Aproximando-se a celebração do 101º aniversário da primeira
aparição de Nossa Senhora aos três pastorinhos de Fátima, no dia 13 de maio de
1917, seguem algumas frases para refletirmos neste dia a respeito do tema do
castigo providencial por Ela anunciado.
“Se os homens não se emendarem, Nossa Senhora enviará ao
mundo um castigo como não se viu igual”
(Santa Jacinta de Fátima)
“O que podemos fazer para evitar o castigo anunciado em
Fátima, na tênue medida em que ele é evitável? O que podemos fazer para obter a
conversão dos homens, na fraca medida em que ela ainda possa ser obtida antes
do castigo, dentro da economia comum da graça? O que podemos fazer para
apressar a aurora bendita do Reino de Maria, e para nos ajudar a caminhar no
meio das hecatombes que tão gravemente nos ameaçam? Nossa Senhora o indica:
afervoramento na devoção a Ela, oração e penitência”
(Plinio Corrêa de Oliveira)
“O Senhor castiga misericordiosamente os filhos que erram.
Perseverai, pois, na sua disciplina. Se Deus vos poupa o castigo e a correção,
temei que vos reserve para o suplício”
(Bossuet)
“Não haverá iniquidade que não tenha o seu castigo
apropriado”
(Tomás de Kempis)
“O tempo que precede o castigo esperado é a pior parte desse
castigo”
(No Dia das Mães, para D. Aristoteline dos Anjos Dias)
Alma vibrando em hinos de ternura,
De maternal carinho envolto em brilhos,
A mágoa ou o prazer a transfigura,
Vivendo da existência dos seus filhos.
Removendo distâncias, empecilhos,
Indiferente à morte ou à tortura,
Tem na boca os mais ternos estribilhos,
Da canção para o filho ter ventura.
Divino coração onde se abriga,
A essência do amor e da bondade,
A devoção que ao bem a vida instiga.
Guia sublime, redentora e nobre,
Que é feliz, quando a felicidade,
Dos céus descendo todo o filho encobre.
(IMAGENS MUTILADAS - 1963)
Luiz Gonzaga Dias
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EM LUGAR DE PREFÁCIO
Como um
derivativo à luta diária, neste século agitado, nesta época de progresso
vertiginoso , aqui estão alguns versos reunidos neste volume, poesias na sua
maior parte, dispersas nas publicações brasileiras.
Sentencia o
Evangelho, que nem só de pão vive o homem, sendo portanto estes versos, assim
como um oásis, no deserto febril da civilização, da política, da atividade multifária
dos seres, na era do avião a jato, dos inventos nucleares e do perene choque de
interesse dos homens.
Um momento
de arte e descanso, não faz mal ao corpo ou ao espírito exausto.
Se o
leitor não acha que ler poesia é perder tempo, leia um pouco estes versos.
Ao contrário,
desculpe e passe adiante.
De qualquer
modo, queira aceitar os agradecimentos do autor.
Há anos conheci um estudante, que de tal forma passava vida
ímpia e dissoluta, que um dia foi preso e levado para a cadeia de
Ehrenbreistein.
Seu pai, há tempos, morrera em Nancy, de sorte que somente a
mãe suportava todo o desgosto que lhe causava um filho de caráter tão perverso.
Não se pode exprimir a angústiade seu
materno coração, e quão dolorosas lágrimas derramava.
Mas isto não enternecia o filho criminoso. Nenhum vislumbre
de conversão e arrependimento aparecia naquela alma endurecida.
Nada admira que a impressão persistente de tão grande e
profunda aflição prostrasse no leito da morte a consternada mãe. Na última extremidade
dirigiu-se ao diretor da prisão,
pedindo-lhe para ver seu filho no transe
da morte, e o diretor não pode resistir à súplica.
No dia seguinte, o obstinado preso, levado pelos guardas,
chegou ao pé do leitode sua mãe
agonizante.
Ela, macilenta e desfigurada, prestes a exalar o último
suspiro, não proferiu palavra, nem fez gesto algum, mas fixou por longo tempo
no filho um olhar firme e penetrante; depois, virou-se para o outro lado do
leito, e fez sinal para que o levassem. Assim como veio, voltou taciturno e
frio, como se já não tivesse a faculdade de se enternecer.
