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sábado, 23 de setembro de 2017

POEMA DOS DONS – Jorge Luís Borges

Poema dos Dons


Graças quero dar ao divino labirinto de efeitos e causas pela diversidade das criaturas que formam este singular universo!

Graças quero dar pela razão, que não deixará de sonhar com um plano para o labirinto!

Graças quero dar pelo amor, que nos deixa ver os outros como os vê a divindade! Pelo firme diamante e água solta! Pela álgebra, palácio de precisos e preciosos cristais!

Graças quero dar pelo fulgor do fogo, que nenhum ser humano pode olhar sem assombro antigo! Pelo mogno, o cedro, o sândalo! Pelo pão e o sal!

Graças quero dar pelo mistério da rosa que prodigaliza cor e não a vê! Pela arte da amizade! Pelas palavras que foram ditas no crepúsculo de uma cruz a outra cruz!

Graças quero dar pelos rios secretos e imemoriais que convergem em mim! Pelo mar, que é um deserto resplandecente e uma cifra de coisas que não sabemos!

Graças quero dar pelo ouro que reluz nos versos! Pelo inverno épico! Pelos prismas de cristal e o peso de bronze!

Graças quero dar pelo geométrico e bizarro xadrez! Pelo odor medicinal do eucalipto!

Graças quero dar pela linguagem, que pode simular a sabedoria! Pelo esquecimento, que anula ou modifica o passado! Pelo hábito, que nos repete e nos confirma como um espelho!

Graças quero dar pela manhã, que nos proporciona a ilusão de um começo! Pela noite, sua treva e sua astronomia! Pelo valor e a felicidade dos outros! Pela pátria, sentida nos jasmins ou numa velha espada!

Graças quero dar pelo fato de que o poema é inesgotável e se confunde com a soma das criaturas e jamais chegará ao último verso e varia segundo os homens!

Graças quero dar pelos minutos que precedem o sono! Pelo sono e pela morte, esses dois tesouros ocultos!

Graças quero dar pela música, misteriosa forma do tempo! Pelos íntimos e inúmeros dons que não enumero!



Enviado por: " Gotas de Crystal" <gotasdecrystal@gmail.com>

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