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domingo, 28 de abril de 2024
Inocência sem Flor
Cyro de Mattos
A história do Brasil pode ser considerada pelo lado do negro
com três pês: pão, pano, pancada. Pelo lado do indígena, entram nessa história
feita de assombros nas caçadas humanas três emes: missa, miçanga, mato.
Capítulos dessa história, impregnada de usurpação e açoite,
dizem que o Brasil Colonial formou uma dívida com o negro e o indígena que de
tão grande nas léguas da desgraça tornou-se impagável.
Em algumas paragens desse Brasil continental, pisado pelo
colonizador ávido, chegou-se ao ponto de terem desaparecido populações
indígenas que viviam em perfeito entendimento com a natureza, tirando dela
apenas o necessário para a sobrevivência.
Às vezes,
escuto vozes que rolam dos longes nesses rastros da desgraça. Como acreditar? Houve uma mancha que
envergonha. A fuga em desespero tingiu a
manhã do horror na taba queimada. Por
entre as sombras do que é perverso e não se apaga, remorso não existiu dos que
feriram os hábitos da inocência irmanados com o verdor da mata, dizimaram a
aldeia, forjaram a chacina, denominando as cenas insanas de façanhas.
Quem saberá quantos ventos na fuga de uma gente sem rumo
entoaram lamentos de uma triste música? Gemidos produzidos nas entranhas da
selva impenetrável? Como se nada de
horror acontecesse num mundo que amanhecia cheio de passaradas, brilhos e
fragrâncias.
Pasmem os céus, até hoje sentimentos que escorrem em dó e
lágrima ressurgem desses rastros que machucam. Tive conhecimento que a
virgindade de meninas indígenas vale pouco, muito pouco na cidade de São
Mateus, que fica nos confins do braço norte do território do Japará. Lá um homem branco compra a virgindade de uma
menina indígena também com aparelho celular, peça de roupa de marca e com uma
caixa de bombom.
As mães das vítimas pediram à polícia há um ano para apurar
o caso. Nenhum suspeito foi preso até agora.
Doze meninas já prestaram
depoimento. Elas relataram que foram exploradas sexualmente e indicaram nove
homens como os autores do crime. Entre eles, há comerciantes locais, um
ex-vereador, um médico chamado Pedro de Deus, um farmacêutico, dois sargentos e
um açougueiro.
As vítimas vivem na periferia de São Mateus do Japará,
município de baixa renda, que vive das atividades agrícolas, com base em
lavouras primárias, de pouca duração, nas estações temperadas de sol e
chuva. São Mateus do Japará tem quase
cem por cento da população formada por gente indígena. Calcula-se que a
população seja de quinze mil pessoas.
Entre as meninas
exploradas, há as que foram ameaçadas pelos suspeitos. Algumas foram obrigadas
a se mudar para casa de familiares, na esperança de ficarem seguras. O repórter
da revista “O Planeta” ficou interessado pelo caso logo que tomou conhecimento.
Conversou com algumas dessas meninas. Criou inicial fictícia
para cada uma delas, querendo com isso dificultar a identificação.
B, de 12 anos, conta que vendeu a virgindade para um
vereador. O acerto, afirmou, ocorreu por meio de uma prima dela, que é também
adolescente.
“Ele me levou para o quarto e
tirou minha roupa. Foi a primeira vez, fiquei depois sem saber o que fazer.”
A menina informou que uma amiga dela esteve duas vezes com
um comerciante.
“Na primeira vez, ela também foi
obrigada. Ele deu um celular.”
Já L, de 11 anos, disse que ela e outras
meninas ganharam chocolates, dinheiro e roupa de marca em troca da virgindade.
Como aconteceu com as outras na primeira vez, ela foi também obrigada. Recebeu
trinta reais e uma caixa de chocolates.
Outra menina, S, de 13 anos, disse que presenciou encontros
de sete homens com meninas de até dez anos.
“Eu vi meninas passando aquela situação, sem poder fazer
nada.” Comentou que eles sempre dão
dinheiro em troca disso (da virgindade).
Ela aceitou falar ao repórter porque
já tinha denunciado tudo à polícia federal. Sabia que o pior podia acontecer,
mas não tinha medo de nada.
“O homem que me usou primeiro
falou que se continuasse denunciando eu iria junto com ele pra cadeia.”
A mãe de S disse que, se ela abrir a boca, o homem que tirou
a virgindade da filha vai mandar matar ela.
Não é difícil imaginar que a menina S tinha os olhos sumidos
no rosto sem brilho, durante a entrevista que deu ao repórter de “O Planeta”.
Quase não saiu o que disse no final:
“Na primeira
vez senti as coxas doloridas. A boca com um gosto de coisa ruim. Depois fiquei
triste”.
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Cyro de Mattos é escritor e poeta. Membro Titular da
Academia de Letras da Bahia e do Pen Clube do Brasil. Primeiro Doutor Honoris
Causa pela Universidade Estadual de Santa Cruz.
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sexta-feira, 19 de abril de 2024
Memórias Infantis de Graciliano Ramos
Vê-se em Infância (1945), de
Graciliano Ramos, que a vida em seu começo ofereceu ao escritor de Alagoas
momentos de amargura e pessimismo. Forjada dos contatos com as pessoas de alma
pobre e as coisas em estado atrasado, disso resultando gestos e impressões com opressão
e violência, a vida não poderia nas raízes latejar o coração pequeno com
batidas leves. Assim, nas queimaduras de
uma poeira que se acumulava no cotidiano, o escritor de amanhecer áspero fora
acostumado muito cedo aos maus tratos e castigos.
Nascido em
Quebrangulo, interior de Alagoas, o autor de Vidas Secas (1938), romance
constituído de episódios autônomos, que podem ser considerados como contos, não
guardou nenhuma lembrança de sua cidade natal. Cedo se transferiu para Buíque
onde se criou numa zona de indústria pastoril, no interior de Pernambuco.
Muitos fatos dessa época estão arrolados em suas memórias infantis atravessadas
de dores e incompreensões. As
informações precisas sobre pessoas e fatos lá estão alinhavadas de maneira
pungente, expostas nas páginas ausentes de afeto, desde o amanhecer até quando
chegava a noite onde tudo é silêncio e a vida respira abafada na travessia
solitária formada com sonhos pesados, carentes de ternura.
O menino esteve
mergulhado certa vez numa comprida manhã de inverno, o açude cheio, a roça tingida
de amarelo e vermelho, as folhas pestanejando como cílios, os caminhos
estreitos virados em riachos. Convivendo com toda essa paisagem molhada, gostaria
que a natureza assim permanecesse na alma. Com a passagem dos dias, as árvores perderam
as folhas, o sol bebeu a água da terra, a natureza indiferente substituiu o que
era riqueza pela aridez das estações, que se introduzira na paisagem
caracterizada pela solidão e incômodos. A vida passou então a ser lenta, calcinada,
o dia envolvia tudo com forte calor, trevas densas ofuscavam claridades quando
chegava a noite para a longa duração.
Dessa poeira
cinzenta trouxe pedaços de pessoas, quase sempre más, ridículas, para o seu
mundo interior, o qual seria articulado depois em forma de ficção, operada como
permanente auscultação de um contínuo psicologismo angustiante, sofrido. Agora a
realidade produzida pelo artista da palavra se vestia com a roupagem do estilo
seco, focado numa humanidade despreparada para o afeto, acompanhada de momentos
toscos vinculados ao tormento. Na angústia fixada com a secura de alma, os sentimentos
nas memórias infantis e na ficção do autor de estilo descarnado, unindo o
passado ao clássico moderno, sem filiação aos tempos, avultam as atitudes de rancor,
seguidas vezes vão ser encontradas em suas personagens cercadas de atmosfera
sombria feita de niilismo devastador.
