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segunda-feira, 8 de julho de 2019

RAUL POMPÉIA, Um impressionista brasileiro


REALISMO IMPRESSIONISTA

QUE É IMPRESSIONISMO?

          Como diz Afrânio Coutinho, o Impressionismo é uma fusão de elementos realísticos e simbólicos. A reprodução da realidade de maneira objetiva, minuciosa, constituía a norma realista; para o impressionista, a realidade ainda é foco de interesse, mas o que ele pretende mesmo é registrar a impressão que a realidade provoca no espírito do artista, no exato momento em que se dá a impressão. O importante não é o objeto e sim as sensações que o objeto desperta num determinado instante. O impressionista capta o instante, o fragmentário, o instável. O tempo constitui, portanto, o elemento básico do movimento.

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UM IMPRESSIONISTA BRASILEIRO

          Raul D’Ávila Pompéia nasceu em Angra dos Reis, província do Rio de Janeiro, em 1863, e faleceu no Rio de Janeiro em 1895.  Estudou no Colégio Pedro II e bacharelou-se pela Faculdade de Direito de Recife; iniciara, porém, seu curso em São Paulo, onde militou nos movimentos abolicionista e republicano. Iniciou-se nas letras muito cedo com “Uma Tragédia no Amazonas”, em 1880, novela que, apesar de imatura, já refletia um temperamento angustiado. Essa mesma inquietude, traço fundamental de sua constituição, levou-o a contínuas polêmicas e ao suicídio, aos trinta e dois anos de idade, na noite de Natal de 1895.

          Obras: “Canções sem metro” (1881); “O Ateneu” (1888).

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O ATENEU

          “Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta.”

          “Bastante experimentei depois a verdade deste aviso, porque me despia, num gesto, das ilusões de criança educada exoticamente na estufa de carinho que é o regime do amor doméstico, diferente do que se encontra fora, tão diferente que parece o poema dos cuidado maternos um artifício sentimental, com a vantagem única de fazer mais sensível a criatura a impressão rude do primeiro ensinamento...”

         Estas são linhas iniciais de O Ateneu, um dos romances mais controvertidos de nossa literatura, dada a sua violência e sua difícil colocação em qualquer dos movimentos artísticos do século XIX. Fortemente autobiográfico, trata das experiências frustrantes de um menino no internato do colégio Ateneu. O narrador é o próprio personagem, que evoca a sua vida no internato, e assim o leitor tem a visão de um sujeito adulto que lembra os acontecimentos e não a visão que o menino tinha ao ingressar no Ateneu. O romance é a memória de uma experiência infantil e está carregado com um espírito de vingança feroz. O homem não perdoa aquilo que o sistema do internato fez à sua infância, destruindo-a.

          O livro se compõe de episódios que são desmascaradamentos sucessivos da miséria moral e da corrupção que habita o Ateneu. De uma sensibilidade quase mórbida (ver o trecho acima) o menino percebe angustiado o cair das aparências. Aristarco, o diretor do colégio, que diz velar “pela candura das crianças, como se fossem não digo meus filhos: minhas próprias filhas”, se mostra cobiçoso, cínico e desumano. Os colegas são também figuras insensíveis, brutais. O menino não consegue estabelecer uma amizade profunda. Todas as camaradagens são rápidas, efêmeras e dissimuladas por uma angustiante ânsia de poder e por um homossexualismo evidente.

          O Ateneu supera o Realismo pela presença emotiva e grandiloquente de um narrador. As vibrações sentimentais têm a propriedade de durar na consciência que os recorda, e as lembranças de Sérgio adulto, os momentos que ele guardou do internato são mais emocionais que objetivos. O Ateneu é pura expressão das emoções do narrador, ou seja, de suas impressões emotivas. Assim, o colégio e seus personagens não são encarados com absoluta objetividade. O espírito de vingança, sofrimento e auto castigo de Raul Pompeia não o permitem. As impressões são demasiadamente fortes para que ele seja impessoal. Daí o caráter impressionista de seu romance.

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                                              O INCÊNDIO DO ATENEU

          Dirigi-me para o terraço de mármore do outão. Lá estava Aristarco, tresnoitado, o infeliz. No jardim continuava a multidão dos basbaques. Algumas famílias em toilette matinal passeavam. Em redor do diretor muito discípulos tinham ficado desde a véspera, vigor inabaláveis e compadecidos. Lá estava, a uma cadeira em que passara a noite, imóvel, absorto, sujo de cinza como um penitente, o pé direito sobre um monte enorme de carvões, o cotovelo, espetado na perna, a grande mão felpuda envolvendo o queixo, dedos perdidos no bigode de branco , sobrolho carregado.

          Falavam do incendiário. Imóvel! Contavam que não se achava a senhora. Imóvel! A própria senhora com quem ele contava para o jardim de crianças! Dor venerada! Indiferença suprema dos sofrimentos excepcionais! Majestade inerte do cedro fulminado! Ele pertencia ao monopólio da mágoa. O Ateneu, devastado! O seu trabalho perdido, a conquista inapreciável dos seus esforços!...

          Em paz!...  Não era um homem aquilo: era um de profundis.

         POMPÉIA, Raul – O ATENEU, Ed. Cultrix, São Paulo, 1976, pag. 216.

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Novo HORIZONTE
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Izaías Branco da Silva & Braz Ogleari
COMPANHIA EDITORA NACIONAL

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