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quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

POESIA DE NATAL - Cyro de Mattos

                      

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                Historinha do Menino Jesus

 

O galo cantou,

A vaca mugiu,

O burro zurrou,

A ovelha baliu.

 

A rosa acordou,

O peixe sorriu,

A cabra contou

Que a cobra sumiu.

 

Foi tanto balão

Que subiu ao céu,

Foi tanta canção

 

Que ventou ao léu,

Que até hoje luz

Do menino a cruz.

.......... 


 

Fala dos Bichos

 

 

O GALO:                    Jesus nasceu!

                                    Jesus nasceu!

                                                 Jesus nasceu!

 

O BURRO:                 Claro dia!

                                                Claro dia!

                                                Claro dia!

 

A VACA:                  Em Belém!

                                              Em Belém!

                                              Em Belém!

 

O CAMELO:           Água de oásis!

                                             Tâmara na areia!

                                              Brisa no caminho!

 

A OVELHA:           Verde que te quero bem!

                                             Verde que te quero bem!           

                                             Verde que te quero bem!

 

.................... 

 


                       O Pequeno Rei

 

São suas

As proezas

De acender

Uma estrela

Numa só mesa

De todas

As mãos.

...................... 



Adivinha

 

Me tira

Da solidão,

Me guia

Na vastidão.

No ar, no mar

E no chão

Sua estrela

Me clareia.

Se mora

No coração,

Me dá a mão

Na escuridão.

 

       (O Menino Deus)

 

......................... 

 



Oratório de Natal

 

De Belém

Vem a estrela,

A mais bela.

Tudo é glória,

Tudo é paz,

Tudo é amor.

Tudo é canto,

Nenhum pranto,

Tudo é flor.

Tudo é graça

Na manhã

Que me abraça.

 

 ...................





Os Pastores

 

Na colina

Ovelhas pastam,

Verdes hastes

Cantam hinos.

 

Há um arco no céu

De sete cores.

A flauta toca

Uma canção doce.

 

Quanto mais escuta

O ouvido se encanta.

De louvar o menino

A gente nunca cansa.

 

 .......................



Eu Creio Nessa Manhã

 

Por que os homens

Amam a droga

E não da abelha

Os favos de mel?

 

Por que os homens

Amam as balas

E não a paz

Sem nenhum fuzil?

 

                        Por que os homens

Só vêem o chão

E não a estrela

Em seus caminhos?

 

Viver amargos,

Viver sozinhos,

E do que mais

Os homens gostam.

 

Mas eu creio nessa manhã

Anunciada em Belém

Por um menino rei

Em seu berço de palha.

 

Eu gosto de ouvir

Sua canção na estrada

Falando duma união geral,

Que viver vale a pena

Quando a vida é uma dança

Com os homens como irmãos,

Cantando como passarinho,

Sorrindo como criança.

 

 .............................

 

O Menino e o Pássaro

 

 

                  O menino é pobre

E tem um pássaro

Que solta do bico

Uma canção que roda

Ao redor do mundo.

 

Faça neve ou sol,

O pássaro do menino

Segue pelos ares,

Voa pelos mares,

Pousa onde eu estou.

                       

 

 E um céu de ouro

Deixa sair do bico.

 

....................

 

 

Os Reis Magos

 

Por montanhas e vales,

Com ouro, incenso e mirra,

Chegam à manjedoura

Pelas mãos da estrela.

Três reis ajoelhados

E os bichos deitados,

Três reis que velam

O sono manso

Do menino na palha.

É a vigília mais bela

Da nova madrugada

Que desperta na relva.

Ó glória, ó paz, ó amor,

Os bichos todos cantam.

E os três reis sabem

Que não são dignos

De tocar naquela palha.

Sabem que o menino

Traz as sementes do Pai

Para plantar cirandas

Nas areias do deserto.

 

 ................

  


                     Natal das Crianças Negras

 

 

Viram o velho gordo

Com a barba branca

Na televisão da loja.

 

Moravam no morro,

O irmão queria um avião,

Uma boneca a irmã queria.

 

Deixaram os chinelos

Na janela ao sereno.

Nada viram no outro dia.

 

Do ponto mais alto

Olhavam as nuvens alvas,

Mansas no azul do céu.

 

A cidade aos seus pés,

No jardim cada menino

O seu brinquedo exibia.

 

Aí então souberam

Como o mundo se escondia

                       De Jesus, Maria e José.

 

O Natal era a lágrima

Que descia do rosto

E uma canção desfaz


......................




                      Natal Permanente

 

                                                   

                   O burrim e seu viageiro,

O boi e seu mugido,

A vaca e suas tetas,

A ovelha e seu balido,

O galo e seu clarim

Estão dentro de mim.

 

Para que a vida

Seja sempre verde

Como na campina

Para que a vida

Seja sempre mansa

Como na colina.

 

Para que a vida

Como a do menino

No presépio posto

Seja sempre amiga

E em meu peito cresça.

 

...............................

  

O Campeador e o Natal

 

Estrela no chapéu

E de verde gibão,

No meu burrico

Incansável

Venço a solidão

  .....................


 

O Sino de Todo Mundo

 

Toca pro velhinho

Com seu passarinho,

Toca pro ceguinho

Com seu cachorrinho.

 

Toca pro peixinho

Todo douradinho

Dando mil saltinhos

Lá no ribeirinho.

 

Toca pro reizinho

No seu palanquinho

Com seu narizinho

Arrebitadinho.

 

Toca pro forte sol,

Toca pra meia lua,

Toca pro frio vento,

Toca até lá na chuva.

 

Toca em toda a cidade,

Toca com muito amor,

Toca bem no meu peito,

Toca aonde eu for.

 

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*Cyro de Mattos é autor premiado no Brasil e exterior.


* * *

 

O HOMEM EGOCÊNTRICO E O PRESENTE DE NATAL, por Paulo Henrique Américo de Araújo

23 de dezembro de 2020


Paulo Henrique Américo de Araújo

 

Quando o solitário dono da casa se levantou da cama, em decorrência da insônia, o fogo da lareira ainda persistia aceso, apesar da hora avançada naquela noite fria. A cabeça dele doía, ao aproximar-se das últimas brasas fumegantes. Algumas pressões no fole bastariam, para manter o calor por mais alguns minutos; e o sono voltaria logo — pensou ele. E sentou-se na poltrona da sala.


Aquele homem de meia idade costumava sentar-se na macia poltrona da sala, durante a noite, e entregar-se aos seus pensamentos. Realmente entretinha-se enquanto pensava, sobretudo porque o objeto de suas intermináveis reflexões era… ele mesmo! Aliás, nada fazia na vida, além dessa atividade: pensar em si.

Não trabalhava, pois as magras rendas herdadas do pai proporcionavam-lhe alimento suficiente e teto. Servia-lhe muito bem a casa pequena, porém confortável. Desde muito jovem havia rejeitado a ideia de constituir família. Quantas preocupações isso lhe traria… Mudara-se para uma cidadezinha do interior — a menor da região — precisamente para fugir dos vizinhos barulhentos, pedintes e vendedores, que enxameavam na capital. Mas nos últimos dias, uma movimentação anormal nas ruas causava-lhe alguns incômodos de cidade grande, dos quais fugira.

Entretanto, uma vida tão medíocre e vazia não o deixava tranquilo, pois tinha uma ambição intimamente ligada à atração por pensar em si: “Como sair deste apagamento? Como quebrar este anonimato letárgico e me tornar importante, famoso, alguém conhecido no mundo inteiro? Como fazer com que meu nome se torne célebre?” Seus devaneios conduziam-no sempre ao mesmo impasse, todas as noites, durante suas insônias, pois esse vazio lhe causava remorsos.

Havia um paradoxo intrigante entre seu modo de vida, feito de inação preguiçosa, e seus pensamentos dominados por ânsias egocêntricas. Seus sonhos voavam longe nas noites mal dormidas: a fama mundial poderia iluminá-lo depois de um grande feito de armas, ou talvez uma expressiva obra artística ou intelectual… mas não dispunha de talentos para tanto. Chegou mesmo ao delírio de planejar o assassinato de um governante qualquer, mas repelia-o a ideia de entrar para a história como um criminoso. Não queria chegar a tais extremos, e até a preguiça contribuía para não enveredar por aí. Difícil de explicar, mas assim são as paranóias das mentalidades incoerentes.

O homem remoía-se nessas cogitações, quando ouviu batidas na porta. Fingiu que não as escutava, e pensou indignado: Quem poderá ser a esta hora? Como pode alguém me atormentar tão tarde da noite?

As batidas se repetiram. Enraivecido, ergueu-se da poltrona, dirigiu-se à porta, e após destrancá-la abriu-a bruscamente:

— Que é?! — perguntou ao homem parado à entrada. Este, surpreso, explicou-se:

— Desculpe o incômodo, senhor. Vi a luz acesa, e venho lhe pedir ajuda.



“Temos viajado durante dias, minha esposa e eu. Chegamos tarde à vila, e não há hospedaria disponível onde possamos passar a noite”.

— Ajuda?! Sabe que horas são? Está me interrompendo num assunto muito importante, no qual tenho despendido muito tempo.

O homem à porta era um viajante. Pobre, mas digno e alinhado em seu porte; roupas simples, mas limpas. E insistiu:

— Peço perdão, mais uma vez. Temos viajado durante dias, minha esposa e eu. Chegamos tarde à vila, e não há hospedaria disponível onde possamos passar a noite.

Enquanto o viajante falava, o homem apertava os olhos para enxergar através da escuridão. Vendo mais atrás a jovem esposa do viajante, discerniu nela a apreensão no semblante. Tudo nela refletia delicadeza e respeito, e uma luz fugidia revelou sua gestação em estado avançado.

Um movimento de compaixão perpassou a alma daquele homem: esses não são andarilhos inconsequentes. Parece apenas boa gente em dificuldades.

Infelizmente, anos inteiros vivendo sob o jugo da autocontemplação e do ‘voltar-se para si mesmo’ bloqueavam nele a compaixão devida ao desafortunado casal. A gestação da jovem contribuía para a percepção de mais um fardo que lhe cairia nos ombros. Disse então asperamente:

— Irresponsável! Viajar assim com sua mulher gestante, sem previdência alguma! Tenho que resolver um problema, e não posso lhes dar atenção.

— Mas, senhor, apenas por esta noite… — insistiu o viajante, antes de ser interrompido pelo dono da casa.

— É minha última palavra. Se quiserem, procurem uma gruta ali mais adiante. Podem se alojar junto com os animais presos lá. Mas não digam a ninguém que lhes indiquei o local. Não quero me envolver em assuntos dos outros, os meus já me tomam muito tempo.

Vendo aquela resolução impiedosa, o viajante fez um gesto de despedida e caminhou em direção à esposa. Desatou seu burrinho de carga, que estava atrás de alguns arbustos, e caminharam em direção à gruta indicada pelo homem.

O infeliz egoísta fechou-se novamente em sua casa, sentou-se na poltrona, diante da lareira, e voltou à sua obsessão: tornar-se famoso em todo mundo.1

Mal sabia ele que ali perto, na pobre gruta que indicou, ocorreria o fato mais extraordinário de toda a História: o nascimento de Jesus Cristo Nosso Senhor. Quanta glória para esse homem, se ele tivesse recebido São José e a Santíssima Virgem em sua casa. Hoje seria reverenciado em todo o mundo nas festividades do Natal. Seu nome estaria gravado na eternidade, vinculado ao de quem recebeu em sua casa o Menino Deus que iria nascer.


Adoração dos Pastores – Philippe de Champaigne, 1640. The Portland Art Museum.

O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira comentou, durante as festividades de um Natal, como Nosso Senhor procura atrair os homens para si nesse período abençoado: “Ele vai atrás de todos, meninos ou velhos, grandes ou pequenos, sábios ou ignorantes. Seja quem for, Ele vai atrás de todos. Pecadores, e às vezes pecadores imundos, Ele vai atrás deles e toca-lhes o coração, dizendo: ‘Meu filho, não queres vir a Mim? Nem agora queres vir a Mim? Pelo menos desta vez, pelo menos neste instante, deixa-te comover um pouco. Aqui estou Eu à tua procura, no interior de tua alma’”.2

Não sejamos como o egocêntrico do conto, que rejeitou o maior dos presentes de Natal. Abramos a morada de nosso coração ao Menino Jesus e à sua Mãe. Sobretudo, evitemos o pecado e estejamos atentos ao triste abandono por que passa a Santa Igreja Católica em nossos dias. Eis um símbolo cogente do abandono sofrido pela Sagrada Família.

Durante a noite sombria deste nosso século, temos obrigação, como católicos, de fazer atos de reparação e amor à Esposa Mística de Cristo — a Santa Igreja. Não deixemos que um exagerado ‘voltarmo-nos para nós mesmos’ provoque eventualmente nossa rejeição a Jesus, Maria e José, que batem à nossa porta.

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Notas

1.Anos atrás, o autor deste artigo ouviu este conto de um professor durante uma aula na faculdade. A história foi ligeiramente adaptada.

2.Trecho de conferência em 22 de dezembro de 1984. Sem revisão do autor.

3.Fonte: Revista Catolicismo, Nº 840, Dezembro/2020.

 

https://www.abim.inf.br/o-homem-egocentrico-e-o-presente-de-natal/

 

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