A lenda da princesa negra que incendiou o mar
Maria Felipa é uma heroína negra
A poderosa Princesa da Bica
Uma Iabá guerreira pela liberdade
Que pôs fogo no mar de Itaparica
Incendiou os navios da escravidão
Era uma princesa negra poderosa
E simples como o mar e a liberdade
A mesma liberdade arrancada de seu povo
A mesma liberdade que brigava na baía
O mar de Kirimurê era o cais da liberdade
Kirimurê tingida de sangue negro
Fez-se resoluta pela Rua do Cais
Até os confins da África Mãe
Onde viviam livres em suas tribos
Com seus Reis e Rainhas e Guerreiros
E Príncipes e Princesas os mais belos
E livres antes do veneno da cizânia
Atiçada pelos invasores de além-mar
Foi lançado povo contra povo
E alimentada a cobiça pelo ouro negro
As cortes de além-mar estavam famintas
Sua cupidez arrasava os horizontes
Em busca de ouro de todas as cores
O cobiçado ouro negro feito de sangue
De negros e negras escravizados
Traficados como peças de um negócio
Onde seres humanos foram reduzidos
A uma mercadoria de alto lucro
A África foi transformada em celeiro
E seu povo negociado nos mercados
Lançaram reinos contra reinos
Irmãos contra irmãos
Pela força da mentira e da desídia
Caíram os mais fracos nos porões
Os súditos da Rainha África dizimados
Pela febre da escravidão arrancados
Da história de suas famílias e terras
Engolidos pelo mar da escravidão
Esquecidos nos navios infectados
Mas mantidos na memória de suas lendas
Dos guerreiros e princesas reis e orixás
Das danças e cantigas dos parentes
Agora presos nos ferros dos pelourinhos
Uivam nos troncos na chibata na senzala
Gemem nas prisões embrutecidas
Mas no culto de seus antepassados
A união de povos desunidos
Pelas mentiras dos comerciantes
Descobrem que a união é o poder
Que precisam para voltar à liberdade
Reúnem-se nos cantos dos xirês
E assentados nas pedras invisíveis
Cultivam seus deuses e deusas
Firmam a memória de liberdade
E fincam a rebeldia nos gestos
E a voz da liberdade se faz ouvir
De um grito onde ecoa independência
E esse grito ressoa além da fala
É a luta que se trava aguerrida
É o sonho em sua plena possibilidade
A batalha se faz ouvir na voz do povo
Com suas cores e vestes destroçadas
Mas decidido a deixar "nossa pátria
Hoje livre dos tiranos não será"
Espoca a independência encarniçada
E as lutas travadas em terra e mar
Pelas mãos heroicas do povo
Garantem que "nunca mais o despotismo
Regerá nossas ações, com tiranos
não combinam brasileiros corações"
E lá na praia do convento em Itaparica
surge Felipa a princesa negra e sua coragem
Em seu coração o sangue de liberdade
luta feito vulcão quando perde a paciência
É Maria Felipa e sua força guerreira
"Nasce o sol a 2 de julho"
Brilha mais que o primeiro
É sinal que neste dia
Até o sol é brasileiro"
Seu nome para que todos saibam
É Maria Felipa de Oliveira
A heroína negra da independência da Bahia
A heroína negra da independência do Brasil
Negra alta forte e desaforada
Contra a opressão dos invasores
De saia rodada, bata, torço e chinela
A princesa negra que tocou fogo no mar
Auxiliada por um grupo de mulheres negras
Incendiou quarenta e dois navios portugueses
Na lendária Batalha de Itaparica
Ocorrida na praia do convento
Em sete de janeiro de mil oitocentos e vinte e três
Na Ilha de Itaparica que fica na baía de Kirimurê
A baía de todos os santos na Bahia
Onde o povo negro, índio, caboclo e sertanejo
Lutou para garantir a vitória da independência
"havemos de comer/marotos com pão/dar-lhe
uma surra/de bem cansanção/fazendo as marotas/
morrer de paixão/português, bicho danado/
arrenegado, arrenegado"
E o mar foi incendiado com vitórias
O povo negro, índio, caboclo, sertanejo
Chamou para si a luta nas ruas
Onde se fez vitorioso e obrigou
A fuga dos portugueses que pensaram
Tomar Itaparica outra vez
Depois e a terem desdenhado
O plano era abastecer homens e naus
E rumar fortalecidos sobre o recôncavo
Onde esperavam manter a opressão
Mas na fazenda trinta e sete Maria Felipa
Costumava ficar bem lá no alto
Vigiando os barcos que chegavam
E à noite em romaria pela praia
Com seu grupo de mulheres guerreiras
Invadia os navios com suas tochas
Para atear fogo no mar de Kirimurê
Essa é a história da coragem
e da força de uma princesa negra
Uma mulher guerreira vitoriosa
Uma linda princesa negra Iabá baiana
Heroína das lutas da independência
Impôs ao invasores cruel derrota
Seus navios incendiados e afundados
Como os corpos negros jogados ao mar
Pela força da cobiça e da usura
Agora ardiam os navios da exploração
E o povo triunfante inicia sua marcha
Desde Santo Amaro, Cachoeira, Pirajá
Onde o corneteiro ao invés de recuar
Tocou "avançar cavalaria degolando"
Estava consolidada a independência do Brasil
A força do grito tornou necessária a luta
O povo é o responsável pela vitória
do Brasil em terra de todos nós
"Cresce, oh filho de minha´alma
Para a pátria defender
O Brasil já tem jurado
Independência ou morrer"
Terra da princesa africana Maria Felipa
A guerreira que tocou fogo nos navios
Para garantir a independência do país
E contribuir decisivamente
Na luta pela liberdade do seu povo
Geraldo Maia
Poeta na Praça
Contribuem:
Hino ao "Dois de Julho"
Ladislau dos Santos Titara
José dos Santos Barreto
E uma canção de domínio público
...........
Geraldo Maia Santos - Nasceu em Itabuna (Ba), no dia sete de
outubro de 1951. Começou a escrever aos seis anos e ainda se considera um
aprendiz repetente da escrita numa sociedade ágrafa com forte ascendência oral.
Tem nove livros publicados, seis de poesia Triste Cantiga de Alguma Terra (esgotado)
é seu livro de estréia, em 1978, Kanto de Rua (esgotado) (1986), Em
Cantar a Mulher (esgotado) (1996), Sangue e palavra (1998), O
chão do meu destino (2000), ÁGUA (2004) (esgotado) e dois de
ficção Atol ou o mar que se perdeu de amor por um farol (esgotado)
(1991) e PUNHAL, prosa de cangaceiro (esgotado) (1992). Todos os
livros editados de forma independente, exceto Sangue e Palavra, editado pelo
Selo Bahia. E um de cordel: "CORDEL DO MENSALÃO".
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário