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sábado, 4 de janeiro de 2020

FACULDADE DE DIREITO - Cyro de Mattos


Faculdade de Direito
Cyro de Mattos



          Da Universidade Federal da Bahia. Gloriosa Faculdade de Direito, como era comum alguns universitários dizerem, voz cheia de expressão feliz que o rosto deixava transparecer. No percurso que eu fiz na Faculdade de Direito, de 1958 a 1962, recordo a maneira de ser dos mestres nas aulas, a regularidade, a precisão e a ordem daqueles homens de vasto saber.

            Diante de mim, nesse instante, a paixão de Adalício Nogueira pelo Direito Romano. A exposição exemplar que Nelson Sampaio fazia sobre a desumanização da Política ao longo dos séculos. A visão ampla e moderna de Machado Neto em torno da consideração do Direito concebido como norma de Kelsen, o jurista austríaco. A graça do professor Machadinho, o tetracatedrático, baixinho e gordo. Dizia em voz sonante, antes de iniciar a aula, que os alunos ficassem mais que atentos, com os seus ensinamentos as paredes iriam tremer.

            Lembro a eloquência de Josafá Marinho em suas lições de Direito Constitucional, a maneira encantatória das aulas de Direito Penal, ministradas por Aloysio de Carvalho Filho, substituído depois pela veemência de Raul Chaves. A eficiência de Elson Gottschalk para demonstrar o lado pragmático do Direito do Trabalho. O jeito elegante, a dicção objetiva, o poder de síntese e densidade com que o mestre Orlando Gomes transmitia, sem esforço, as aulas admiráveis de Direito Civil.

            Com esse e outros mestres, a razão do moço que veio do interior logo tomou conhecimento que o Direito é uma das maiores conquistas do ser humano neste planeta. Sem essa hora não existe o homem real, mas o regresso na escala biológica. Não há coexistência, a paz, meta maior de todos nós nesse tão difícil gesto de viver.

            Faculdade de Direito de minha adolescência. Dos jovens de ontem, residentes na Capital ou vindos do interior, alguns deles bem nascidos. A minha turma da Faculdade de Direito era também a de Antônio Luís Calmon Teixeira, o civilista, Marcelo Gomes, o empresário, Adalberto Carvalho, o cracão de bola, João Berbert, o cientista social, Dylson Dórea, de notável memória, o jurista, Artur Caria, o juiz, Raul Ferraz, o deputado, Lucy Lopes Moreira, a desembargadora, Ildásio Tavares, o poeta, João Ubaldo Ribeiro, o romancista, e Edvaldo Brito, o orador.

            No rigor de atitude que comanda, o tempo passa e não perdoa. Sabe todos os caminhos, a claridade do dia e a escuridão da noite. Deixa-me sem resposta, se pergunto por essas vozes, risos, expectativas, desafios, emoções que passam por meus olhos agora como sombra de uma paisagem precária. Por que tão depressa lá se foram esses gestos na curva da estrada? Ninguém pode me dizer algo sobre esse instante em que só tenho ouvido para escutar o rumor daquelas vozes.

            Ninguém decifra como dói saber que a recordação de certas imagens nada mais é do que saudade de certos instantes. E as pessoas, objetos, bichos, ruas são fugidios. Como os dias, semanas e meses. Infelizmente.

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Cyro de Mattos, escritor e poeta. Primeiro Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Santa Cruz. Membro efetivo da Academia de Letras da Bahia, Pen Clube do Brasil, Academia de Letras de Ilhéus e Academia de Letras de Itabuna. Autor premiado no Brasil, Portugal, Itália e México.

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