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domingo, 17 de março de 2019

DUAS HISTÓRIAS SOBRE O ENCONTRO COM DEUS - Paulo Coelho


O discípulo impaciente

Após uma exaustiva sessão matinal de orações no monastério de Piedra, o noviço perguntou ao abade:
- Todas estas orações que o senhor nos ensina, fazem com que Deus se aproxime de nós?
- Vou respondê-lo com outra pergunta - disse o abade. - Todas estas orações que você reza irão fazer o sol nascer amanhã?
- Claro que não! O sol nasce porque obedece a uma lei universal!
- Então, esta é a resposta à sua pergunta. Deus está perto de nós, independente das preces que fazemos.
O noviço revoltou-se:
- O senhor que dizer que nossas orações são inúteis?
- Absolutamente. Se você não acorda cedo, nunca conseguirá ver o sol nascendo. Se você não reza, embora Deus esteja sempre perto, você nunca conseguirá notar Sua presença.
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Eu quero encontrar Deus
O homem chegou exausto no mosteiro:
- Venho procurando Deus há muito tempo - disse. - Talvez o senhor me ensine a maneira correta de encontrá-lo.
- Entre e veja nosso convento - disse o padre, pegando- o pelas mãos e levando-o até a capela. - Aqui estão as mais belas obras de arte do século XVI, que retratam a vida do Senhor, e a Sua glória junto aos homens.
O homem aguardou, enquanto o padre explicava cada uma das belas pinturas e esculturas que adornavam a capela. No final, repetiu a pergunta:
- Muito bonito tudo o que vi. Mas eu gostaria de aprender a maneira mais correta de encontrar Deus.
- Deus! - respondeu o padre. - Você disse muito bem: Deus!
E levou o homem até o refeitório, onde estava sendo preparado o jantar dos monges.
- Olhe a sua volta: daqui a pouco será servido o jantar, e você está convidado para comer conosco. Poderá ouvir a leitura das Escrituras, enquanto sacia sua fome.
- Não tenho fome, e já li todas as escrituras - insistiu o homem. - Quero aprender. Vim até aqui para encontrar Deus.
O padre de novo pegou o estranho pelas mãos, e começaram a caminhar pelo claustro, que circundava um belo jardim.
- Peço aos meus monges para manterem a grama sempre cortada, e que tirem as folhas secas da água da fonte que você vê ali no meio. Penso que este é o mosteiro mais limpo de toda a região.
O estranho caminhou um pouco com o padre, depois pediu licença, dizendo que precisava ir embora.
- Você não vai ficar para jantar? Perguntou o padre.
Enquanto montava no seu cavalo, o estranho comentou:
- Parabéns por sua bela igreja, pelo refeitório acolhedor, pelo pátio impecavelmente limpo. Entretanto, eu viajei muitas léguas apenas para aprender a encontrar Deus, e não para deslumbrar-me com eficiência, conforto, e disciplina.
Um trovão caiu do céu, o cavalo relinchou forte, e a terra foi sacudida. De repente, o estranho tirou seu disfarce, e o padre viu que estava diante de Jesus.
- Deus está onde o deixam entrar - disse Jesus. - Mas vocês fecharam a porta deste mosteiro para ele, usando regras, orgulho, riqueza, ostentação. Da próxima vez que um estranho se aproximar pedindo para encontrar Deus, não mostre o que vocês conseguiram em nome Dele: escute a pergunta, e tente respondê-la com amor, caridade, e simplicidade.
Dizendo isso, desapareceu.
Diário de Pernambuco, 22/11/2010

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Paulo Coelho - Oitavo ocupante da Cadeira nº 21 da ABL, eleito em 25 de julho de 2002 na sucessão de Roberto Campos e recebido em 28 de outubro de 2002 pelo Acadêmico Arnaldo Niskier.

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