Voltando à prisão, que mudança sobreveio nele! O olhar de
sua mãe moribunda, aquele olhar silencioso, em que se resumia a repreensão,
exaltação, indignação, temor e afeto, comoveu o filho desvairado mais
eficazmente do que poderia fazer a mais eloquente e vibrante linguagem materna,
que ela pudesse lhe ter dirigido dias e meses. Que tempestade de encontrados
sentimentos então brotou na alma agitada do infeliz mancebo!
Com íntima comoção, que jamais sentira, começou a gemer e
suspirar com tal veemência, que lhe parecia que o coração se lhe despedaçava. Pela
primeira vez investigando sua consciência, exclamou estremecendo: “Ó Deus, a
que grau de maldade cheguei!...” Propôs reparar o mal feito e converter-se
verdadeiramente.
Deus misericordioso o manteve nesta resolução. Recuperando a
liberdade, entrou para um convento, fez-se jesuíta missionário e agora o vedes
diante dos olhos, o mancebo libertino e ímpio de então, o vedes neste púlpito. Sim,
o vosso pregador é o próprio filho desapiedado.
Semelhante maravilha e mudança foi obra de Deus, por meio do
olhar de sua mãe moribunda.
P. Hasslacher
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Peter Hasslacher (14 de agosto de 1810 - 5 de julho de 1876)
foi um pregador católico romano alemão. Ele foi um dos muitos missionários
jesuítas que lutaram em toda a Alemanha, de Friburgo a Berlim e Danzig, para
despertar e fortalecer as forças católicas do país após o tempestuoso ano de
1846.
Era assim
que Renatinha, chorando, expressava toda a saudade que tinha de sua mamãe.
Marília e
Marialva, mãe e avó de Renata, estão numa excursão pela Europa. Antes de
viajar, estavam preocupadas com aRenatinha.
Mas se tranquilizaram quando viram que a menina demonstrava muita alegria. Ia ficar
na casa da tia Ju, tendo como companheiros os primos Lucas e Mônica. Tia Dedé e
o Tio Kaká prometeram leva-la à praia nos fins de semana. E o que mais empolgava
a Renatinha: ia pela primeira vez tomar o ônibus do colégio. A cada instante
anunciava: “Vou no ônibus do meu colégio”.
Mas a
Renatinha ainda não tinha experimentado tão fortemente a dor da saudade. Fazia pena
vê-la chorando. Escorriam dos seus olhos azuis grossas lágrimas. E sem muita
cerimônia gritava: “Eu estou com saudades! Quero minha mãezinha linda! Minha vozinha,
estou com saudades de você!” Eu, muito aflita,sem saber o que fazer, disse-lhe: “Telefone para o seu pai”. Paulinho, o
pai de Renata, não acompanhou Marília. Estava, portanto, à disposição da
filhinha. “Meu papai, vou ligar para ele”. Depois de conversar com o seu papai
, melhorou. Ele prometeu um passeio de carro e um gostoso lanche.
O problema de Renata, pelo menos
durante algum tempo, estava resolvido. E, no final do mês, estavam chegando as
suas queridas trazendo-lhe muitos presentes, acabando aquele pesadelo da
Renatinha.
Vendo a
dor de Renata, lembrei-me do sofrimento de uma criança da idade dela. Aquela menina
chorava não de saudade, mas de ansiedade, de tristeza. Estava na iminência de
perder o convívio de seus pais.
Ainda me
lembro, era bem menina. Estava à porta da casa de minha avó, em Itabuna. De repente,
fomos surpreendidos por um grupo muito grande de pessoas, todos maltrapilhos. Cada
qual carregava sua mochila ou trouxa. Paramos a brincadeira. Aquela gente era
nordestina, uma família fugindo da seca. Lembro-me que naquela época eram
chamados de flagelados. “Lá vêm os flagelados”. E todos chegavam à porta para
vê-los passar. Pediam esmola. Muita gente dava. Naquele grupo havia um casal e
muitos filhos. Pararam para descansar e comer. Não sei o que comiam. Estavam tristes.
Fui lá dentro e pedi um prato de comida para completar aquela refeição. Eles aceitaram
e pediram água. Fui buscar. Quando voltei assisti a um diálogo muito triste:
- Me dê
uma menina destas. Esta aqui está num tamanho bom.
- Esta
não; ela me ajuda com os menores.
- Então
esta.
- Não,
mamãe. Não quero.
- Menina, não
seja boba, você vai ter o que vestir e o que comer.
- Não,
mamãe, não me deixe!
Ainda me
recordo do horror daquela criança.
- Menina,
você prefere morrer de fome?
- Nós “passa”
fome “junta”. Deus vai “ajudá”.
- Gente
ordinária! Encontra quem ajuda e não aceita.
Grande ajuda!
Roubando-lhe a filha e, o que é pior, para servir como empregada.
Este fato
aconteceu muitos anos atrás. Não sei o
ano. Não dei importância. O importante é perguntarmos: “As coisas melhoraram?”
Aquela menininha também achava sua mamãezinhalinda apesar de tão maltratada. Todo filho acha sua mãe linda. E toda
mãe acha que o seu filho é pequeno e precisa de sua ajuda.
Quando Jesus
viu sua mãe e, perto dela, o discípulo amado, disse: “Mulher, eis o teu filho! Depois
disse ao discípulo: Eis a tua mãe! E a partir dessa hora, o discípulo a recebeu
em sua casa.” (Jo 19, 26-27).
É maravilhoso
ter MARIA por Mãe e saber que ela está atenta a todas as nossas necessidades.
Solenidade da Ascensão do Senhor – Domingo – 13/05/2018
Anúncio do Evangelho (Mc 16,15-20)
— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
Marcos.
— Glória a vós, Senhor.
Naquele tempo, Jesus se manifestou aos onze
discípulos, e disse-lhes: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a
toda criatura! Quem crer e for batizado será salvo. Quem não crer será
condenado. Os sinais que acompanharão aqueles que crerem serão estes:
expulsarão demônios em meu nome, falarão novas línguas; se pegarem em
serpentes ou beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal algum; quando
impuserem as mãos sobre os doentes, eles ficarão curados”.
Depois de falar com os discípulos, o Senhor Jesus foi levado
ao céu, e sentou-se à direita de Deus.
Os discípulos então saíram e pregaram por toda parte. O
Senhor os ajudava e confirmava sua palavra por meio dos sinais que a
acompanhavam.
Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Padre Roger
Araújo:
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Ascensão: ampliar nossos
atrofiados horizontes
“Os discípulos saíram e pregaram por toda parte” (Mc
16,20)
Na dinâmica do Tempo Litúrgico, após uma longa e criativa
caminhada com Jesus, a liturgia nos faz “desaparecer em Deus”, como o Cristo da
Ascensão “desapareceu em Deus”. Depois da Ressurreição, Jesus “ascendeu”. E fez
isso abertamente. Os discípulos, atordoados, permaneceram olhando para o alto
enquanto Jesus partia. Ele deixou claro que começava uma nova maneira de se
fazer presente junto aos seus seguidores. De fato, Ele insistiu que os estaria
acompanhando todos os dias até o fim do mundo. Portanto, nada de ruptura, mas
de uma mudança qualitativa em sua presença, e assim impulsionar um novo vínculo
com Ele.
Mas, em que sentido Jesus “foi levado ao céu”? Jesus não se
“elevou ao céu” no sentido estrito, senão que “desceu” ao mais profundo de
nossa existência, para dentro da nossa história, pois Ele continua “nos
ajudando e confirmando sua palavra por meio dos sinais”. Esta nova presença é
algo tão misterioso que não é possível defini-la, pois ela não está mais
restrita aos limites do espaço e do tempo. Transcende o que se pode ver e
tocar. A realidade pascal é muito mais ampla que aquilo que nossos sentidos
podem abarcar.
Naqueles Onze apóstolos primeiros, “catequizados” pelas
mulheres que fizeram a primeira experiência de encontro com o Ressuscitado,
junto ao sepulcro, nos encontramos refletidos todos os cristãos. A terra
inteira é campo de Páscoa de Jesus, espaço onde se expressa seu mistério de
Vida plena. Este é o Cristo pascal da montanha da Galileia, que continua se
fazendo presente no transcurso dos tempos, no mesmo caminho da história, no
processo de missão que dura até o final do mundo.
Jesus não “subiu” para fugir dos problemas deste mundo,
senão que, destruindo a morte, fortaleceu o vínculo que nos une, para continuar
atuando em nosso favor de um modo diferente. Por isso, quis deixar claro que a
ressurreição não supõe “ir mais além”, para viver comodamente e desfrutar de um
merecido descanso depois de tanto sofrimento. Com sua presença nova mostrou que
ressuscitar significa viver mais, amar mais, compartilhar em plenitude. Uma
injeção de ânimo para vacilantes e temerosos.
Dessa forma, o ensinamento pascal se traduz como experiência
de gratuidade e doação de vida. Ali onde as pessoas se ajudam a viver
gratuitamente uns aos outros, em solidariedade e entrega radical, podem
confessar que Jesus ressuscitou e continua presente, animando e inspirando a
todos. Assim, quando perguntem onde estão os sinais de que o Cristo triunfou da
morte, devemos responder: vejam como creem e atuam os cristãos! Suas obras de
amor são reflexo da vida de Jesus, são expressão intensa de sua Páscoa.
Pode-se reconhecer o Senhor ressuscita nos sinais quase
imperceptíveis que revelam que de verdade Ele não nos abandonou: pessoas que
atualizam seus mesmos gestos, que pronunciam com autenticidade suas palavras,
que são como um prolongamento de seu ser. Talvez por isso animou seus
discípulos a guardar e propagar tudo o que lhes havia ensinado, para que outros
reconhecessem Sua presença neles e acreditassem que o amor e a vida não tem
“data de vencimento”.
Portanto, para nós seguidores(as) de Jesus, a Ascensão é
abertura para o cotidiano, para a realidade do serviço. É preciso partir e
viver o chamado do Mestre ao longo da existência. A festa da Ascensão nos
revela que vivemos o “tempo do Espírito”, tempo de criatividade, de ousadia, de
novidade... O Espírito não proporciona aos seguidores de Jesus “receitas
eternas”. Por isso, não podemos ficar olhando para cima. O Espírito nos dá luz
e inspiração para contemplar a realidade, buscando caminhos sempre novos para
prolongar hoje a mesma missão de Jesus.
Torna-se necessário descruzar os braços, deixar de olhar
passivamente para o céu e, com os pés plantados no chão, ser “presença
cristificada” que fermenta e transforma a realidade. O mistério da Ascensão nos
sensibiliza e nos capacita para ir ao encontro do nosso mundo com uma visão
mais contemplativa. O “subir” até Deus passa pelo “descer” até às profundezas
da humanidade. Como contemplativos, movidos por um olhar novo, entramos em
comunhão com a realidade tal como ela é.
Ascensão nos convida a olhar o mundo como “sacramento de
Deus”. Um olhar capaz de descobrir os sinais de esperança que existem nele; um
olhar afetivo, marcado pela ternura, pela compaixão e por isso gerador de
misericórdia; um olhar que compromete solidariamente.
A Ascensão de Jesus significa tomar consciência de que Seu
tempo se completou e começa o tempo da nova comunidade dos seus(suas)
seguidores(as). Trata-se de um “mistério” que revela uma nova pedagogia de
Jesus, qual seja, saber “retirar-se a tempo”. E retirar-se a tempo para que os
discípulos cresçam, para que os discípulos amadureçam. Porque, enquanto Jesus
estava entre eles e com eles, os discípulos viviam como os pintinhos debaixo
das asas da galinha.
Saber retirar-se a tempo implica uma grande sabedoria. Os
pais, nem sempre sabem retirar-se a tempo; creem que precisam envelhecer sem
passar as responsabilidades aos filhos. Os mestres creem que seus alunos ainda
não sabem o que eles sabem. Os sacerdotes não sabem abrir passagem para os
leigos; consideram que ainda não estão preparados. Jesus soube retirar-se a
tempo; era consciente de que os seus discípulos não estavam plenamente maduros
e preparados para a missão. O Evangelho reconhece que “alguns vacilavam”. E no
entanto, Jesus confiou a eles sua própria missão: “ide pelo mundo inteiro e
anunciai o Evangelho a toda criatura”. Não pediu que primeiro se doutorassem,
nem que fizessem uma pós-graduação. Enviou-os assim como estavam, com suas
dúvidas no coração.
Também eles aprenderão fazendo; também eles aprenderão
equivocando-se.
Portanto, a Ascensão de Jesus marca o início de nossa
missão, ou seja, um novo modo de presença no mundo. Viver com os olhos voltados
para o Senhor glorioso não nos dispensa de estar com os dois pés no chão,
plantados na terra da história.
Enfim, a celebração do mistério da Ascensão nos impulsiona,
ao mesmo tempo, para Deus e para o mundo. Paixão por Deus e paixão pelo mundo.
Podemos assim estar sempre enraizados firmemente em Deus e, ao mesmo tempo,
imersos no coração do mundo. O cristão é tão familiar com Deus que admira e se
encanta com a variedade e a multiplicidade do mundo, e não teme o mundo com
toda sua complexidade. Ao mesmo tempo, é tão familiar com o mundo que sente o
Espírito de Deus que trabalha em todos os lugares e da maneira mais inesperada.
“Fora do mundo não há salvação” (E. Eschillebeeckx).
Muitas vezes preferimos seguir um Jesus no “céu”.
Descobri-lo dentro de si mesmo, nos outros e no mundo é demasiado exigente e
comprometedor. Muito mais cômodo é continuar olhando para o céu... e não
sentir-nos implicados naquilo que está acontecendo ao nosso redor. A Ascensão
de Jesus nos desafia a romper a estreiteza de nossa vida para expandi-la a
horizontes mais inspiradores.
Textos bíblicos: Mc. 16,15-20
Na oração: Que nossa ascensão seja: romper as cadeias
de injustiça e morte; derrubar toda parede e muro; ir pela vida como
samaritanos; mostrar os caminhos de vida plena; oferecer razões de esperança;
despertar o instinto criativo; interpretar os sinais dos tempos; pôr o coração
nas estrelas...
Nada
era pior do que saberque a mãe nãovoltaria mais a andar. Ficava prostrada na
cama, a doença arrancando-lhe o sorriso do rosto na pele sem cor. O momento de
alívio era quando conseguia reconciliar o sono. Na rotina do medicamento,
aagulha furava a veia do pulso, por
onde o soro era levado para reforçar o sangue enfraquecido no sistema de defesa
do corpo.Oirmão trazia para junto da cama o suporte de
açocom quatro pés comrodízios,o soro no tubo pendurado no gancho, descendolentamente pela mangueira, gota a gota.
Seguia lentamentepara penetrar no corpo
da mãe. O tempo enfadonho se repetia no corpo abatido, lambia os minutos
demorados no quarto.
A moça que
cuidava da mãe mudava seu corpo com cuidado, de um lado parao outro.Limpava as feridas com algodão embebido na água oxigenada. Tentava
atenuar as dores nas costas por ter o corpo permanecido tanto tempo na mesma
posição. A mãe acordava gemendo, as costas queimando, os olhos umedecidos.
Tentava
consolá-la, não perdesse a fé em Deus, todos nós estávamosesperançosos de que um dia ela voltasse
aandar com as suas pernas
incansáveis,os passos seguros, dando
vida ao corpo.
Os dias voltariam ao
ritmonormal, sua voz esbanjando afeto
pelo apartamento, de suas mãos,até
certo ponto divinas,chegariam até à
mesaas comidas deliciosas,doces e bolos com confeito,comoela gostava de fazer para os dois filhos.
Como não
lembrar os ensinamentos que na infância a mãe tanto lhe dera?
“Menino, já
para dentroQue vem o vento
ventosoLevado, levando cisco! Menino,
já paradentro! Boa romaria faz quem em
sua casa está em paz. E essasadivinhas:
O que é,o que é, o ano todo no deserto
o mais quente é?Responda certo, menino
esperto. Como esquecer essa de pura carícia: Da noite o beijo. A melhor sombra
de dia. Quem é?
Em tudo os
dias tinhamsuas mãos zelosas.Colocava nos vasos aquelasrosas, como sonho na manhãesbanjavampelos aresternura. Davam vida à
máquina de costura suaspernas ativas.
Os bordados, beleza tecida por dedos cativantes,sempre admirados por quem visse.
Nada era pior
do que saberque a mãe nãovoltaria mais a andar.O tempo usurpava sem dó a beleza da vida,
embora não houvesse revolta enquanto durava a agonia. O amor por ela dobrava
porque como filho elesabia disso.
Cyro de Mattos é escritor e poeta. Membro efetivo das
Academias de Letras da Bahia, de Itabuna e de Ilhéus. Doutor HonorisCausa pela UniversidadeEstadual de Santa Cruz.