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sábado, 4 de agosto de 2018

10 DE AGOSTO: DIA DE JORGE AMADO - O Sobrevivente)


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(Rio de Janeiro, 1956 -  o sobrevivente)


            Valério Konder*, que não me retirou sua estima quando deixei de militar no Partido Comunista, dá-me notícia da campanha desencadeada contra mim, pela direção do Partido, no estrangeiro: disseram cobras e lagartos, fui tratado de traidor e vendido. Diógenes de Arruda Câmara, na época uma espécie de dono do Partido (e da verdade), declarou numa reunião do Comitê Central: em seis meses ele deixará de existir como escritor e homem de esquerda. Vamos acabar com ele.

            Nas fofocas que me chegam a esse propósito, uma me entristece: Pedro Motta Lima**, meu velho amigo e camarada de longo caminho, andara fazendo minha caveira mundo afora, na URSS, na Bulgária, em Cuba, sei lá onde. Entristeço-me, mas compreendo: comunista imemorial, bolchevique comprovado, obediente às ordens recebidas, meu bom Pedro deve ter dado seu recado de coração apertado, disciplina é disciplina, não lhe guardo rancor. Outros cumpriram as ordens alegremente, sempre fui visto com desconfiança pelos intelectuais cooptados à direção partidária, o que esses disseram e fizeram não chegou a me entristecer.

            O que me admira até hoje é que a afirmativa do enraivecido dirigente não tenha se convertido em realidade, que sua previsão não se tenha cumprido. Sobrevivi, quem o diria.

* Valério Konder, médico sanitarista.

** Pedro Motta Lima (1889/1966), jornalista.

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            Sendo antidoutor por excelência, o antierudito, trovador popular, populachero, escrevinhador de cordel, penetra na cidade das letras, um estranho nos saraus da inteligentzia, universidades da França, da Itália e do Brasil fizeram-me doutor honoris causa, vamos lá saber por quê.

            No Brasil, a alegria superou a honra, pois na Universidade da Bahia elevaram-me a doutor ao lado de Carybé e de Caymmi e na do Ceará vestiram comigo a toga do saber na solene cerimônia Eduardo Portella e Aldemir Martins, quatro doutores de verdade, criadores de cultura. Se não me pretendo mestre como eles, deles sou mabaça, corre em nossas veias o mesmo sangue mestiço do povo brasileiro, condiciona nossa arte e nossa literatura.

(NAVEGAÇÃO DE CABOTAGEM)
Jorge Amado

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JORGE AMADO - Quinto ocupante da Cadeira 23 da ABL, eleito em 6 de abril de 1961, na sucessão de Otávio Mangabeira e recebido pelo Acadêmico Raimundo Magalhães Júnior em 17 de julho de 1961. Recebeu os Acadêmicos Adonias Filho e Dias Gomes.

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