11 de abril de 2017
As imagens viralizaram: um passageiro da United Airlines foi
arrastado para fora do avião após overbooking. A empresa tentou oferecer $400
para quem desistisse de ir e cedesse o lugar para os funcionários da United,
mas ninguém aceitou. Depois, ela aumentou a oferta para $800, ainda sem
adesões. Então, resolveu sortear aleatoriamente quatro lugares, mas um dos
passageiros, que alegava ser um médico e que tinha de atender pacientes no dia
seguinte, recusou-se a sair. Foi, então, puxado à força:
Ligue o vídeo abaixo:
O caso gerou muita polêmica nas redes sociais, cada um com
uma opinião diferente. Houve até libertários defendendo o direito da empresa de
praticar o overbooking, o que não feriria o direito de propriedade, segundo
eles. Bernardo Santoro, ex-presidente do Instituto Liberal, escreveu um
ótimo texto refutando essa posição, com argumentos liberais:
Já li três liberais, amigos meus, afirmando que o
“overbooking” (prática onde a companhia aérea vende mais bilhetes dos que
assentos) não deveria ser proibido porque seria intervenção do Estado no
mercado aéreo e porque isso “aumentaria os custos das passagens”.
Eu vou discordar de ambos os argumentos para dizer que sim,
overbooking é uma prática que deve ser coibida por ser fraudulenta, no cunho
mais liberal possível.
Em uma sociedade liberal, o direito de propriedade é sim um
direito fundamental. Rothbard e Hoppe chegam a argumentar que todos os demais
direitos se derivam do direito de propriedade, inclusive a liberdade.
Uma companhia aérea que vende uma cadeira em um avião, por
período limitado de tempo, com o fim de transportar alguém de um lugar para outro,
está exercendo sua propriedade privada. Quando esse contrato é fechado, a não
ser por motivo de força maior, ele deve ser cumprido, caso contrário isso é
fraude e desrespeito aos direitos de propriedade do contratante.
Rothbard, inclusive, chega a conceituar fraude como “o não
cumprimento deliberado de uma troca após a propriedade de outro ter sido
tomada”. É exatamente o que uma companhia aérea faz no overbooking, não
cumprindo o serviço contratado após tomar os recursos do contratante. E a
excludente contratual da força maior não vale para overbookings, pois força
maior é um evento extraordinário não previsível, o que não é o caso do
previsível e, infelizmente, ordinário caso do overbooking.
O argumento de aumento dos custos da passagem é totalmente incabível.
Se a passagem está barata porque você está vendendo mais passagens do que pode
oferecer, então o valor dessa passagem não é verdadeiro, é fraudulento.
Justificar overbooking é como justificar alguém vendendo
duas vezes o mesmo imóvel. Direitos de propriedade tem sua razão de ser
justamente pelo fato de ser o melhor regulador da escassez. Usar seu sistema
para justificar o uso duplo de uma mesma propriedade, onde o uso de um importa
no não-uso de outrem, é exatamente a negação do sistema de propriedade privada,
e não sua confirmação.
Overbooking é fraude ao sistema de propriedade e desrespeito
à santidade dos contratos em estado bruto e deve sim ser considerado ilegal e
punido financeiramente, justamente por ser uma medida de cunho liberal.
Não há muito como discordar: overbooking é uma prática
fraudulenta, pois engana o consumidor, que comprou uma coisa, mas não a tem
como garantida. João Luiz Mauad, colaborador do Instituto Liberal, apresenta um
ponto de vista interessante sobre outro aspecto do caso:
O incidente de ontem, num avião da United, viralizou na
internet e chocou o mundo. Um homem foi espancado e arrastado para fora do
avião pela polícia, no aeroporto O’Hare de Chicago, pelo “crime” de querer usar
o assento pelo qual havia pago.
O homem alegou ser médico e ter pacientes para atender na
manhã seguinte, motivo pelo qual recusou uma oferta inicial de US$ 400, mais
uma pernoite num hotel próximo, e posteriormente outra, de US$ 800, depois que
todos já haviam embarcado. Foi então que a United escolheu quatro assentos e
ordenou que os que estavam neles fossem retirados pela polícia para dar lugar a
membros da tripulação que precisavam viajar.
