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quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Cheiro de bicho na serragem do circo

Godofredo de Oliveira Neto

 


Céu plúmbeo, o centro do Rio sombrio e úmido neste sábado, a Academia Brasileira de Letras impávida. Muitas mortes, poetas, pensadores e prosadores voando. Resta o livro nas mãos. Ao reler Cruz e Sousa e pensar em Mallarmé e Baudelaire, desponta inevitável a figura do palhaço, esse bufão tão presente desde o Renascimento que ora exige risos hiperbólicos, ora cobre de melancolia a plateia hipnotizada.

As quedas do nosso simbolista maior das sulistas terras açorianas relembram a fragilidade da condição humana, a derrota, a impotência, o palhaço esticado no picadeiro após espalhafatoso passo mal traçado. O rosto enfiado na serragem molhada com cheiro de elefante é o seu fado.


ACROBATA DA DOR (Cruz e Sousa)


Gargalha, ri, num riso de tormenta,

Como um palhaço, que desengonçado,

Nervoso, ri, num riso absurdo, inflado

De uma ironia e de uma dor violenta

 

Da gargalhada atroz, sanguinolenta,

Agita os guizos, e convulsionado

Salta, gavroche, salta clown, varado

Pelo estertor dessa agonia lenta...

 

Pedem-te bis e um bis não se despreza!

Vamos! reteza os músculos, reteza

Nessas macabras piruetas d'aço...

 

E embora caias sobre o chão, fremente,

Afogado em teu sangue estuoso e quente,

Ri! Coração, tristíssimo palhaço.

 

Como o poeta sem lar, abandonado, achincalhado por seu público, sem carinho, sem calor, o excluído, o desmancha-prazeres. Mas que revela ao mundo a imagem de quem o olha e lê: palhaço somos nós!

O palhaço zombado e apedrejado é o avesso do Cristo ultrajado, segundo, se bem me lembro, uma frase de Starobinski. À seriedade de nossas certezas, o palhaço vibra e desfralda o escárnio, a derrota e a impotência. Nossa dignidade passa muito por brandir esse dístico. Um raiozinho de sol acaricia o Rio de Janeiro e a ABL.

Redes Sociais, 29/08/2023

 

https://www.academia.org.br/artigos/cheiro-de-bicho-na-serragem-do-circo

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Godofredo de Oliveira Neto - Sexto ocupante da Cadeira nº 35, eleito em 9 de junho de 2022, na sucessão de Candido Mendes de Almeida e recebido em 2 de setembro de 2022 pela Acadêmica Ana Maria Machado.

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segunda-feira, 21 de agosto de 2023

A saudação de Arno Wehling a José Murilo


O Acadêmico Arno Wehling, titular da cadeira 37, foi o orador oficial da Sessão da Saudade de Jose Murilo de Carvalho, realizada na última quinta-feira, dia 17 de agosto

Leia abaixo, o discurso proferido:



A homenagem que hoje a Academia Brasileira de Letras presta a José Murilo de Carvalho é, contrariamente ao senso comum, também um ritual de passagem. Ritual de passagem, porque o acadêmico se afasta de nosso quotidiano e ingressa na grande comunidade que constitui a vida intemporal da Casa. Se a ABL reúne em si passado, presente e futuro, é porque os que se foram continuam presentes, independentemente de épocas, estilos, formas de expressão e visões de mundo.

José Murilo de Carvalho viveu, e viveu intensamente, essa percepção. Ao pesquisar a história da Academia, deixando-nos os “Subsídios”, com o habitual aparato estatístico que manejava habilmente, e ao cuidar com desvelo de seu Arquivo, não o fazia apenas por dever do ofício de historiador, mas pela preocupação em deixar sempre desperto o espírito acadêmico. Sem isso - conforme entendia - a instituição não seria capaz de se manter. Sabia, por outro lado, não ser com o antiquarismo, mas pelo vibrar da vida cultural, que ela continuaria existindo, geração após geração.

