e Jacó", Fidélia e Carmo de "Memorial de Aires". O ciúme e a traição envolvem os personagens, em tragédias silenciosas ou não tanto, em textos a que não faltam o humor e a ironia. A densidade psicológica da população machadiana abre caminhos na compreensão de um relismo antes de tudo cético. Nota o autor do livro de agora:

"O texto machadiano, na atualidade, está muito valorizado na medida em que ele está fundado no pessimismo e no humor. Machado percebia, com clareza, o lado trágico das relações humanas. Este lado trágico, já presente em Shakespeare e Sófocles, para citar dois autores muito presentes na literatura freudiana, nos fala do permanente mal-entendido dos encontros humanos, de um ser humano permanentemente acossado por outro, pelas forças da natureza, bem como pelo pior de todos os detratores - seu mundo interno."

A primeira "pecadora", Virgília, apresenta uma certa naturalidade gozosa no adultério. O "realismo cético" surge, em "Brás Cubas", com uma força literária que vinha revelar um novo Machado, em nada parecido com o de "Ressurreição", "Iaiá Garcia" e "Helena". Falando em "filosofia cética e proustiana", cita Luiz Alberto trecho de "Brás Cubas", em que Brás diz:

"Creiam-me, o menos mau é recordar; ninguém se fie da fidelidade presente; há nela uma gota de baba de Caim. Corrido o tempo e cessado o espasmo, então sim, então talvez se pode gozar deveras, porque entre uma e outra dessas duas ilusões, melhor é a que se gosta sem doer".

Nada mais "realismo cético" do que isto. Mas logo depois, em "Quincas Borba", mais atravessado de tragédia do que seus outros romances, paixão, ciúme, e loucura se misturam. O ciúme está acima de tudo, principalmente no homem, no macho, oprimido pela mulher que atrai outras atenções.

A Sofia de "Quincas" não trai, mas joga o jogo da sedução em que envolve tanto o marido, Palha, como o apaixonado Rubião, na ingenuidade que o tornou insano. Luiz Alberto chama-a de "metade gente, metade cobra". Seus diálogos, com o marido de um lado, com Rubião do outro, são obras primas de atração por parte da mulher, com idas e vindas entre o oferecimento e a quase entrega, ligados a um recuo em que a sedução se esmera em abrir uma certeza para o futuro. Ela brinca também com o marido, chamando-lhe a atenção para o assédio tranquilo do apaixonado.

Capitu é, sem dúvida, o ápice da criação literária brasileira, com seus olhos de ressaca, sua objetividade no armar situações e seu fim mais ou menos solitário. Se Virgília traiu e Sofia deu a entender que sim, mas não, de Capitu há certezas num e noutro lado. Os livros de Fernando Sabino e Domicio Proença Filho dizem e não dizem, o brasilianista William Grossman, professor na Universidade de Nova York, organizador de um julgamento em que seus alunos dariam o veredicto de traição ou não, depois das falas de um promotor e uma advogada de defesa (o resultado absolveu Capitu) estão entre os muitos que se curvaram sobre o mistério de Capitu.

Dir-se-ia que Machado, que foi feliz no casamento (a Carmen de "Memorial de Aires" seria um retrato de Carolina) aceitava a frase que Victor Hugo colheu no Chateau de Chambord, "Souvent femme varie/Bien fol est qui s'y fie!" (Muitas vezes a mulher varia/Bem tolo é quem nela se fia!). Hugo usou os versos em seu texto "Le roi s'amuse" e a adaptação da ópera de Verdi, inspirada em Hugo, "Rigoletto" popularizou a "La donna è mobile"...

"Freud e Machado de Assis: uma intercessão entre psicanálise e literatura", de Luiz Alberto Pinheiro de Freitas, merece atenção. Lançamento da Editora Mauad, projeto gráfico do Núcleo de Arte Mauad.

Tribuna da Imprensa em 09/01/2002


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Antonio Olinto - Quinto ocupante da Cadeira nº 8 da ABL, eleito em 31 de julho de 1997, na sucessão de Antonio Callado e recebido em 12 de setembro de 1997 pelo acadêmico Geraldo França de Lima. Recebeu o acadêmico Roberto Campos. Faleceu dia 12 de setembro de 2009.

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MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA O 51ª DIA MUNDIAL DAS COMUNICAÇÕES SOCIAIS

Mensagem do Papa Francisco 
para o 51º Dia Mundial das Comunicações Sociais



Tema: «“Não tenhas medo, que Eu estou contigo” (Is 43, 5).
Comunicar esperança e confiança, no nosso tempo»
[28 de maio de 2017]


Graças ao progresso tecnológico, o acesso aos meios de comunicação possibilita a muitas pessoas ter conhecimento quase instantâneo das notícias e divulgá-las de forma capilar. Estas notícias podem ser boas ou más, verdadeiras ou falsas. Já os nossos antigos pais na fé comparavam a mente humana à mó da azenha que, movida pela água, não se pode parar. Mas o moleiro encarregado da azenha tem possibilidades de decidir se quer moer, nela, trigo ou joio. A mente do homem está sempre em ação e não pode parar de «moer» o que recebe, mas cabe a nós decidir o material que lhe fornecemos (cf. Cassiano o Romano, Carta a Leôncio Igumeno).

Gostaria que esta mensagem pudesse chegar como um encorajamento a todos aqueles que diariamente, seja no âmbito profissional seja nas relações pessoais, «moem» tantas informações para oferecer um pão fragrante e bom a quantos se alimentam dos frutos da sua comunicação. A todos quero exortar a uma comunicação construtiva, que, rejeitando os preconceitos contra o outro, promova uma cultura do encontro por meio da qual se possa aprender a olhar, com convicta confiança, a realidade.

Creio que há necessidade de romper o círculo vicioso da angústia e deter a espiral do medo, resultante do hábito de se fixar a atenção nas «notícias más» (guerras, terrorismo, escândalos e todo o tipo de falimento nas vicissitudes humanas). Não se trata, naturalmente, de promover desinformação onde seja ignorado o drama do sofrimento, nem de cair num otimismo ingénuo que não se deixe tocar pelo escândalo do mal. Antes, pelo contrário, queria que todos procurássemos ultrapassar aquele sentimento de mau-humor e resignação que muitas vezes se apodera de nós, lançando-nos na apatia, gerando medos ou a impressão de não ser possível pôr limites ao mal. Aliás, num sistema comunicador onde vigora a lógica de que uma notícia boa não desperta a atenção, e por conseguinte não é uma notícia, e onde o drama do sofrimento e o mistério do mal facilmente são elevados a espetáculo, podemos ser tentados a anestesiar a consciência ou cair no desespero.

Gostaria, pois, de dar a minha contribuição para a busca dum estilo comunicador aberto e criativo, que não se prontifique a conceder papel de protagonista ao mal, mas procure evidenciar as possíveis soluções, inspirando uma abordagem propositiva e responsável nas pessoas a quem se comunica a notícia. A todos queria convidar a oferecer aos homens e mulheres do nosso tempo relatos permeados pela lógica da «boa notícia».

A boa notícia

A vida do homem não se reduz a uma crónica asséptica de eventos, mas é história, e uma história à espera de ser contada através da escolha duma chave interpretativa capaz de selecionar e reunir os dados mais importantes. Em si mesma, a realidade não tem um significado unívoco. Tudo depende do olhar com que a enxergamos, dos «óculos» que decidimos pôr para a ver: mudando as lentes, também a realidade aparece diversa. Então, qual poderia ser o ponto de partida bom para ler a realidade com os «óculos» certos?

Para nós, cristãos, os óculos adequados para decifrar a realidade só podem ser os da boa notícia: partir da Boa Notícia por excelência, ou seja, o «Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus» (Mc 1, 1). É com estas palavras que o evangelista Marcos começa a sua narração: com o anúncio da «boa notícia», que tem a ver com Jesus; mas, mais do que uma informação sobre Jesus, a boa notícia é o próprio Jesus. Com efeito, ao ler as páginas do Evangelho, descobre-se que o título da obra corresponde ao seu conteúdo e, principalmente, que este conteúdo é a própria pessoa de Jesus.

Esta boa notícia, que é o próprio Jesus, não se diz boa porque nela não se encontra sofrimento, mas porque o próprio sofrimento é vivido num quadro mais amplo, como parte integrante do seu amor ao Pai e à humanidade. Em Cristo, Deus fez-Se solidário com toda a situação humana, revelando-nos que não estamos sozinhos, porque temos um Pai que nunca pode esquecer os seus filhos. «Não tenhas medo, que Eu estou contigo» (Is 43, 5): é a palavra consoladora de um Deus desde sempre envolvido na história do seu povo. No seu Filho amado, esta promessa de Deus – «Eu estou contigo» – assume toda a nossa fraqueza, chegando ao ponto de sofrer a nossa morte. N’Ele, as próprias trevas e a morte tornam-se lugar de comunhão com a Luz e a Vida. Nasce, assim, uma esperança acessível a todos, precisamente no lugar onde a vida conhece a amargura do falimento. Trata-se duma esperança que não dececiona, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações (cf. Rm 5, 5) e faz germinar a vida nova, como a planta cresce da semente caída na terra. Visto sob esta luz, qualquer novo drama que aconteça na história do mundo torna-se cenário possível também duma boa notícia, uma vez que o amor consegue sempre encontrar o caminho da proximidade e suscitar corações capazes de se comover, rostos capazes de não se abater, mãos prontas a construir.