Encontram-se nessas
memórias da vida calejada com a hostilidade
as marcas pessimistas dos gestos fornecidos
pelos castigos que os pais afligiam ao filho, como bolos de palmatória,
chicotadas, cascudos e puxões de orelha, prisão na loja onde convivia com as
baratas, ratos e insetos. O pai e a mãe apresentavam-se grandes, temerosos, criaturas
desconhecidas como se fossem seres misteriosos. O pai tinha imaginação fraca,
era incrédulo, expandia a índole perversa com as surras cometidas no filho, a
mais absurda a que fora exercida com o cinturão grosso. A mãe tinha uma índole carregada
de sentimentos sem brandura, movidos com a dureza do cotidiano. Montava,
atirava, era categórica na atitude imperiosa que comanda.
O espírito infantil
de Graciliano Ramos recolheu-se na imagem de que a mãe era uma senhora hostil,
ranzinza, sempre a mexer-se com uma boca má, olhos perscrutantes que em
momentos de raiva se inflamavam com um brilho de loucura. Ente difícil que na
harmonia conjugal se afrouxava, amaciava as arestas, relaxava os dedos que
batiam na cabeça, dobrados, tendo a dureza de martelos. Pedaços de seus gestos foram
capturados pelo escritor nas rugas, olhos nervosos, boca irritada, mãos calosas,
nada suaves. O pai e a mãe eram dois seres que impunham obediência e respeito
com suas vozes absolutas.
Nesse ambiente familiar
de natureza hostil era comum que ouvisse no seu recanto pancadas, tiros,
pragas, ruído de espora, pisadas fortes de sapatões no piso gasto. Houvesse a voz
severa que comandava com atitudes enérgicas, às vezes vinha acompanhada de um
riso cavernoso, alastrava-se nos perigos ocultos alojados por todos os recantos.
O medo instalava-se assim como um gigante da alma numa paisagem interior de vida
iniciante indefesa, de estrutura insipiente, que hesitante sabia que era
impossível se armar com o auxílio de fraquezas; por isso mesmo não podia ter o
alcance de bons resultados com sentimentos leves, pensamentos doces, como
confessa o escritor em trecho de suas contundentes memórias da infância. (página
10, segunda edição, 1952)
Nesse círculo familiar,
em que o céu era terrível, natural que os seres e os objetos se tornassem irreconhecíveis,
absorvessem nos dias uma atmosfera difícil de fluir sem rancor, nesta circulava
uma humanidade formada com aflições e dissabores. Normal que a submissão de movimentos
infantis fosse uma constante, conduzida em suas circunstâncias críticas para
uma composição feita de negações e inércia, como soubera com forte tristeza nas
primeiras impressões que teve com a justiça através da surra tomada com o
cinturão grosso.
Na surra terrível
com o confronto desigual de forças, entre o algoz prepotente e a vítima
encurralada, a parte que lhe cabia no polo passivo de um processo cruel era
constituído de elementos que o atormentavam. Irrompiam das fissuras que tinham a
perda de suas características humanas, destituídas do estar gregário harmonioso
em família. Sem afeto e compreensão atuava no papel de réu como uma coisa
insignificante, semelhando um objeto inerte, admitindo o desempenho de sua função
como normal, por ser frágil, conformado quando então fosse castigado, apanhasse,
tomasse surras. Na que tomou com o cinturão grosso, foi antecedida de dura mortificação
com a fase preparatória, o quadro apresentava-se com particularidades impiedosas
nunca vistas. Refletiam-se através do olho duro a magnetizá-lo, dos gestos ameaçadores,
da voz rouca, a mastigar uma interrogação incompreensível.
“Sozinho, vi-o de
novo cruel e forte, soprando, espumando.
E ali permaneci, miúdo, insignificante, tão insignificante e miúdo como
as aranhas que trabalhavam na telha negra.” (página 31)
Subalterno da voz
absurda admitia que era justo o que se fazia com ele. Na surra que tomou com o cinturão acontecera seu
primeiro contacto com a justiça, colocando-o na situação irremediável de réu considerado
como uma coisa reles, derrotado pela impotência. Na cela de sua passividade frequente
não tinha como se opor a toda essa miserável situação adversa.
De suas memórias
infantis mestre Graciliano Ramos com um estilo realista traz imagens e figuras que
marcaram os passos sem auroras. Nos movimentos de uma narrativa que não cedeu à
facilidade, pouco faz concessões à esperança, suas criaturas aparecem com a
marca de coisas desagradáveis. Chico
Brabo era perverso com o menino de dez anos, mas prestativo com os da rua. Era
o vizinho da direita. A casa onde morava o menino ficava perto da residência da
família Sabiá. Quando ele falava com o vozeirão, o bendito de D. Conceição
murchava, as conversas desapareciam, o cochicho dos moleques, o rumor do abano
na cozinha, o crepitar das labaredas que lambiam o angico no fogão. Era como se o homenzarrão tivesse atravessado
portas e paredes, com a cara balofa surgisse de repente junto dele, com os olhos
miúdos de porco se tornasse irreconhecível na sua assombração. Parecia um bicho
que apavorava, sem as gentilezas que o amaciavam na calçada e na rua.
Uma das recordações
mais desagradáveis que lhe ficaram das pessoas na infância estava em Fernando,
sujeito magro, de aspecto tenebroso, impertinente, nunca fora visto sorrindo.
Sua fisionomia viscosa, de coisa úmida, dava a sensação repugnante de uma lesma
vertebrada e muito ágil.
De suas memórias marcadas
pelo tom pessimista percebe-se de vez em quando que nem todas as pessoas eram
dotadas de mesquinharia e rabugice. Em algumas não funcionava o grotesco como
marca indelével do do caráter no difícil gesto do viver. D. Maria, a velha
professora, era dona de uma serenidade que se aproximava da santidade. De Mário
Venâncio via-se um literato que havia chegado à terra, alguns afirmavam que
estava nele um sujeito profundo. Tinha o rosto fino como focinho de rato, alguns
chegavam a dizer que era um sujeito dono de questões profundas, colaborador de
jornais com artigos e crônicas, autor de livros. Esse homem apontado como dono
de conhecimento sobre as questões que inquietam os humanos prenunciava para o
moço um bom futuro. Via na sua escrita iniciante sinais de um Coelho Neto, nas
descrições convincentes vestígios do naturalista Aloisio Azevedo. O vaticínio
era repelido, mas não escondia que o engrandecia e ao mesmo tempo alarmava com
a desconfiança. A vaidade esmoreceu depois quando examinou os escritos com
calma pensando que a vida toda amargaria o provável engano.
De todas as páginas
escritas com a mão de mestre, nessas memórias que evocam os primeiros
movimentos de um autor com a suas experiências negativas de vida, sobressaem
algumas que de tão verdadeiras fazem pensar que a vida é inviável quando se
move com a insensatez dos desarranjos, má vontade, conflito, soluço. Entre
aquelas que chegam impregnadas desse conteúdo pelo avesso, destacam-se como páginas
de análise arguta da natureza humana, resultantes de uma narrativa singular, concisa
e revoltante, por exemplo, “Um Incêndio”, “Um Enterro” e “Venta-Romba”.
Em “Um Incêndio”, o
menino vai com o amigo José conhecer um incêndio nas cabanas pobres com a
cobertura de folhas de Ouricuri. Tinha
conhecimento até aquele momento do fogo com suas pequenas labaredas quando se cozinhava
a comida no fogão a lenha ou nas fogueiras de São João. Fogo imenso com labaredas altas e fumaça
impelida para o céu como uma nuvem cinzenta, densa, nunca lhe ocorrera na
visão. Daí a decepção quando encontrou os tocos de uma cabana queimada pelo
fogo. Teve a atenção chamada pelo grupo de pessoas que se lamentavam em torno
de um resto de gente, um torrão sem
braços e pernas, a cabeça queimada, o rosto como uma careta feia na qual pelos
buracos dos olhos desciam uma gosma nojenta. Era de uma menina preta que havia
morrido queimada no incêndio. Havia duas
meninas pretas que estavam cozinhando a comida na cabana enquanto os pais
trabalhavam no eito. A centelha do fogo que saltara do fogão a lenha pegara nas
palhas da cobertura do barraco. Uma das negrinhas fugiu, a outra ficou tirando
de dentro da cabana as coisas que achava como importantes. Quando pensou que conseguira salvar todas as
coisas tidas como importantes, lembrou-se da litografia de Nossa Senhora. Ao tentar
sair do barraco em chamas com a litografia da santa encontrou a porta da
entrada bloqueada pelo fogo.