E por que a notícia viralizou? Quem estudou jornalismo
certamente conhece esta máxima: “Um cachorro morder um homem não é notícia. Mas
um homem morder o cachorro, é.”
Este caso é similar ao do homem que mordeu o cachorro, pois o fato de uma empresa privada empregar a força contra seus clientes é incrivelmente raro. A Internet está cheia de exemplos semelhantes (ou muito piores) de agentes do governo abusando de sua autoridade, mas as pessoas e a mídia nem ligam. Simplesmente porque já esperamos tais abusos da parte do governo, mas não de empresas privadas.
Este caso é similar ao do homem que mordeu o cachorro, pois o fato de uma empresa privada empregar a força contra seus clientes é incrivelmente raro. A Internet está cheia de exemplos semelhantes (ou muito piores) de agentes do governo abusando de sua autoridade, mas as pessoas e a mídia nem ligam. Simplesmente porque já esperamos tais abusos da parte do governo, mas não de empresas privadas.
Nessa altura, mesmo se tratando de exemplo é raro, já
apareceram os intervencionistas de sempre questionando se não seria o caso de
impor maiores regulamentações às empresas aéreas ou mesmo tornar ilegal o
overbooking.
Definitivamente, não. Se este foi um evento raro, é porque
empresas que agem como a United frequentemente experimentam uma reação muito
forte do mercado. Além do marketing perverso, que vai custar-lhe muitos
prejuízos, presentes e futuros, a United vai enfrentar pesadas ações judiciais
de indenização e, eventualmente, a cobrança de multas governamentais. A
proibição do overbooking, por outro lado, encareceria sobremaneira o preço das
passagens, prejudicando justamente os consumidores.
E, realmente, a reação do CEO da empresa, de pedir desculpas
pela “realocação” dos passageiros, sem reconhecer o absurdo da ação dos
seguranças, comprova isso: ele não entendeu o quanto havia gerado de revolta
nos consumidores, e isso significa queda de vendas para sua empresa. Assim é o
livre mercado: reage aos que não conseguem atender bem a demanda. Se a United
não fizer algo para recuperar sua imagem, vai sofrer as consequências. O
próprio mercado é o melhor mecanismo de punição e premiação.
Leandro Ruschel comentou o caso, expondo a lógica do
consumidor e do livre mercado:
O CEO da United Airlines acabou de dar a pior resposta da
história da comunicação corporativa. Reagindo as cenas que correram as redes
hoje, mostrando um passageiro sendo arrancado violentamente de uma aeronave da
empresa para dar espaço a funcionários em trânsito para outro aeroporto, o
sujeito tirou nota pedindo desculpas por ter “realocado” passageiros.
Bem, eu já liguei para a United para cancelar meu cartão de
milhas, e realocarei o meu dinheiro para outras companhias aéreas.
Não sei se fico mais indignado pela falta de respeito dessa
empresa com ou seus clientes ou pelo nível de burrice dos seus executivos,
demonstrada pela desastrosa resposta, o que me faz pensar seriamente em vender
essa ação a descoberto amanhã na Bolsa.
A resposta não é mais regulação, muito menos estatizar os
serviços. Destratar o cliente é a regra quando se trata de burocratas do
governo, ao contrário do que vemos na iniciativa privada. Alexandre Borges
escreveu no seu Twitter:
“Se fosse estatal, a culpa seria do passageiro incomodado com pobre andando de avião”. Basta ver como era na União Soviética para saber que não é brincadeira.
“Se fosse estatal, a culpa seria do passageiro incomodado com pobre andando de avião”. Basta ver como era na União Soviética para saber que não é brincadeira.
Nos Estados Unidos, onde há mais concorrência, a
cordialidade dos funcionários tende a ser ainda maior. Todos sorriem e
agradecem pela preferência, mostram-se dispostos a ajudar, são solícitos. Bem,
quase todos. Mas é sem dúvida a maioria, especialmente onde há mais
concorrência.
Uma andorinha só não faz verão. Algumas empresas ou alguns
funcionários sempre irão agir de forma condenável, comprovando que toda regra
tem exceção. O liberalismo reage com mais livre mercado, mais concorrência,
para que esses possam ser punidos pela liberdade de escolha dos consumidores.
Rodrigo Constantino
Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário