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sexta-feira, 25 de março de 2022

O PRAZER – Gibran Khalil Gibran




O Prazer

 

            Então, um ermitão que visitava a cidade uma vez por ano, acercou-se e disse: “Fala-nos do Prazer”.

            E ele respondeu dizendo:

            “O prazer é uma canção de liberdade,

            Mas não é a liberdade.

            É o desabrochar de vossos desejos,

            Mas não é a sua fruta.

            É um abismo olhando para um cume,

            Mas não é nem o abismo nem o cume.

            É o engaiolado ganhando o espaço,

            Mas não é o espaço que o envolve.

            Sim, na verdade o prazer é uma canção de liberdade.

            E de bom grado eu vos ouviria cantá-la de todo o vosso coração; porém, não gostaria que perdêsseis vosso coração no canto.

            Alguns de vossos jovens procuram o prazer como se fosse tudo na vida, e são condenados e repreendidos.

            Eu preferiria nem condená-los, nem repreendê-los, mas deixá-los procurar.

            Pois encontrarão o prazer, mas não só ele.

            Sete são suas irmãs, e a última dentre elas é mais bela que o prazer.

            Não ouviste falar do homem que cavava a terra à procura de raízes e descobriu um tesouro?

 

            E alguns de vossos anciãos recordam seus prazeres com remorso, como se fossem erros cometidos num estado de embriaguez.

            Mas o remorso é o escurecimento da alma e não o seu castigo.

            Deveriam, antes, recordar seus prazeres com gratidão, como recordariam uma colheita de verão.

            Todavia, se acharem conforto no remorso, deixemo-los se confortarem.

            E há entre vós aqueles que não são jovens para procurar, nem velhos para recordar.

            E no seu temor de procurar e recordar, desprezam todos os prazeres por medo de afugentar ou ofender o espírito.

            Porém, na sua renúncia está seu prazer.

            E, assim, eles também descobrem um tesouro embora cavem com mãos trêmulas à procura de raízes.

            Mas, dizei-me, quem é que pode ofender o espírito?

            Ofende o rouxinol a quietude da noite, ou o pirilampo, as estrelas?

            E poderá vossa flama ou vossa fumaça sobrecarregar o vento?

            Crede que o espírito é um poço tranquilo que podeis perturbar com um bastão?

 

           Muitas vezes, ao negardes a vós mesmos um prazer, nada mais fazeis do que represar vosso desejo nos recessos de vosso Eu.

            E quem sabe se o que parece omitido hoje não espera pelo amanhã?

            Mesmo vosso corpo conhece sua herança e seus direitos, e vós não o podeis iludir.

            E vosso corpo é a harpa de vossa alma;

            A vós pertence tirar dele música melodiosa ou ruídos dissonantes.

 

            E agora vós perguntais em vosso coração: ‘Como distinguiremos o que é bom no prazer do que é mau?’

            Ide, pois, aos vossos campos e pomares e, lá, aprendereis que o prazer da abelha é sugar o mel da flor,

            Mas que o prazer da flor é entregar o mel à abelha.

            Pois, para a abelha, uma flor é uma fonte de vida.

            E para a flor, uma abelha é uma mensageira de amor.

           E para ambas, a abelha e a flor, dar e receber o prazer é uma necessidade e um êxtase.

            Povo de Orphalese, nos vossos prazeres, imitai as flores e as abelhas.”

 

(O PROFETA)

Gibran Khalil Gibran

 

Gibran Khalil Gibran - Poeta libanês, viveu na França e nos EUA. Também foi um aclamado pintor. Seus textos apresentam a beleza da alma humana e da Natureza, num estilo belo, místico, conseguindo com simplicidade explicar os segredos da vida, da alegria, da justiça, do amor, da verdade.

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O PRECURSOR

 

          Gibran foi sempre atraído pela ideia de que há, dentro de cada um de nós, um Eu maior, destinado a revelar-se um dia e a vencer.

          Cada um de nós é assim o precursor de si mesmo.

          E para chegar ao alvo, precisamos conhecer o caminho.

          Este livro procura sugerir o caminho através de duas preleções e 23 parábolas, todas escritas no estilo mágico de Gibran e variando em extensão de quatro linhas a quatro páginas.

          Dá ideia da beleza e força das imagens a curta história do catavento:

          “Disse o catavento ao vento: - Como és enfadonho e monótono! Não podes soprar numa outra direção a não ser no meu rosto? Perturbas a estabilidade que Deus me deu.

          E o vento não respondeu. Riu-se, apenas, no espaço.”

         

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