“Curvei-me num
arremesso de coragem. Faltava-lhe o cabelo, faltava a pele – e não havendo
seios nem sexo, perdiam-se os restos da
animalidade. A superfície vestia-se de crostas, como a dos metais inúteis,
carcomidos no abandono e na ferrugem. Em alguns pontos semelhava carne assada,
e havia realmente um cheiro forte de
carne assada; fora daí ressecava-se demais.” (Pág. 83)
Distinguiu uma cara, melhor dizendo, sobra
de cara, máscara pavorosa, e retornou para a sua casa com a imagem horrível
daquela visão, arrependido de ter aceito o convite para conhecer um incêndio.
Amaldiçoava o amigo, que o expusera à tamanha desgraça. Durante
o dia voltou a mencionar a visão com o restante de um corpo de gente, a
descrevê-la nos detalhes, enojado. Responsabilizou Nossa Senhora como autora
daquela agonia sórdida. Se a criatura
não tivesse a ideia de salvar a imagem, estaria
cortando palma de Ouricuri para fazer nova
cabana. As pessoas grandes refutaram o seu modo de julgar a situação inconveniente.
Nossa Senhora não era uma figura feroz e impiedosa. Podia ser pior. O fogo
poderia ter comido um dos prédios importantes do comércio local. Escolhera a
negrinha para que alçasse ao céu, sem precisar passar pelo fogo do
purgatório. Não lhe convenceu o
argumento com a benesse estranha ao drama. Não lhe pareceu que o fogo do purgatório
tivesse a ver com o do incêndio que matou a negrinha. E a negra, imunda e com
um defeito de cor, não estava no céu.
“Que ia fazer lá? Estragaria as delícias eternas, mancharia as asas dos anjos”. (pág. 86)
Nessas memórias infantis tomamos
conhecimento de vivências amargas que serviram ao escritor para construir na sua
ficção regional destinada ao leitor adulto uma atmosfera angustiante coberta de
sombras. O gosto pela literatura provavelmente herdara do avô paterno, de quem
tinha um retrato velho no álbum guardado no baú. A propósito, ele próprio admitia
ter recebido desse avô a vocação que se alimentava do ócio e das coisas que não
servem para nada. Em Buíque, na primeira
escola, provou os primeiros desconfortos dos livros didáticos do Barão de
Macaúbas. Mudou-se para Viçosa, depois passou para Maceió onde frequentou um
colégio de má fama, que lhe deu momentos da vida sem bons predicados. Retornou e, aos 18 anos, foi morar em Palmeira
dos Índios, no interior de Alagoas, onde se tornaria prefeito. Graças a dois
relatórios que escreveu se tornou conhecido. Os documentos, provenientes da
gestão municipal com a marca de sua escrita precisa, deram a entender que ali
havia um escritor promissor, inclinado para largas expressões, voos altos.
Já foi dito que a vida é sofrimento. Sofremos é porque estamos na vida. Toda boa literatura tem sofrimento. Graciliano Ramos escreveu uma obra magnífica como conhecimento da vida, haurida no Nordeste sem o verde, seco, desamparado, que confirmam essas observações. Faz lembrar por isso o que a literatura tem de catarse para libertar-nos das ruas ásperas, calcinadas, de paisagem sombria em que andamos. Neste sentido, o poeta William Blake adverte que nunca se deve deixar de sonhar porque só nos sonhos pode ser livre o homem.
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quinta-feira, 18 de abril de 2024
Tributo A Manoel Dos Passos Galvão Filho
“O Dr. Galvão Filho foi um visionário e pioneiro na área da cirurgia, cujo notável talento e dedicação revolucionaram o campo médico do Sul da Bahia, salvando vidas e abrindo caminho para avanços médicos futuros."
Este foi outro gigante da nossa medicina.
Ao lado de Alicio Peltier de Queiroz e Alair Castro trouxeram o novo para a
nossa medicina regional. Revolucionaram a arte de se fazer medicina com
qualidade, ensino e expandir os nossos horizontes científicos com estímulos a
produção científica e medicina de valor.
Marcou a vida de uma geração de médicos filhos de Itabuna, valorizando os
colegas e o compromisso de voltarem para Itabuna.
Ele dizia: Itabuna tem que valorizar os filhos da terra e recebê-los na sua
comunidade médica com todo amor e carinho.
Abrir as portas para todos.
Este sempre foi o seu lema.
O Dr. Galvão Filho deixou um legado inestimável como um médico cujo compromisso
com a arte da Medicina e seu foco no valor científico do trabalho médico são
exemplos inspiradores para toda a comunidade médica. Sua dedicação incansável
em busca de avanços e inovações transformou a vida de inúmeras pessoas,
estabelecendo novos padrões de excelência e promovendo o bem-estar da humanidade.
Seu legado perdurará como um farol de esperança e inspiração para todos aqueles
que amam a Medicina, lembrando-nos da importância de ir além dos limites
conhecidos em busca de melhores cuidados de saúde.
Dr. Galvão foi um pioneiro na oncologia cirúrgica, deixando um impacto
significativo no campo da saúde e bem-estar das mulheres na região cacaueira da
Bahia. Sua dedicação e trabalho incansável na prevenção do câncer ginecológico
trouxe uma nova perspectiva para a saúde feminina, capacitando e educando a
população local sobre cuidados preventivos e exames de rastreamento. Seu
compromisso em oferecer acesso igualitário aos serviços de saúde e sua busca
contínua para melhorar a qualidade de vida das mulheres foi exemplar. O legado
do Dr. Galvão certamente viverá como um exemplo de como a medicina pode fazer a
diferença positiva na vida das pessoas e comunidades.
O trabalho de prevenção do câncer ginecológico na região cacaueira, que foi
aceito e apresentado em Congresso Internacional na Alemanha, bem como a
primeira cirurgia laparoscópica realizada na Bahia foram marcos importantes na
consolidação de Itabuna como um centro médico respeitado no interior da Bahia.
Com justiça e merecimento Dr. Manoel dos Passos Galvão Filho fica imortalizado
na nossa Academia de Medicina .
Hoje no dia de seu aniversário nosso reconhecimento ao extraordinário trabalho
e contribuição a medicina do Sul da Bahia, da Bahia e do Brasil.
Vida longa para Galvão Filho!
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sexta-feira, 12 de abril de 2024
Mundo Indígena
Cyro de Mattos
Bahetá, a velha indígena, ensinava como era importante o
milho para o batismo quando então o pajem colocava o nome na criança
simbolizando a sua verdadeira alma. Lembrava que algumas partes da anta deviam
ser reservadas para os espíritos. Certa porção era preparada e depositada na
mata para os encantados. Aconselhava ao caçador que ingerisse infusão de
vegetais aromáticos antes de sair para caçar. A escolha do vegetal dependia da
espécie de animal escolhido para caçar.
Acreditava que alguns alimentos não deviam ser consumidos em
certo período para evitar transtorno. As mulheres, após darem à luz, não comem
carne de tatu ou de cágado d’água, tais alimentos tornam o
recém-nascido com a saúde precária, são proibidos de serem ingeridos pelas
indígenas da aldeia.
Deviam ter gratidão pelo tamanduá, não matando, nem se
alimentando dele. Foi ele quem ensinou cantos e danças, pois em outros tempos
já tinha sido gente como eles. Um caçador oferece para uma mulher um alimento
que trouxe da mata, e, em retribuição, recebe uma comida por ela preparada.
Dessa forma, a amizade entre as famílias era constantemente fortalecida.