Nessa despedida, senhor presidente, familiares de José Murilo, querida Norma Cortes, caros colegas, sei que não devo traçar o itinerário intelectual nem destacar as vitórias conquistadas. De certa forma já o fiz, com ele presente, nos 70 e nos 80 anos.

Gostaria de sublinhar a dimensão humana de José Murilo de Carvalho, particularmente importante numa instituição em que o convívio de pessoas absolutamente díspares é não só boa prática social como necessidade de realização do próprio ethos da Casa.

Creio que em abono dessa pretensão posso invocar alguma experiência. A profissional, sem dúvida, pois nessa corporação poliédrica de historiadores e cientistas sociais tínhamos várias afinidades – pertencíamos, afinal, à mesma tribo, como gostava de dizer. A valorização das instituições, como pude atestar quando de seu ingresso no Instituto Histórico, na Academia Brasileira de Ciências e na própria ABL. E as mais prosaicas: éramos vizinhos de bancada nesta sala de sessões – a bancada da “montanha”, como dizia em alusão à assembleia francesa – colaborávamos permanentemente na direção do arquivo e das bibliotecas e voltávamos para casa quase sempre juntos, pois José Murilo alternava minha carona com a de Edmar Bacha.

A Academia se despede de alguém cujas qualidades são fáceis de identificar e creio que meus colegas compartilharão a percepção.

Desde logo, a seriedade com que considerava tudo, o que se traduzia em cuidado minucioso na elaboração de juízos e na enunciação das opiniões. Em consequência, muito equilíbrio e ponderação, presentes em análises percucientes e eventualmente audaciosas, a que não faltava a elegância na exposição. Como também eventualmente não estava ausente algum humor crítico, leve ou ácido, em especial nas exposições orais – atitude que revelava, penso eu, impaciência com a falta de entendimento para o que lhe pareciam, à cartesiana, “ideias claras e distintas”.

Esse breve bosquejo do intelectual, porém, só se completa se lembrarmos o forte perfil ético de José Murilo de Carvalho. Não é pouco, quando sabemos como na vida em sociedade são fortes as cavilações, invejas, tergiversações e duplas faces. O homem e a obra, ao contrário, são íntegros, solares, translúcidos. E arriscaria dizer, lembrando Joaquim Nabuco, objeto de sua admiração, que este perfil ético é, nele, “o traço todo da vida”.

Com esses instrumentos morais e intelectuais José Murilo foi à luta. Impregnado de racionalidade, mas uma racionalidade que não se confinava ao gabinete de trabalho ou ao arquivo, antes se apoiava na vida. Certa vez convidou-me para falar na Academia sobre a ideia de História em Ortega y Gasset, num dos ciclos promovidos pela Casa. Até hoje não sei o grau de proximidade que tinha com o pensamento ortegueano – Norma talvez possa elucidar este ponto. Mas creio que a ele se aplica muito bem não só a orientação raciovitalista como sua motivação. Diz Ortega:

“O que me é dado ao ser-me dada a vida é a inexorável necessidade de ter que fazer algo, sob pena de deixar de viver... Vida é, pois, sempre, queira-se ou não, um que hacer algo.”

José Murilo dava a impressão de estar sempre prestes a “fazer algo”. Não, me expresso mal: dava-me a certeza de que sempre tinha algo a fazer. Mesmo em nossa última conversa, ao telefone, a despeito do evidente esforço para falar, era o futuro, “o que tínhamos a fazer”, que importava.

Esse raciovitalismo, ou essa racionalidade vital, foi canalizada para compreender seu país. Sabemos que deixa uma das obras mais importantes para a compreensão do Brasil. Sabemos que há temas da história do Império e da República, como a atuação das elites, a cultura política, o papel das forças armadas e a cidadania para os quais deu contribuições que se incorporaram, definitivamente, à nossa maneira de ver a formação brasileira. Sabemos que foi um pesquisador para quem, além dos trabalhos individuais, era relevante atuar em equipe, e liderava exemplarmente.

