Fachada ocidental da Abadia de Westminster (Londres)
Plinio Maria Solimeo
Cumpro minha promessa voltando ao tema da atração da
juventude pela verdadeira beleza das igrejas. O que tratei recentemente,
ancorado numa notícia do jornal The Telegraph e comentada pelo Prof.
Gabriel Ferreira, da Unisinos, vai na linha do que diz o Conselho Pontifício
para a Cultura, no documento Via Pulchritudinis:
“O
caminho da beleza responde ao íntimo desejo de felicidade que reside no coração
de cada pessoa. Abrindo horizontes infinitos, leva a pessoa humana a empurrar
para fora de si mesmo, desde a rotina do efêmero instante, até o Transcendente
e Mistério, e procura, como objetivo final da busca pelo bem-estar e nostalgia
total, essa beleza original que é o próprio Deus, criador de toda a beleza”.
A beleza é uma das mais cativantes perfeições divinas, pois ela nos remete ao
Criador e nos leva a amá-Lo. Ensina São Tomás que os seres criados à imagem e
semelhança de Deus participam e refletem de algum modo a beleza divina. Os
limites de um artigo não permitem uma análise desse transcendental em todos
seus aspectos, mas apenas no efeito que se manifesta na arquitetura cristã
sobre os jovens de hoje.
Temos de recorrer ao passado, pois com a abertura da Igreja
para o mundo depois do Concílio Vaticano II, praticamente todos os aspectos do
campo eclesiástico, como a liturgia, a “música” sacra, a arquitetura,
enfim tudo se sucumbiu à feiúra e ao mau gosto que passaram a dominar as
exterioridades da vida religiosa, perdendo todo e qualquer atrativo.
O que mais
surpreende é esse interesse da juventude pelo belo na arquitetura religiosa é
universal. A título de exemplo, citamos o que ocorre na Universidade de Santo
Tomás de Aquino, em Nebraska/Lincoln. Como grande parte dos seus 25 mil alunos
frequentava a missa na capela do Campus, esta se tornou pequena, sendo preciso
construir outra.
Além do bom
sinal de crescente religiosidade entre a juventude, algo de espetacular se
passou com o projeto da nova capela. Os alunos se interessaram tanto pela
construção do templo que procuraram modelos de igrejas tradicionais, sobretudo
das que lhes mais agradavam, a fim de dar sugestões sobre seu embelezamento.
Tanto o
bispo responsável pela Universidade quanto os arquitetos do projeto são também
partidários de um reviver da arquitetura religiosa clássica. Afirma o bispo Dom
John Conley: “Nós pensamos que o estilo e toda a estrutura da igreja de
Santo Tomás de Aquino comunicam beleza, e beleza atrai […]. Nós acreditamos que
os estudantes serão atraídos por isso. Aliás, eles já estão sendo. Sempre há
estudantes rezando lá”.
Para o arquiteto Kevin Clark, “é incrível ver alunos
católicos e não-católicos participarem da beleza física do edifício. Isso faz
parte da conversa entre eles, e é uma coisa que intriga. Há uma série de não-católicos
com quem me deparo quando estou dando voltas na igreja […]. Eles só querem
estar lá, só querem ver aquilo, e a igreja realmente se tornou um elemento
capital da cidade”.
Outro
exemplo da abertura dos jovens para a beleza dos edifícios religiosos, ocorreu
no Centro Católico da Universidade de St. Paul, em Madison, Wisconsin. Lá
também uma nova capela foi construída tendo como objetivo inspirar a beleza da
arquitetura católica tradicional. A razão foi a mesma: “os estudantes
estão sedentos de beleza”.
Outro
estudo recente mostrou que a beleza era uma das razões mais importantes pelas
quais as pessoas vêm e ficam no catolicismo. A construção precisa ser grande,
linda e visível o suficiente para que os estudantes percebam isso. Os alunos
comentam que seus amigos não entendem como o prédio de concreto cinzento ao
lado da livraria [a antiga capela em arte moderna] possa ser uma igreja.
Esperemos que esse movimento tão salutar do reviver do
interesse pelo belo religioso contagie também os jovens brasileiros, os quais,
apesar de tudo, representam maioria da população ainda católica.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo
Mateus.
— Glória a vós, Senhor!
Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na Judeia, no tempo
do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém, perguntando:
“Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no
Oriente e viemos adorá-lo”.
Ao saber disso, o rei Herodes ficou perturbado, assim como
toda a cidade de Jerusalém. 4Reunindo todos os sumos sacerdotes e os
mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias deveria nascer. Eles
responderam: “Em Belém, na Judeia, pois assim foi escrito pelo profeta: E
tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades
de Judá, porque de ti sairá um chefe que vai ser o pastor de Israel, o meu
povo”.
Então Herodes chamou em segredo os magos e procurou saber
deles cuidadosamente quando a estrela tinha aparecido. Depois os enviou a
Belém, dizendo: “Ide e procurai obter informações exatas sobre o menino. E,
quando o encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-lo”.
Depois que ouviram o rei, eles partiram. E a estrela, que
tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava
o menino. Ao verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria
muito grande. Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua
mãe. Ajoelharam-se diante dele e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe
ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. Avisados em sonho para não
voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho.
"Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (Mt
2,2)
A festa da Epifania é a mais antiga que se
conhece. Era a única festa de Natal celebrada em toda a Igreja, até que no
Ocidente passou a ser celebrada no dia 25 de dezembro. A palavra “epifania”
significa, em grego, “manifestação”, referindo-se sobretudo à primeira claridade
da manhã, antes do nascer do sol. Depois passou a significar a “manifestação”
de Deus a todos os povos, pois Ele inunda com sua Luz todos os recantos escuros
de nossa existência.
Mais uma vez a Epifania grita para que nos levantemos e,
iluminados pela Luz do Nascimento de Jesus, sejamos espelhos que refletem essa
mesma Luz, iluminando toda a realidade envolta em trevas.
Tanto no nível pessoal como comunitário, sejamos luz do
mundo, e não nos cansemos de proclamar a todos que nosso Deus se manifesta nas
coisas simples e palpáveis, próximas: como um menino que nasce, ou como uma
expressão infantil de assombro e surpresa frente ao diferente, ou como cada um
dos gestos que podemos e devemos fazer para abrir espaço ao Deus da Vida e
àqueles que, como novos “magos”, vêm ao nosso encontro...
A celebração da Epifania nos lança para além dos
estreitos limites de qualquer instituição religiosa, de todo dogmatismo,
fanatismo e intolerância... Deus se manifesta sempre a todos os povos e em
todas as épocas. Todos os homens e mulheres estão sob a mesma mão providente de
Deus. No momento em que nos sentimos privilegiados por Deus, fazemos a mensagem
desta festa virar pó. Todos recebemos tudo de Deus e todos temos a obrigação de
aprender e ensinar uns aos outros; todos temos a nobre missão de acender uma
luz, em lugar de maldizer as trevas; todos temos uma estrela a nos guiar até à
fonte da verdadeira Luz.
Aqui não se trata de buscar, no relato da Epifania, um fundo
histórico, no sentido moderno da palavra. O importante não é o que está por
“detrás” da narração, mas o que nela se manifesta, a saber: os sábios do oriente representam
a humanidade em busca de paz, verdade e justiça; representam a aspiração
profunda do espírito humano, a marcha das religiões, da ciência e da razão humana
ao encontro de Cristo.
O caminho dos magos que buscam o Menino Jesus é o caminho de
todos os homens e mulheres, de todas as raças e religiões... O Jesus de Belém
está sempre disposto a receber o ouro da cultura dos povos, o incenso de
todas as expressões religiosas, a mirra de todas as dores.
Os Magos do Oriente são o símbolo de tantos homens
e mulheres que, em qualquer parte do mundo, a partir de outras sendas e
tradições espirituais, se perguntam, buscam e caminham.
Uma lenda os apresenta como um rei jovem, outro ancião e
outro negro, querendo significar que a humanidade toda é mobilizada a “fazer-se
caminho”.
Nesse percurso, os Magos escutam outras palavras e
sinais, aprendem a filtrar aquilo que “ajuda para o fim” e a não seguir
qualquer conselho. Herodes e os escribas estarão sempre presentes e ameaçam
reaparecer antes, durante e depois do encontro com o Menino.
E toda viagem que culmina na manjedoura, é ponto de partida
para novos caminhos.
O ícone bíblico do relato dos Magos ilustra o
risco do fechamento em nós mesmos, de enredar-nos nas armadilhas da nossa
própria inteligência, ou de petrificar-nos em nossas sacralidades doutrinárias
e legais. Isso se manifesta como rigidez para a mudança, a intensa necessidade
de manter a própria imagem, a resistência em aceitar coisas novas que rompam
nosso frágil equilíbrio ou os limites da nossa vontade...
A experiência da Epifania supõe uma capacidade de encontro e
de escuta de Alguém que chama, uma atenção especial para distinguir vozes
diferentes da própria voz, uma sensibilidade para escutar os gritos de nosso
mundo e para receber a palavra da comunidade cristã.
