10 de março de 2017
Roberto de Mattei (*)
Quem vai em peregrinação a Lourdes o faz para imergir-se na
atmosfera sobrenatural de um lugar. A Gruta onde a Virgem Maria apareceu a
Santa Bernadete em 1858 e as piscinas em cuja água milagrosa os doentes
continuam a banhar-se são enclaves abençoados em uma sociedade dessacralizada.
Pelo contrário, quem vai a Fátima o faz para obter refrigério espiritual não de
um lugar, mas de uma Mensagem celeste: o chamado “segredo”, que Nossa Senhora
confiou a três pastorinhos há cem anos, entre maio e outubro de 1917. Lourdes
cura especialmente corpos, Fátima oferece orientação espiritual às almas
desorientadas.
Em 13 de maio de 1917, na Cova de Iria — um lugar remoto,
todo de pedra e oliveiras, perto da aldeia de Fátima, em Portugal — a três
crianças que estavam cuidando de suas ovelhas, Francisco e Jacinta Marto e a
prima Lúcia dos Santos, apareceu, de acordo com as suas palavras, “uma
Senhora vestida de branco, mais brilhante que o sol, irradiando luz mais clara
e intensa que um copo de cristal cheio de água cristalina, atravessado pelos
raios do sol mais ardente”. Essa Senhora se revelou a Mãe de Deus, encarregada
de trazer uma mensagem aos homens, e disse aos três pastores que voltassem ali
no dia 13 do mês seguinte, e assim por diante, até 13 de outubro. A última
aparição terminou com um grandioso milagre atmosférico, denominado a “dança do
sol”, visto por dezenas de milhares de testemunhas, até mesmo a mais de 40
quilômetros de distância.
O segredo revelado por Nossa Senhora em Fátima é composto de
três partes que formam um todo orgânico e coerente. A primeira é a visão
aterradora do inferno, onde as almas dos pecadores caem; a este castigo opõe-se
a misericórdia do Imaculado Coração de Maria, remédio supremo oferecido por
Deus à humanidade para a salvação das almas.
A segunda parte se refere a uma alternativa histórica
dramática: a paz, fruto da conversão do mundo e do cumprimento dos pedidos de
Nossa Senhora, ou um terrível castigo que aguarda a humanidade se esta se
obstinar na via do pecado. A Rússia seria o instrumento desse castigo.
A terceira parte, divulgada pela Santa Sé em junho de 2000,
amplia a tragédia à vida da Igreja, oferecendo a visão de um Papa e de bispos,
religiosos e leigos mortos a tiros pelos perseguidores. As discussões que se
abriram nos últimos anos sobre esse “Terceiro Segredo” podem, no entanto,
ofuscar a força profética da parte central da Mensagem, resumida por duas
frases decisivas: “A Rússia espalhará seus erros pelo mundo” e “Por
fim, o meu Imaculado coração triunfará”.
Em 13 de julho de 1917, quando Nossa Senhora dirigiu às
crianças de Fátima essas palavras, a minoria bolchevique não havia ainda tomado
o poder na Rússia. Isso acontecerá alguns meses depois com a “Revolução de
Outubro”, que marca o início da expansão mundial de uma filosofia política que
visa minar os fundamentos da ordem natural e cristã. “Pela primeira vez na
história — disse Pio XI na encíclica Divini Redemptoris de 19 de
março 1937 — estamos assistindo a uma insurreição, cuidadosamente
preparada e calculadamente dirigida contra ‘tudo o que se chama Deus’ (cfr. 2
Tess 1, 4)”. Não houve no século XX crime análogo ao do comunismo, por sua
duração, pelos territórios que abraçou, pela veemência do ódio que foi capaz de
insuflar. Após o colapso da União Soviética, esses erros como que se libertaram
do invólucro que os continha, para se propagarem como miasmas ideológicos em
todo o Ocidente, sob a forma de relativismo cultural e moral.
Os erros do comunismo parecem ter penetrado no interior da
própria Igreja Católica. O Papa Bergoglio recebeu recentemente no Vaticano os
representantes dos chamados “movimentos populares”, representantes da nova
esquerda ecolo-marxista e, desde o início de seu pontificado, expressou sua
simpatia para com os regimes pró-comunistas dos irmãos Castro em Cuba, de
Chávez e Maduro na Venezuela, de Morales na Bolívia, de Rafael Correa no
Equador, de José Mujica no Uruguai, esquecendo as palavras de Pio XI que, na
aludida encíclica Divini Redemptoris, definiu o socialocomunismo como
“intrinsecamente perverso”.
Em Fátima, no local das aparições, o Cardeal Benedetto
Aloisi Masella, enquanto representante do Papa Pio XII,
coroa pela primeira vez
a imagem de Nossa Senhora em
13 de maio de 1946.
A Mensagem de Fátima é um antídoto à penetração desses
erros. Seis papas reconheceram e honraram as aparições da Cova da Iria. Paulo
VI, João Paulo II e Bento XVI visitaram o Santuário de Fátima, enquanto João
XXIII e João Paulo I lá estiveram quando ainda eram os cardeais Roncalli e
Luciani. Pio XII enviou o seu delegado, o cardeal Aloisi Masella [foto ao lado].
Quem nunca foi a Fátima, não perca a ocasião de ir, no
centenário deste acontecimento. Quem já esteve uma ou mais vezes, faça como eu:
retorne. Não vai encontrar, pelo menos até a Páscoa, uma grande massa de
peregrinos. Ignore o novo santuário, cuja feiúra lembra aquele de São Pio de
Pietrelcina em San Giovanni Rotondo, e restrinja sua visita à capela das
aparições, ao antigo santuário, que abriga os restos mortais de Jacinta e
Francisco, e à loca do Cabeço, onde em 1916 o Anjo de Portugal antecipou as
aparições aos três pastorinhos. Fátima revela a seus devotos a gravidade da
tragédia do nosso tempo, mas também abre o coração para uma esperança
invencível no futuro da Igreja e de toda a sociedade.
____________
(*) “Il Tempo”, Roma, 7-3-2016. Matéria traduzida do
original italiano por Hélio Dias Viana.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário