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quinta-feira, 8 de junho de 2017

JUNHO - MÊS DE MACHADO DE ASSIS (II)

ERRO


Erro é teu. Amei-te um dia

Com esse amor passageiro
Que nasce na fantasia
E não chega ao coração;
Não foi amor, foi apenas
Uma ligeira impressão;
Um querer indiferente,
Em tua presença, vivo,
Morto, se estavas ausente,
E se ora me vês esquivo,
Se, como outrora, não vês
Meus incensos de poeta
Ir eu queimar a teus pés,
É que, — como obra de um dia,
Passou-me essa fantasia.
Para eu amar-te devias
Outra ser e não como eras.
Tuas frívolas quimeras,
Teu vão amor de ti mesma,
Essa pêndula gelada
Que chamavas coração,
Eram bem fracos liames
Para que a alma enamorada
Me conseguissem prender;
Foram baldados tentames,
Saiu contra ti o azar,
E embora pouca, perdeste
A glória de me arrastar
Ao teu carro… Vãs quimeras!
Para eu amar-te devias
Outra ser e não como eras…



Machado de Assis

(Crisálidas – 1864)


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Os poemas de Machado, inseridos no contexto do romantismo (1836-1880), na verdade, não resistem mesmo é à comparação. É difícil crer que o autor da sutil sedutora Capitu pudesse ser tão pouco cativante em verso.

Mesmo sem nunca ter se engajado no romantismo, Machado parece atraído pelo ideário dos poetas de morte precoce que louvavam a espiritualidade e a juventude.

Em "Lúcia", por exemplo, canta os 15 anos da mesma forma que o contemporâneo Casimiro de Abreu se debruçou sobre os 8:

"Deixava entrar da primavera os bálsamos;
A várzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sós estávamos
E tínhamos quinze anos!".
  
         Lygia Fagundes Telles, escrevendo sobre Machado de Assis, aposta que outro poeta, Carlos Drummond de Andrade, daria, em sua opinião, um excelente interlocutor para o autor de "Dom Casmurro". Mas, se Drummond e Machado conversassem, apreciaria o primeiro a poesia do segundo?

Que julgue o leitor - relançamentos também servem para isso.


CYNARA MENEZES
ESPECIAL PARA
Folha de São Paulo 



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