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domingo, 23 de julho de 2017

PALAVRA DA SALVAÇÃO (36)

Anúncio do Evangelho (Mt 13,24-43)

— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Mateus.
— Glória a vós, Senhor.

Naquele tempo, Jesus contou outra parábola à multidão: “O Reino dos Céus é como um homem que semeou boa semente no seu campo. Enquanto todos dormiam, veio seu inimigo, semeou joio no meio do trigo, e foi embora. Quando o trigo cresceu e as espigas começaram a se formar, apareceu também o joio. Os empregados foram procurar o dono e lhe disseram: ‘Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde veio então o joio?’
O dono respondeu: ‘Foi algum inimigo que fez isso’. Os empregados lhe perguntaram: ‘Queres que vamos arrancar o joio?’
O dono respondeu: ‘Não! Pode acontecer que, arrancando o joio, arranqueis também o trigo. Deixai crescer um e outro até a colheita! E, no tempo da colheita, direi aos que cortam o trigo: arrancai primeiro o joio e amarrai-o em feixes para ser queimado! Recolhei, porém, o trigo no meu celeiro!’”
Jesus contou-lhes outra parábola: “O Reino dos Céus é como uma semente de mostarda que um homem pega e semeia no seu campo. Embora ela seja a menor de todas as sementes, quando cresce, fica maior do que as outras plantas. E torna-se uma árvore, de modo que os pássaros vêm e fazem ninhos em seus ramos”.
Jesus contou-lhes ainda uma outra parábola: “O Reino dos Céus é como o fermento que uma mulher pega e mistura com três porções de farinha, até que tudo fique fermentado”.
Tudo isso Jesus falava em parábolas às multidões. Nada lhes falava sem usar parábolas, para se cumprir o que foi dito pelo profeta: “Abrirei a boca para falar em parábolas; vou proclamar coisas escondidas desde a criação do mundo”.
Então Jesus deixou as multidões e foi para casa. Seus discípulos aproximaram-se dele e disseram: “Explica-nos a parábola do joio!”
Jesus respondeu: “Aquele que semeia a boa semente é o Filho do Homem. O campo é o mundo. A boa semente são os que pertencem ao Reino. O joio são os que pertencem ao Maligno. O inimigo que semeou o joio é o diabo. A colheita é o fim dos tempos. Os ceifeiros são os anjos. Como o joio é recolhido e queimado ao fogo, assim também acontecerá no fim dos tempos: o Filho do Homem enviará seus anjos, e eles retirarão do seu Reino todos os que fazem outros pecar e os que praticam o mal; e depois os lançarão na fornalha de fogo. Aí haverá choro e ranger de dentes.
Então os justos brilharão como o sol no Reino de seu Pai. Quem tem ouvidos, ouça”.


— Palavra da Salvação.
— Glória a vós, Senhor.

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Ligue o vídeo abaixo e acompanhe a reflexão do Pe. Paulo Ricardo:
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O "lado mau amado" de nossa vida

“Pode acontecer que, arrancando o joio, arranqueis também o trigo.
Deixai crescer um e outro até a colheita” (Mt 13,29-30)


A Bíblia fala sempre da vida humana. Nela encontramos inúmeras referências à questão da sombra ou do lado obscuro em nossa vida. Textos emblemáticos são as parábolas de Jesus que desvelam o que somos, o que está acontecendo em nosso interior; em certo sentido, assemelham-se a uma descrição de nossa realidade interior. Não são contos moralizadores; todos os personagens que aparecem somos nós. Por isso, as parábolas são tremendamente iluminadoras. Com efeito, cada um de nós é um tipo diferente de terreno; cada um, o trigo e o joio; cada um, os dois filhos; cada um, o fariseu e o publicano..., e assim por diante, em todas as parábolas.

O primeiro e o mais claro que se revela na parábola que a liturgia nos propõe para este domingo, é que a realidade da vida humana é de tal condição, que nela sempre vão estar mesclados o bem e o mal, o trigo e o joio, a boa e a má erva. Este é o fato. Todos gostaríamos que as coisas acontecessem de outra maneira. E que, portanto, não teríamos que ver cada dia tanto joio sufocando o bom trigo que cresce e dá vida.

Em nosso interior também sentimos cruamente o trigo e joio, e gostaríamos ser um bom campo de trigo, desses movidos pelo vento, que antecipam um pão abundante; e todo joio que aparece junto a esse trigo nos molesta, desejaríamos arrancá-la e como, depois de muito esforço, não conseguimos, então empreendemos a tarefa de ir buscar joios em campos alheios com um fervor que impressiona.

A parábola do joio e do trigo  revela a tendência humana em realizar os ideais de perfeição e distanciar-se cada vez mais de sua condição de criatura. O ideal é o ser humano “puro” e “justo”, sem qualquer imperfeição ou fraqueza. Tal tendência nos leva ao rigorismo contra nós mesmos, ou seja, nos leva a proceder com violência contra nossas próprias limitações.

Aquele que, a qualquer preço, deseja ser “perfeito”, em seu campo não irá crescer senão um trigo raquítico. Nas nossas raízes o joio está intimamente misturado com o trigo. Quando alguém não admite em si nenhuma falha, com suas paixões ele arranca também a própria vitalidade, com a fraqueza ele destrói também a própria força. Muitos perfeccionistas e idealistas se fixam de tal maneira sobre o joio em seu interior que só pensam em eliminar as falhas, de tal modo que a vida mesma fica prejudicada.  De tão perfeitos, eles ficam sem força, sem paixão, sem coração.

Numa espiritualidade “perfeccionista”, o ideal é o homem-mulher puro(a) e santo(a), sem defeitos nem fraquezas. Mas isso leva a um rigorismo moral, contra o qual parece dirigir-se a parábola deste domingo. A arte da humanização consiste na reconciliação com a própria sombra. O ser humano comporta em si amor e ódio, razão e emoção, gentileza e dureza... Muitas vezes vivemos apenas um polo e recalcamos o outro. Enquanto este permanecer nas sombras terá um efeito destrutivo. Muitos ficam chocados quando, apesar de todo esforço para serem pessoas amáveis e gentis, descobrem em si lados insensíveis, antipáticos e ofensivos.

Um outro aspecto que aparece na parábola é que os “trabalhadores do Senhor”, ou seja, os que se veem a si mesmos como os vigilantes da ortodoxia e da moralidade, tem a tendência de querer logo arrancar o joio. Ou seja, não toleram que o bem e o mal estejam misturados. E querem um campo limpo de tudo o que eles veem como joio. Normalmente, esta tendência daqueles que se consideram como “vigilantes do bem” costuma desembocar na intolerância e inclusive na intransigência e no fanatismo.

Na “parábola do trigo e do joio”, o impaciente é nosso orgulho, que gostaria de chegar de imediato aos resultados para ficar “satisfeito”. Enquanto vivermos, o joio crescerá no campo do nosso interior. Conviver com isso nos faz mais humildes e nos protege de uma dureza falsa em relação a nós mesmos e aos outros.

A sabedoria de Jesus convida-nos a reconhecer em nós, misturados, o trigo e o joio. Este último, que é semeado “durante a noite”, isto é, na obscuridade do inconsciente, podem ser nossas próprias sombras, aquilo que tentamos eliminar porque se mostra incômodo para nós e não combina com nossos ideais pré-fixados... E Jesus não nos pede que sejamos só trigo – essa é a armadilha de toda espiritualidade farisaica, mas que aceitemos nossa verdade completa e reconciliemos também com o “nosso lado obscuro”

Numa leitura moralista e dualista da vida, nós gostamos de separar o bom do mau, os que pensam como nós e os que não pensam como nós, os que são dos nossos e aqueles aos quais não os levamos em conta. Há muitas pessoas que, não só se sentem capacitadas, senão que além disso estão empenhadas em arrancar o quanto antes o que elas pensam que é a erva má. São os intolerantes, os que não suportam aqueles que fazem ou dizem o que eles creem que não se deve fazer nem dizer. Por isso não respeitam o pluralismo, nem a diversidade. Exigem que todos lhes respeite, mas eles se consideram com direito a não respeitar o dissidente, o diferente ou simplesmente o outro.

No entanto, o Senhor (dono do grande campo da vida) não quer que ninguém se veja no direito de discernir o que é trigo e o que é joio. Mas, sobretudo, o Senhor não tolera que ninguém se constitua em juiz que, como consequência, vai pela vida arrancando tudo o que a ele lhe parece que é joio. Porque pode equivocar-se. A religião não tem nem autoridade nem competência para decidir o que é joio na sociedade. E menos ainda tem competência para arrancar essa presumível joio. Somente o Senhor pode saber quem é trigo e quem é joio.

O ensinamento do evangelho de hoje é claro: sejamos tolerantes e respeitosos. Não julguemos, não condenemos e deixemos a Deus ser Deus. Nós não somos “deuses”. A fertilidade da nossa vida nunca é expressão de uma impecabilidade absoluta, mas resulta da confiança no fato de que o trigo é mais forte do que o joio e de que o joio poderá ser separado na colheita.

Em tudo que fazemos devemos ser permeáveis ao Espírito de Deus. Mas sempre devemos permanecer humildes e contar com a possibilidade de que nossas atividades cotidianas se misturem com segundas intenções. Essas são o joio. Mas isso não significa que devemos deixar o joio determinar a nossa vida, através do seu crescimento irrefreado.

A questão de fundo é esta: qual dos dois alimentamos em nossa vida: o joio ou o trigo? Aqui se trata de pôr ambos, o trigo que cresce em nós e o joio que espreita, sob o olhar e o cuidado do Semeador; porque só Ele é que pode fazer a colheita. O decisivo é colocar o Senhor no centro de nossa vida; e onde Ele encontra espaço de atuação, ali o trigo cresce viçoso e produz frutos.

O caminho do seguimento de Jesus não visa nos transformar em pessoas perfeitas e impecáveis. Antes, deseja encorajar-nos a conviver com nossos lados sombrios. O seguimento de Jesus, portanto, não é combate interno que desgasta, visando eliminar o joio, mas abrir espaço para que o Semeador atue com sua Graça.

Texto bíblico:   Mt 13,24-43

Na oração: A vida cristã nos faz especialistas em interioridade precisamente porque somos levados a percorrer, mil e uma vezes, todos os meandros de nosso interior para encontrar, transcendendo luzes e sombras, a Presença criadora que tudo sustenta e vivifica.

E é simplesmente dessa maneira que nos tornamos mais humanos e, portanto, mais divinos.
- quê lucidez você tem de sua própria sombra (joio) e qual a sua atitude com relação a ela? Quê atitudes você assume para que o trigo determine sua vida?

Pe. Adroaldo Palaoro sj



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