O Deus, escondido na fragilidade humana, não é encontrado
naqueles que vivem encastelados em seu poder ou fechados em sua segurança
religiosa. Ele se revela àqueles que, guiados por pequenas luzes, buscam
incansavelmente uma esperança para o ser humano, na ternura e na pobreza da
vida.
A viagem dos Magos se torna, assim, o símbolo da
vida cristã, entendida como seguimento, como discipulado, como busca.
A viagem exige desapego, coragem, movimento, esperança. Quem
está prêso à terra pelo peso das coisas, pelos apegos, pelos egoísmos, não é
capaz de se tornar peregrino. Não pode peregrinar aquele
que não se dispõe sinceramente a ultrapassar as fronteiras e os esquemas
pré-concebidos que muitas vezes lhe fecham e lhe dão segurança. Isto não o
deixa livre para encontrar o Deus da Vida que se manifesta.
Quem está convencido de possuir tudo, inclusive o monopólio
da verdade, não tem a gana da busca
contínua; é semelhante aos sacerdotes de Jerusalém, frios
exegetas de uma Palavra que não os atrai nem converte. Quem está bem instalado
na cidade não precisa ir a Belém; ao contrário, Belém se
reduz a um insignificante vilarejo de província.
Quando aprende a aceitar e amar a sua própria viagem,
novamente a estrela surgirá à sua frente, indicando o sentido de sua existência
e mantendo acesa a chama da busca inspiradora.
Os “magos” somos todos. Esta é a festa do Deus que
atrai a todos em seu amor. Quando parece que tudo está definitivamente fechado
vem os Magos para abrir as portas da vida. Quando parece que o céu está escuro,
brilha uma estrela para aqueles que querem continuar caminhando.
O Menino Jesus, Messias de Deus, não está fechado no templo
e na estrutura religiosa, mas é coração aberto em Belém para todos os que dele
se aproximam. Não é rei que impõe seu direito, mas criança necessitada, nos
braços de sua mãe. Não é sacerdote que controla a sacralidade divina a partir
do tabernáculo do tempo, mas menino ameaçado que se faz imigrante, assumindo
assim a história de todos os excluídos.
Nós somos “magos” para anunciar a todos que há
estrelas que apontam para a Gruta onde um Menino é acolhido, na rota da vida,
que continua sempre aberta. Devemos mobilizar a todos para criar um mundo onde
nenhum menino-Deus morra abandonado.
Somos “magos” quando experimentamos e anunciamos que a
vida é um dom, que o ouro do mundo é um presente para todos os homens
e mulheres, que os bens da terra estão a serviço da vida, que toda riqueza é
para ser compartilhada para o bem de todos.
Somos “magos” quando temos de dizer a todos, com nosso
exemplo, que a vida é prazer e glória, é incenso de admiração e de ternura, de
intimidade orante e de proximidade. É preciso proclamar que não buscamos a
glória do poder, a vitória da imposição, o incenso da mentira, mas buscamos e
compartilhamos o incenso do amor que pode ser celebrado na intimidade
da família, nas relações pessoais e sociais, no compromisso solidário. Diremos
que sempre haverá um perfume ao nosso lado, ao lado de todos os homens e
mulheres que poderão festejar, sonhar...
Somos “magos” quando revelamos que a vida é feita
também de mirra. Somos todos “mirróforos(as)”, portadores do perfume,
para levar o agradável odor em meio aos ambientes fétidos de ódio, intolerância
e violência. A mirra é o perfume de amor, mas também é o bálsamo da morte. A
mirra é como uma flor preciosa que pode nos acompanhar na vida, no crescimento
de cada dia, na comunhão com os outros, na tristeza e na esperança de cada
despedida.
Que cada morte seja tempo de amor, esperança de amor e não
fruto da violência.
Enfim, a Epifania nos destrava e nos coloca a caminho, seguindo
as “pegadas” dos Magos, fazendo opções, usando desvios, lançando-nos
pessoalmente a ações concretas..., movidos pela experiência de encontro com a
Vida, no despojamento de uma Gruta.
Texto bíblico: Mt 2,1-12
Na oração: Às vezes tenho de me deter na vida, como os
magos, para pensar e sempre me perguntar: onde estou? Em quê momento da vida me
encontro? A quê estrela sigo? Meu caminho tem coração?... É a arte do
discernimento.
A Graça também me precede, me acompanha sempre e libera meus
melhores recursos e minha inteligência para abrir-me ao novo, a abertura que
permite reconhecer o “Mistério” e deixar-me inspirar por Ele.