Não se pode conhecer o significado das elites oitocentistas e a própria existência do Império sem passar por seus estudos sobre a escola de minas de Ouro Preto e a sofisticada caracterização, inclusive estatística, como era seu gosto, que fez a propósito da “construção da ordem” estatal.

Sobre a cultura política são indispensáveis, os bestializados, desenhando a dicotomia povo – República e a visão do “bolchevismo de classe média” do Apostolado Positivista e seu legado para intelectuais e militares messiânicos e tantos ricos insights mais.

O livro sobre as forças armadas termina com uma relação de perguntas instigadoras e um comentário entre irônico e profético: “por falta de vontade política, de competência, de capacidade de antecipação, de virtu, como dizia Maquiavel, podemos ser novamente atropelados pelas rodas da fortuna.”

Seu estudo sobre a cidadania, aplicando ao Brasil procedimentos de Marshall sublinha outra dicotomia, a que existe historicamente entre o sistema eleitoral e a efetiva prática democrática.

Isso, e muito mais, sabemos e devemos a José Murilo de Carvalho.

O que não sabemos, excluindo as motivações estritamente acadêmicas, é o porquê dessas escolhas. Arrisquei uma explicação na comemoração de seus 70 anos: fazia história, como dizia Goethe, para se livrar do passado. Qual passado? O colonial: dependente, escravagista, clientelista, patrimonialista, mandonista. Nem por isso caiu em anacronismos ou juízos de valor intempestivos, antes utilizou seu racionalismo crítico para compreender sem justificar, e para concluir apontando caminhos.

Disse-me, mais tarde, que eu tinha sido bastante fiel à sua trajetória e a seus objetivos.

Trajetória, aliás, que começa com a esperança do jovem dos anos cinquenta, impregnado de desenvolvimentismo, que esperava ver o país arrancado de seu passado imóvel e chega ao intelectual da terceira década do século XXI com certo desencanto. Digo certo desencanto, porque talvez essa percepção esteja mais perto da visualização de circunstâncias conjunturais do que de uma convicção profunda.

O subtítulo de um de seus livros mais bem sucedidos, “Cidadania no Brasil – o longo caminho” talvez explique a razão do desencanto e de certa maneira o relativize. Há um longo caminho, porque as etapas de construção da cidadania foram, estão sendo, muito mais demoradas do que todos nós – José Murilo sobretudo – esperávamos. Entre o jovem Murilo dos anos 50 e o maduro intelectual de setenta anos depois há duas gerações – ou quatro, para Ortega – que não viram a plena superação do passado. E tenho a impressão de que o acadêmico de 2023 não se desencantou das expectativas do jovem mineiro que ele foi; apenas, mais uma vez se impacientou com a lentidão do processo.

De toda forma, pelo que representou para a interpretação do Brasil – portanto, para a cultura e a ciência do país – e para a Academia Brasileira de Letras, José Murilo de Carvalho será sempre uma referência maior.

18/08/2023

 

https://www.academia.org.br/noticias/saudacao-de-arno-wehling-jose-murilo

 


Arno Wehling
- Oitavo ocupante de cadeira 37, eleito em 9 de março de 2017, na sucessão de Ferreira Gullar e recebido em 11 de agosto de 2017 pelo Acadêmico Alberto da Costa e Silva.

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sábado, 19 de agosto de 2023

Alexandre Cachorro

Cyro de Mattos

 


          Os meninos de minha rua gostavam muito dos beijus que o Alexandre Cachorro fabricava. O vendedor de beiju era um homem magro, alto, a cara com marcas da bexiga, que quase o levou para a cova. Tinha poucos dentes na parte superior e inferior da boca, as gengivas empretecidas, devido ao vício que tinha de fumar o cigarro Yolanda Azul.  O cigarro quase não saía de sua boca.

          Seu Isaías, um homem de bigode cheio, cabeça sem um fio de cabelo, o melhor consertador de bicicleta na cidade, era um dos fregueses do Alexandre Cachorro. Sempre comprava o seu beiju quando ele passava vendendo no beco onde ficava a oficina de consertar bicicleta. Certa vez, Seu Isaías disse que Alexandre Cachorro passou a ter esse apelido depois que ficou sem o seu cão de estimação.