Chamava
atenção para alimentos considerados como sagrados, agindo espiritualmente
naquele que se alimenta deles como ingredientes positivos. No período da
puberdade, o beiju com molho de pimenta, o peixe cozido e a cabeça de
peixe são benzidos e defumados antes de serem consumidos pelas meninas.
Conhecia dezenas de lendas pertencentes ao seu povo. Era com
alegria contagiante que contava a lenda da mandioca. Explicava a sua história e
a origem. Mani era ainda pequena e muito
querida pela aldeia. Neta do cacique,
foi motivo de tristeza para o chefe da tribo quando apareceu grávida. Isso
porque não era casada com um bravo guerreiro, como ele desejava.
O cacique obrigou a filha a dizer quem era o pai do seu filho, mas ela dizia que não sabia como tinha ficado grávida. A desonestidade da filha desagradava muito o cacique. Até que um dia ele teve um sonho que o aconselhava a acreditar na filha, ela continuava pura e dizia a verdade ao pai. Desde então, aceitou a gravidez e ficou muito contente com a chegada da sua neta.
Um dia, perto de clarear a manhã, Mani foi encontrada morta
na taba. Ela simplesmente tinha morrido durante o sono e, embora sem vida,
apresentava um rosto alegre. Foi enterrada dentro da sua oca por sua mãe, cujas
lágrimas umedeciam a terra tal como se estivesse sendo regada. Dias depois,
nesse mesmo local nasceu uma planta, diferente de todas as que a tribo
conhecia. Percebendo que a terra estava
ficando rachada, cavou na esperança de que pudesse desenterrar sua filha com
vida. A mãe da menina encontrou uma raiz, a mandioca, que recebeu esse nome em
decorrência da união do nome de Mani e da palavra oca, que significa moradia
indígena de uma ou mais famílias.
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Cyro de Mattos é ficcionista, poeta, ensaísta, cronista,
romancista e autor de literatura infantojuvenil. Editado também em Portugal,
Itália, França, Espanha, Alemanha e Estados Unidos. Premiado no Brasil e
exterior. Membro efetivo da Academia de Letras da Bahia e Pen Clube do Brasil.
Primeiro Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Santa Cruz. Autor de mais de 80 livros.
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sexta-feira, 5 de abril de 2024
Editora de Portugal Publica
Outro Livro de Cyro de Mattos
Inspirado no Rio Cachoeira
A editora Palimage, de Coimbra, Portugal, acaba de publicar
Águas de Meu Rio, de Cyro de Mattos, livro que contém um poema dividido em
vinte partes em que o autor denuncia em versos pungentes e doloridos o estado
atual do Rio Cachoeira, largado ao abandono como um grande esgoto que escorre a
céu aberto. Com prefácio da poeta e musicista Denise Emmer, da Orquestra
Sinfônica do Teatro Municipal, Rio de Janeiro, traz na capa uma foto histórica
com o autor sentado em uma pedra das margens do rio, observando as lavadeiras
quando lavavam as roupas numa manhã ensolarada, em 1966. No Brasil, Águas de
Meu Rio foi publicado pela Editora Ibis Libris, do Rio de Janeiro. Este livro
forma com os volumes Vinte Poemas do Rio e O Discurso do Rio a Trilogia das
Águas, inspirada no rio Cachoeira. A Editora Palimage (www.palimage.pt)
publicou anteriormente cinco livros do poeta grapiúna e que são estes: Vinte
Poemas do Rio, O Discurso do Rio, Vinte e Um Poemas de Amor, Ecológico e Poemas
Ibero Americanos. Sobre a poesia de Cyro motivada pelo rio de sua terra natal
disse o poeta Carlos Nejar, da Academia Brasileira de Letras: “Poeta de voz
límpida como o seu rio, de música e sabedoria do silêncio”. E a poeta e
ficcionista Stella Leonardos, detentora de prêmios literários importantes,
observou: “A poesia de Cyro de Mattos é da boa, inventando o seu próprio ritmo
(como queria o mestre Manuel Bandeira) dentro do soneto, com recursos
verbicovisuais e, inclusive, neologismos adequados”.
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