A confiança na semente do Reino

Para introduzir os seus discípulos e as multidões nesta mentalidade evangélica e entregar-lhes os «óculos» adequados para se aproximar da lógica do amor que morre e ressuscita, Jesus recorria às parábolas, nas quais muitas vezes se compara o Reino de Deus com a semente, cuja força vital irrompe precisamente quando morre na terra (cf. Mc 4, 1-34). O recurso a imagens e metáforas para comunicar a força humilde do Reino não é um modo de reduzir a sua importância e urgência, mas a forma misericordiosa que deixa, ao ouvinte, o «espaço» de liberdade para a acolher e aplicar também a si mesmo. Além disso, é o caminho privilegiado para expressar a dignidade imensa do mistério pascal, deixando que sejam as imagens – mais do que os conceitos – a comunicar a beleza paradoxal da vida nova em Cristo, onde as hostilidades e a cruz não anulam, mas realizam a salvação de Deus, onde a fraqueza é mais forte do que qualquer poder humano, onde o falimento pode ser o prelúdio da maior realização de tudo no amor. Na verdade, é precisamente assim que amadurece e se entranha a esperança do Reino de Deus, ou seja, «como um homem que lançou a semente à terra. Quer esteja a dormir, quer se levante, de noite e de dia, a semente germina e cresce» (Mc 4, 26-27).

O Reino de Deus já está no meio de nós, como uma semente escondida a um olhar superficial e cujo crescimento acontece no silêncio. Mas quem tem olhos, tornados limpos pelo Espírito Santo, consegue vê-lo germinar e não se deixa roubar a alegria do Reino por causa do joio sempre presente.

Os horizontes do Espírito

A esperança fundada na boa notícia que é Jesus faz-nos erguer os olhos e impele-nos a contemplá-Lo no quadro litúrgico da Festa da Ascensão. Aparentemente o Senhor afasta-Se de nós, quando na realidade são os horizontes da esperança que se alargam. Pois em Cristo, que eleva a nossa humanidade até ao Céu, cada homem e cada mulher consegue ter «plena liberdade para a entrada no santuário por meio do sangue de Jesus. Ele abriu para nós um caminho novo e vivo através do véu, isto é, da sua humanidade» (Heb 10, 19-20). Através «da força do Espírito Santo»,podemos ser «testemunhas»e comunicadores duma humanidade nova, redimida, «até aos confins da terra»(cf. At 1, 7-8).

A confiança na semente do Reino de Deus e na lógica da Páscoa não pode deixar de moldar também o nosso modo de comunicar. Tal confiança que nos torna capazes de atuar – nas mais variadas formas em que acontece hoje a comunicação – com a persuasão de que é possível enxergar e iluminar a boa notícia presente na realidade de cada história e no rosto de cada pessoa.

Quem, com fé, se deixa guiar pelo Espírito Santo, torna-se capaz de discernir em cada evento o que acontece entre Deus e a humanidade, reconhecendo como Ele mesmo, no cenário dramático deste mundo, esteja compondo a trama duma história de salvação. O fio, com que se tece esta história sagrada, é a esperança, e o seu tecedor só pode ser o Espírito Consolador. A esperança é a mais humilde das virtudes, porque permanece escondida nas pregas da vida, mas é semelhante ao fermento que faz levedar toda a massa. Alimentamo-la lendo sem cessar a Boa Notícia, aquele Evangelho que foi «reimpresso» em tantas edições nas vidas dos Santos, homens e mulheres que se tornaram ícones do amor de Deus. Também hoje é o Espírito que semeia em nós o desejo do Reino, através de muitos «canais» vivos, através das pessoas que se deixam conduzir pela Boa Notícia no meio do drama da história, tornando-se como que faróis na escuridão deste mundo, que iluminam a rota e abrem novas sendas de confiança e esperança.


Vaticano, 24 de janeiro – Memória de São Francisco de Sales – do ano de 2017.

Franciscus



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