          Sansão era um amigo fiel que acompanhava seu dono quando cedo vinha vender beiju no balaio pelas ruas principais da cidade. Era um cão grande, pelo negro brilhante, que não fazia mal a ninguém. Tinha a mania de correr atrás do carro, latindo seguidas vezes, quando pressentia que o veículo passava na rua sacolejando, buzinando, como se fosse um bicho de outro mundo prestes a fazer algum dano ao vendedor de beiju. A cena provocava riso entre algum menino que tinha a sorte de presenciá-la, vendo naquele cão o melhor amigo do dono, tendo o melhor salto, sendo o melhor abraço e o melhor guardião. Qual o menino na cidade que não gostaria de possuir um cão como aquele, um protetor fiel de seu dono?

          Quando chegava perto do dono, tinha olhos de bicho pidão, o rabo inquieto. Então Seu Alexandre jogava o beiju para cima, sorrindo assim que via que no salto preciso a guloseima era abocanhada pelo cão. Tinha a mania de correr latindo atrás do carro, que passava em velocidade normal pela rua, tentando morder nessa hora uma das rodas do veículo. Um dia, disparou atrás de um carro latindo mais que de costume, tentando morder desesperado uma das rodas dianteiras do veículo. Foi pego pela roda traseira. O motorista não teve tempo de frear o carro e evitar a colisão com o animal, que com o impacto desferido pela roda traseira foi lançado para o passeio. Ficou com a cabeça fendida, a boca emborcada na poça de sangue. Horrorizado, não querendo acreditar no que seus olhos estavam vendo, o dono do animal ficou com a expressão cabisbaixa no rosto triste. Sabia que daquele momento em diante Sansão não seria mais o amigo que o acompanhava quando descia com o balaio cheio de beiju para ser vendido de porta em porta.

          Morava no casebre de paredes de adobe, cobertura de folha de flandres velho, erguido perto do matagal onde descia um córrego de águas escuras. No fogão a lenha, sem pressa, costumava preparar os beijus arrumados na frigideira em forma de um tabuleiro grande.  Sansão quieto em um dos cantos da sala, atento aos movimentos do dono no casebre acanhado. Ele fazia todos os dias o beiju seco e o molinho com um gosto adocicado, que era enrolado na palha de banana.  Dava água na boca do menino só de pensar no beiju molinho e doce produzido por Alexandre Cachorro.  Nem no céu havia outro igual àquele que ele fazia na frigideira quadrada sob o calor do forno.

           Na refeição matinal, o menino tinha os olhos de gula em cima das iguarias que a mãe trazia nas tigelas, postas com cuidado à mesa: cuscuz, requeijão assado, banana fritada, batata doce cozida, mugunzá, pão de milho amanteigado, quentinho, aipim molinho. Entre essas guloseimas prazerosas, nenhuma ganhava do beiju molinho e doce que o Alexandre Cachorro produzia. 

          Passou uma semana, duas, mais outra, um mês. De repente Alexandre Cachorro deixara de aparecer nas ruas da cidade para vender seu beiju apreciado pela freguesia enorme, sem que alguém conseguisse explicar o que havia acontecido com ele. Estaria doente lá no seu casebre onde vivia sozinho, desde que a mulher falecera de uma doença perigosa, que lhe atacou o pulmão? Onde às vezes se dizia que ele latia, rosnava e uivava igual a um cachorro perdido no mundo, à procura do dono, mas que nunca achava? Toda a cidade logo passou a saber que ele dera para imitar os latidos de cachorro quando ia vender seu beiju pelas ruas principais desde que ficou sem a companhia do amigo Sansão.

          Um dia, sua ausência demorada pelas ruas principais quando vendia seu beiju anunciado por ele mesmo como o melhor do mundo foi esclarecida por seu Isaías. O consertador de bicicleta informou que soube da notícia da morte de Alexandre Cachorro pelo carteiro. Os vizinhos estranharam que o casebre onde ele morava ficasse durante três dias com portas e janelas fechadas. Ele tinha o costume de abrir cedo a porta e janela da frente, mal o sol despontava no horizonte com sua flor luminosa.  Chamaram por ele vezes seguidas. Bateram com força na porta. Até que encontraram seu corpo estirado no piso de cimento esburacado, todo duro. 

          Estava agora dormindo o sono sem sonho na cidade dos pés juntos, naquele lugar onde todos chegam um dia para não mais acordar para esse mundo de cá cheio de momentos alegres e tristes.

          Não precisava mais vender beiju pelas ruas e becos, dando latidos igual a um cachorro.

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Cyro de Mattos é escritor e poeta. Premiado no Brasil, Portugal, Itália e México. Publicado nos Estados Unidos, Dinamarca, Rússia, Portugal, Espanha, Itália, França e Alemanha. Membro efetivo da Academia de Letras da Bahia. Doutor Honoris Causa pela Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC.

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sábado, 12 de agosto de 2023

Poeta e escritor Cyro de Mattos recebe comenda Dois de Julho na ALBA
Honraria foi entregue pelo deputado Marcelinho Veiga nesta quinta (10)




A Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA) foi  palco da entrega da maior honraria da Casa para o escritor e poeta Cyro de Mattos às 15h desta quinta-feira (10). Uma sessão especial proposta pelo deputado estadual Marcelinho Veiga (UB) marcou a celebração do artista baiano que recebeu a Comenda Dois de Julho após construção de legado literário com 65 obras publicadas de diversos gêneros e premiado em diferentes países. A entrega da comenda aconteceu no plenário da Alba. 
Em sua justificativa, o deputado Marcelinho Veiga diz “que o trabalho de Cyro de Mattos engrandece a vida de qualquer pessoa com sua obra”. Para ele, os livros contribuem com a progressão da cultura, artes e ciências, na Bahia e no Brasil. “É uma honra poder homenagear um baiano de Itabuna com um legado cultural imenso e que evidencia o poder intelectual e de expressão verbal do povo nordestino. A intenção é sempre poder registrar a importância da cultura em nossas vidas. Com certeza, milhares de pessoas já foram influenciadas pelas suas narrativas”, descreve.
Cyro de Mattos é autor de 65 livros pessoais, de diversos gêneros, premiado no Brasil, Portugal, Itália, México e Cuba. É o primeiro doutor honoris causa da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc). Ele também é membro efetivo das Academias de Letras da Bahia, Ilhéus e Itabuna. Tem livros editados em Portugal (cinco), Itália (seis), França (um), Alemanha (um), Espanha (dois) e Dinamarca (um). Seu livro ‘Infância com Bicho e Pesadelo e Outras Histórias’ recebeu o prêmio internacional Casa das Américas e está sendo traduzido para o espanhol.

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quinta-feira, 10 de agosto de 2023

Um homem lúcido

Ignácio de Loyola Brandão

 


Havia naquela cidade uma mulher que prometera nunca se casar se isso fosse bom para a humanidade a fim de conter o aumento populacional. Não eram poucos os pretendentes, ela era bonita. Não dessas belezas estonteantes, inatingíveis, de comerciais de tevê, principalmente os que vendem cervejas. Aliás, até hoje me pergunto a relação entre cerveja e mulher bonita. Porque? Ao olhar para uma você sente sede? Mas, sede você mitiga com água. E neste mundo corretamente político pergunto: uma mulher feia não inspira a pessoa a tomar cerveja? Preconceito? Machismo? Uma cerveja geladíssima pede paisagem deserta, sem fim, extensão super escaldante. Um lugar onde você precisa caminhar aos pulinhos para não queimar os pés pede o que? Cerveja geladíssima na mente publicitária.

Faz semanas que isto me intriga. Penso tanto que meu cérebro ferve, e com os neurônios queimados o pensamento se torna impossível para mim, preciso me refrescar, fico desesperado em busca de um oásis, com palmeiras, ou tamareiras, porque me parece, ou melhor, parece-me que as tâmaras se dão bem em regimes quentes.

O que, pensando racionalmente, se é que alguém no mundo pensa racionalmente, a não ser os Inteligentes Artificias que entraram em moda. No entanto, confesso que tenho 87 anos e ainda não encontrei nenhum Inteligente Artificial e me alertaram que se eu for procurar entre os políticos, aí é que ficarei desiludido. É um desastre.

Súbito, minha esposa me chama a atenção. Que elocubrações são essas que vejo como legendas na sua testa? No futuro haverá legendas nas nossas testas. Como pensar que em meio a um deserto ardente (nada a ver com a Sarça Ardentes bíblica) uma pessoa apareceria com um isopor cheio de garrafas de cerveja? Para vender a quem? Imaginou o preço que este ambulante cobraria? Uma exorbitância e ninguém reclamaria. Claro, sentado em uma duna no deserto, solão ardendo, você recusaria aquele liquido gelado por causa de uns reais. Uns? Não! Nem dezenas. Centenas. Milhares. Porque, reconheçamos, vale. Mas talvez pudesse pagar em Drex. A nova moeda que o Brasil inventou. Sim, mas espere, para sentar-se na areia fervente, será bom levar uma almofada climatizada, gelada. Ou será catastrófico para o traseiro? Drex. Já vivi a época do conto de reis, do mil reis, do cruzeiro, do cruzado, do cruzado novo, do real, da bitcoin. Mas estas serão outras considerações menos complexas. Não, não tomei ácido, estou lúcido. Como qualquer brasileiro.

Estado de São Paulo, 09/08/2023

 https://www.academia.org.br/artigos/um-homem-lucido

Ignácio de Loyola Brandão - Décimo ocupante da Cadeira 11, eleito em 14 de março de 2019 na sucessão do Acadêmico Helio Jaguaribe.

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OESTE SEM FILTRO - 10/08/2023

quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Assembleia Legislativa da Bahia 

Vai Homenagear Cyro de Mattos 

Com a Comenda Dois de Julho 


 

 No próximo dia 10 de agosto, às 15 horas, no plenário da Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, em Salvador, o escritor e poeta Cyro de Mattos estará recebendo a Comenda Dois de Julho, a mais elevada honraria daquela Casa.  A concessão da Comenda resultou do pleito proposto pelo deputado Marcelinho Veiga. A Comenda Dois de Julho foi criada para homenagear aos que engrandecem a vida com a sua obra, contribuem com a progressão da Cultura, Artes e Ciências, na Bahia e no Brasil.  

Entre as personalidades que foram agraciadas com a Comenda Dois de Julho figuram os professores doutores Luís Henrique Dias Tavares e Cid Teixeira, a Iarolixá Mãe Stella de Oxóssi, o Reitor da UFBA João Carles Salles, o escritor Joaci Góes, presidente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, todos eles membros efetivos da Academia de Letras da Bahia. Também receberam a honraria o instrumentista Carlinhos Brown, professor doutor Albino Rubin, médium Divaldo Franco, diretor teatral Márcio Meireles, a cantora Margareth Menezes, o desportista Bobô e a baiana Marta Vasconcelos, Miss Universo.  

Cyro de Mattos é autor de 65 livros pessoais, de diversos gêneros, premiado no Brasil, Portugal, Itália, México e Cuba. Primeiro Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Santa Cruz. Membro efetivo das Academias de Letras da Bahia, Ilhéus e Salvador. Do Pen Clube do Brasil e do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Editado também em Portugal (cinco livros), Itália (seis), França (um), Alemanha (1), Espanha (dois) e Dinamarca (um). Seus contos e poemas estão presentes em mais de quarenta antologias importantes publicadas no Brasil, França, Portugal, Estados Unidos, Rússia, Itália e Espanha. Seu livro Infância com Bicho e Pesadelo e Outras Histórias, Prêmio Internacional Casa das Américas, está sendo traduzido para o espanhol para em breve circular no continente da América Latina, numa edição do Fondo Editorial Casa de las Américas, de Havana, Cuba. 

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